quinta-feira, 4 de outubro de 2012
sexta-feira, 28 de setembro de 2012
segunda-feira, 24 de setembro de 2012
sábado, 15 de setembro de 2012
quinta-feira, 13 de setembro de 2012
Estudo sobre a Confissão de Fé Batista de 1689 - Aula 34: O poder soberano de Deus - Parte 2
Por Jorge Fernandes Isah
Introdução
Espero que os irmãos tenham lido o texto da semana passada, e possamos concluí-lo na aula de hoje.
Fazendo um pequeno resumo, analisamos a questão da soberania de Deus a partir de um diálogo entre um padre e um ateu em um banco de praça.
Os irmãos se lembram do que foi discutida na última aula?
Poderiam apontar um ou mais pontos debatidos?
O primeiro ponto que levantei foi o de que os nossos inimigos estarão sempre dispostos e armados para desestabilizarem a nossa fé, de forma a virmos descrer nos fundamentos que nos sustentam.
Segundo, analisamos alguns versículos que afirmam ser Deus poderoso para realizar tudo, até mesmo o impossível, mas nunca contra a sua vontade e natureza. De forma que tanto a sua natureza como vontade são os limitadores de Deus, que o impedem de realizar tudo que não esteja consoante com a sua vontade, sabedoria, santidade, justiça, etc..
Um ponto que não foi discutido naquela aula e que gostaria de tocar agora é quanto a essa disposição do incrédulo de nos perverter e desencaminhar da fé. O que os irmãos acham? Isso é possível? Um crente verdadeiro descrer ou deixar-se corromper pelo discurso mundano e, mesmo temporariamente, como Pedro diz, voltar ao próprio vômito? Sendo mais específico, um crente pode apostatar ou desviar-se, no sentido de voltar às mesmas práticas e à mente que tinha antes da conversão?
Leiamos os seguintes textos [1]:
Jr 32. 38-40: "E eles serão o meu povo, e eu lhes serei o seu Deus; e lhes darei um mesmo coração e um só caminho, para que me tema todo os dias para seu bem e o bem de seus filhos, depois deles. E farei com eles uma aliança eterna de não me desviar de fazer-lhes o bem; e porei o meu temor nos seus corações, para que nunca se apartem de mim".
Jo 10.28,29: "E dou-lhes a vida eterna, e nunca hão de perecer, e ninguém as arrebarará da minha mão. Meu Pai, que mas deu, é maior do que todos; e ninguém pode arrebatá-las da mão de meu Pai".
Jo 6.37: “Todo o que Pai me dá virá a mim; e o que vem a mim de maneira nenhuma o lançarei fora”.
Jo 17.2, 9: “Assim como lhe deste poder sobre toda a carne, para que dê a vida eterna a todos quantos lhe deste... Eu rogo por eles, não rogo pelo mundo, mas por aqueles que me deste, porque são teus”.
E, então, temos uma grande promessa do Senhor: “Pai, aqueles que me deste quero que, onde eu estiver, também eles estejam comigo, para que vejam a minha glória que me deste; porque tu me amaste antes da fundação do mundo” [Jo 17.24].
Fp 1.6: “Tendo por certo isto mesmo, que aquele que em vós começou a boa obra a aperfeiçoará até ao dia de Jesus Cristo”
I Pe 1. 3-5: "Bendito seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo que, segundo a sua grande misericórida, nos gerou de novo para uma vivia esperança, pela ressureição de Jesus Cristo dentre os mortos. Para uma herança incorruptível, incontaminável, e que não se pode murchar, guardada nos céus para vós, que mediante a fé estais guardados na virtude de Deus para a salvação, já prestes para se revelar no último tempo".
Terceiro, em dado momento, o ateu propõe uma “pegadinha” ao padre, um sofisma, o qual é: Deus pode criar uma pedra que não pode carregar?
O padre afirma que sim, pode. E o ateu propõe que se Deus pode criar algo que não pode carregar, ele não é onipotente.
E se ele não puder criar a tal pedra, também não é onipotente.
Ao que o padre responde: “afinal, decida-se! Você quer que Deus crie a pedra ou que ele a carregue?". Na verdade, o ateu formulou duas afirmativas que se contradizem, o tal sofisma.
Quarto, E o padre ilustra o seu pensamento com o episódio da morte e ressurreição de Lázaro.
Continuemos de onde paramos na aula anterior; os comentários estarão sempre em itálico entremeados ao diálogo do padre e do ateu:
Deus pode criar, hipoteticamente, uma pedra que não possa carregar?
- Pois é. Como o senhor deve saber, quem pode o mais, pode o menos, ou seja, Jesus, de algum modo, poderia ter tirado a pedra, mas, também, de algum modo, não pôde fazê-lo. Ou seja, Deus criou aquela pedra e Deus não a pôde erguer.
O ateu não se deu por vencido:
- Bom, mas, como o senhor mesmo disse, Jesus poderia, sim, tirar a pedra, apenas não quis fazê-lo... Isso não é o mesmo que "não poder fazer".
- Mas, perceba: quando alguém pode tudo, pode, inclusive, limitar-se. Se não pode limitar-se, não pode tudo. Ademais, a sua dúvida está na onipotência de Deus, que Ele possa tudo e não que não possa alguma coisa... Se Ele não puder carregar a pedra, torna-se impotente, concorda?
O ateu sorriu como se o "rei" do padre estivesse, agora, fadado ao "xeque-mate”.
- Mas aí então, Deus não poderia criar uma pedra que não pudesse carregar...
- Mas é claro que pode, insistiu o padre:
Veja: Deus criou você para que você cresse nEle... mas você crê?
- Não, não creio.
O que os irmãos pensam dessa afirmação? Deus criou o homem para que cresse nele? De certa forma, sim. Acontece que no Éden, onde a humanidade caiu junto com Adão, a queda se deu exatamente por conta da descrença de Adão e Eva. Eles simplesmente duvidaram do que Deus havia lhes dito, preferindo crer no que o seu coração insensato dizia ou maquinava e na mentira da serpente.
Se Deus criou o homem para crer, ele não creu por si mesmo. O Éden prova isso. Para que o homem cresse, foi necessário que Deus operasse nele, de forma a mudá-lo e transformá-lo à imagem do seu Filho Amado.
Veja bem, todos os homens têm em si fragmentos de Deus, o Imago Dei, contudo esses fragmentos não revelam a condição pecaminosa e caída do homem, nem o seu estado de rebelião e desprezo a Deus, nem a necessidade de arrepender-se e reconciliar-se com Deus. Isso somente é possível pela ação do próprio Deus, regenerando o homem, o qual, então, estará ligado a ele, em constante transformação, santificação, para, enfim, naquele glorioso dia ser semelhante ao homem perfeito: Jesus Cristo.
Todos os homens, sem exceção, são descrentes, e nasceram em descrença. Aprouve a Deus chamar uma parte deles à fé, à crença em Deus, que se dará a partir da ação regeneradora e santificadora do Espírito Santo. De forma que, se Deus quisesse que todos os homens cressem nele, eles creriam, e se não crêem é porque Deus não criou a todos para crer, mas antes, ao menos no princípio temporal da vida de cada um, criou-nos para descrer. Cremos somente pela pregação do Evangelho, o qual o Espírito Santo usará para nos revelar a nossa condição e a necessidade de arrependimento, de se pedir perdão a Deus pela nossa condição incrédula e ofensiva diante dele.
Esta visão do padre, na verdade, antes de exaltar a soberania de Deus, revela que ele é um ser limitado por conta de suas criaturas, e que criou para si mesmo limitações exteriores, que de alguma forma alteram a sua essência, impedindo-o de ser o que é. Como a Escritura nos afirma que Deus é imutável, ele não pode, em hipótese alguma, ter limitações que não sejam estabelecidas por sua natureza santa e perfeita ou por sua vontade igualmente santa e perfeita, eternamente.
Um exemplo que se dá é de que Deus poderia criar vários mundos, inclusive perfeitos. E é uma verdade. Acontece que encontramos apenas um mundo, o qual ele considerou bom, e de que esse é o único mundo possível; e assim ele quis. Qualquer hipótese de outros mundos criados estará sempre circunscrita à vontade divina de criá-los, sem a qual, nada pode vir a ser. E a vontade divina tem por propósito uma única coisa, a meu ver: a glória de Deus! Que é revelada, entre outras coisas no todo poder com que ele realiza a sua vontade: na criação, na sustentação da criação, na redenção do homem, na preservação, santificação, e no reino eterno de Cristo, que não terá fim. Pois nada há que possa satisfazê-lo além de si mesmo, e tudo o que criou somente o satisfará se for realizado segundo a sua vontade. Logo, a vontade divina é a causa primeira, e o homem, ao rejeitá-la, ataca exatamente esse ponto inatacável [2].
Se Deus criou o homem para crer nele, e esse homem não crê, há um conflito de vontades e interesses, e o que temos é a vontade divina subjugada à vontade humana, estando essa prevalecente em relação àquela. Mas isso é viável? Claramente a Bíblia afirma que não. Deus se satisfaz em realizar a sua vontade, e ela acontecerá infalivelmente, sendo que Deus jamais se frustrará.
- Pois é, continuou. Deus criou a sua liberdade e não pode removê-la, pois se auto-impôs esse limite. Com efeito, Deus pode tudo porque pode, inclusive, dizer o que não pode fazer. Quando alguém pode dizer o que não pode fazer, embora o possa, é porque, de fato, pode tudo.
O ateu agora estava em silêncio...
O padre pegou no seu ombro e concluiu:
Assim como a pedra que prendia Lázaro, a sua liberdade é algo que Deus criou, mas por uma auto-limitação, não se permite mover. A sua liberdade, meu amigo, é a pedra que Deus criou e que não pode mover.
Dizendo isso, afastou-se do ateu que permanecia pensativo no banco da praça, alheio à chuva mansa que se iniciara.
Lister Leão
Na verdade, Deus não pode criar uma pedra que não possa carregar, pois ele pode tudo, tanto criá-la como carregá-la. A proposição do ateu é simplesmente absurda, ilógica, e impossível, pois Deus estando fora da realidade da pedra, e como criador dessa realidade, simplesmente não tem qualquer limitação, nem mesmo a de se autolimitar em relação ao mundo exterior, à criação. A autolimitação divina está circunscrita à sua natureza santa e perfeita e à sua vontade. Nada mais pode impedi-lo ou restringi-lo. Nem mesmo a suposta liberdade que o homem diz ter, e que, em algum aspecto, seria limitadora da vontade de Deus. Porque Deus é Deus, e não pode deixar de sê-lo [Dt 4.35; Sl 100.3].
Notas: [1] Textos analisados mais detidamente no áudio da aula, bem como a questão da justiça e bondade divinas.
[2] Aula realizada na E.B.D. do Tabernáculo Batista Bíblico
[3] Baixe-a em file.MP3
Estudo sobre a Confissão de Fé Batista de 1689 - Aula 33: O poder soberano de Deus - Parte 1
Por Jorge Fernandes Isah
Durante a semana, recebi através do twitter este texto, e como estava preparando esta aula, achei providencial analisá-lo, pois ele trata exatamente do mesmo assunto ao qual daremos continuidade no estudo da C.F.B. Pensei que seria uma boa oportunidade para discutirmos a questão de uma maneira, digamos, mais prática, e uma chance de mudar um pouco o curso de como estamos a estudar. Será feita a leitura do texto, e os comentários estarão entremeados a ele, em itálico.
Então, sem mais delongas, vamos à leitura e análise do texto, o qual é:
Deus pode criar, hipoteticamente, uma pedra que não possa carregar?
O ateu se acomoda no banco da praça, olha sobre o ombro e percebe que há um jovem padre amarrando os sapatos.
- Com licença... O senhor é Padre?
O jovem ergue as sobrancelhas com admiração! [como não reconhecem um clérigo de batina nos dias de hoje?]
- Sim, sou, respondeu o padre ajeitando-se no banco, exibindo o clergyman e um sorriso irônico.
- O senhor ainda crê mesmo? O senhor...
- Sim creio... E o senhor, não crê?...
- Acostumei-me a tolerar a ignorância dos homens...
- Então, temos algo em comum... Revidou o padre, olhando o relógio.
Um minuto... Temos aqui, inicialmente, uma conversa entre o padre e um ateu em um banco de praça. O que se percebe é que o jovem avistou o clérigo e provocou-o com uma questão. Até então, o padre sequer havia notado ou percebido a presença do ateu, mas este percebeu-o e dirigiu-se a ele, inquirindo-o. É importante saber que os nossos inimigos estarão sempre lado a lado conosco, nos tentando. Pedro nos advertiu de que o diabo está ao nosso redor à espreita, buscando a quem possa tragar. Igualmente, os seus servos também querem demover-nos da fé, de forma que reneguemo-la; fruto, primeiramente, do ódio e desprezo a Deus e que se transfere de alguma maneira para nós.
Uma das formas mais usuais deles é a argumentação sutil, cavilosa, sofismática, de maneira que fiquemos numa posição de dúvida. Devemos, portanto, estar preparados para, onde estivermos, seja no trabalho, na escola, no lar, entre amigos, parentes e vizinhos, e até mesmo dentro da igreja, saber que seremos confrontados por pessoas que são instrumentos do inimigo, e eles próprios inimigos de Deus, para nos tentar. O que o padre está sofrendo é uma tentação. Pode parecer apenas uma conversa trivial, mas ele está sendo tentado pelo ateu.
Continuemos...
Dobrando o jornal que estampava a figura do último show de rock, troca as pernas numa cruzada e, olhando para o padre, pergunta:
- Como pode crer no que foge à lógica?
- O que não é lógico em crer?
- Muita coisa... Por exemplo: o senhor deve crer que Deus tudo pode...
- Sim, não é só verdade que creio, como é verdade que Ele tudo pode.
Rapidamente o ateu chega ao ponto principal do seu intento: afirmar que a fé não é lógica, a partir de uma pergunta capciosa: Deus tudo pode?
Sabemos que esta é uma verdade bíblica, e de que ela está presente em uma série de versos, como tais:
Jó 42.2: “Bem sei eu que tudo podes, e que nenhum dos teus propósitos pode ser impedido”
Mt 19.26: “E Jesus, olhando para eles, disse-lhes: Aos homens é isso impossível, mas a Deus tudo é possível” [1].
Lc 1.37: “Porque para Deus nada é impossível”
Sl 47.2-3: “Porque o Senhor Altíssimo é tremendo, e Rei grande sobre toda a terra. Ele nos subjugará os povos e as nações debaixo dos nossos pés”
Sl 97.2-5 - "Nuvens e escuridão estão ao redor dele; justiça e juízo são a base do seu trono. Um fogo vai adiante dele, e abrasa os seus inimigos em redor. Os seus relâmpagos iluminam o mundo; a terra viu e tremeu. Os montes derretem como cera na presença do Senhor, na presença do Senhor de toda a terra"
Não devemos nunca temer os ataques dos inimigos quando estamos diante da palavra do Senhor. Ela deve ser buscada sempre, consultada nos momentos em que mais temos dúvidas. Eu trouxe este texto pois é uma situação que pode acontecer com qualquer um de nós, e não devemos nos turbar, mas estar preparados, como já disse. Somos questionados o tempo todo em nossa fé, e há uma ação do mundo em fazer-nos parecer tolos ou ultrapassados, ou revelar que a nossa crença é algo insano ou fruto da ignorância. Jamais nos esqueçamos de que a Escritura não tem apenas aspectos doutrinários, mas ela nos orienta a tudo: desde como viver com as demais pessoas até como deve ser o nosso relacionamento com Deus. Ela nos revelará toda a vontade de Deus para a nossa vida, não somente como uma crença mas como a forma correta e santa de se viver, seja em qual tipo de relação estivermos; e assim glorificaremos a Deus em todas as coisas e aspectos, não somente nos momentos em que estamos na igreja.
Nesse Salmo temos descrito o poder de Deus. O salmista se utiliza de uma linguagem poética para descrever o poder absoluto de Deus. Deus reina absoluto sobre todas as coisas. De forma que nada é impossível para Deus, pois ele tem o poder de fazer qualquer coisa. Mais a frente, entenderemos que o poder de Deus é absoluto, mas limitado em alguns aspectos. Fiquem tranquilo, não estou a proferir nenhuma heresia, nem aderi repentinamente à Teologia do Processo ou Relacional, na qual se prega um "Deus" limitado, frágil e titubeante como o homem é... um "Deus" feito à semelhança humana. Não é isso.
Prossigamos...
-Então, me responda... Deus pode criar, hipoteticamente, uma pedra que não possa carregar?
- Sim. Claro!
O ateu ficou surpreso pela resposta instantânea do sacerdote. E julgando que tivesse sido apressado, tentou explicar a pergunta:
- Mas, veja: Se Deus pode tudo e pode criar algo que não possa erguer, no fim ele não pode tudo, porque não poderá erguer a pedra.
O inimigo lança então o seu o ardil; e penso que devemos ter cuidado com as respostas instantâneas. Ele proferiu uma "pegadinha" com o objetivo de colocar o padre em contradição ou mesmo ridicularizá-lo, de forma que ele se envergonhe da sua fé. Quando estivermos diante de questões que não conhecemos ou de discussões que não passaram por nossa mente, nem foram alvos dos nossos estudos, o melhor a fazer é calar-se, evitando ser imprudente. Está escrito que até o tolo, em silêncio, parece sábio. Se estamos diante de questões que não refletimos, nem cogitamos refletir [e sempre devemos ter em mente que todas as questões devem ser meditadas à luz da Escritura], a nossa resposta deve ser: não sei! Não há pecado em não se saber algo. Muitas vezes, por causa do nosso orgulho, somos tolos o bastante para cair nas armadilhas que nos são postas, como se fosse uma obrigação ter uma resposta para tudo. É necessário saber que não temos, e jamais teremos. O apelo racionalista é de que eles têm, quando não têm. E o fato de não termos, aos olhos deles, nos tornam inferiores, quando reconhecer a nossa limitação é sábio e não o contrário.
Pedro diz que devemos estar sempre prontos a mostrar a razão da nossa fé. E qual é ela? Ora, o Senhor Jesus Cristo. E isto podemos mostrar e revelar para qualquer pessoa em qualquer situação. Falar que ele nos resgatou, nos livrou da perdição, nos ligou novamente a Deus, que transformou a nossa mente e nos fez novas criaturas, isto podemos falar o tempo todo para qualquer pessoa. Ao invés de darmos atenção para pegadinhas como a proferida pelo ateu, a qual é absurda e não quer dizer nada. O único objetivo dele é confundir e fazer o padre desacreditar a sua fé; e devemos ser prudentes diante de situações como essas.
Mas o que pensam do fato de a Bíblia dizer que Deus pode criar até mesmo o impossível, pois para ele, nada é impossível? Deus pode criar absurdos? Ou criar algo que não esteja conforme a sua vontade? Não seria a sua vontade o limitador para que Deus crie qualquer coisa? Há limites para Deus?... Sim!
Deus, por exemplo, não mente:
- Nm 23.19: “Deus não é homem, para que minta; nem filho do homem, para que se arrependa; porventura diria ele, e não o faria? Ou falaria, e não o confirmaria?”
- 1 Sm 15.29: “E também aquele que é a Força de Israel não mente nem se arrepende; porquanto não é um homem para que se arrependa."
Deus não pode mudar:
- Sl 102.27: “Mas tu és o mesmo e os teus anos nunca terão fim”
- Is 48:12: “Dá-me ouvidos, ó Jacob, e tu, ó Israel, a quem chamei; eu sou o mesmo, eu o primeiro, eu, também, o último”
- Ml 3:6 “Porque eu, o Senhor, não mudo”
- Hb 1:12 ”E como um manto os enrolarás, e como um vestido se mudarão, mas tu és o mesmo, e os teus anos não acabarão”
- Hb 13.8: “Jesus Cristo é o mesmo, ontem, e hoje, e eternamente”
- Tg 1:17 :“Toda a boa dádiva e todo o dom perfeito vêm do alto, descendo do Pai das luzes, em quem não há mudança nem sombra de variação.”
Então temos que Deus pode fazer tudo, mas ele fará tudo segundo a sua natureza e vontade, de forma que mesmo sendo o Deus do impossível, e devemos entender que isso se refere ao que ele pode fazer como possibilidade, mas não ao que ele pode fazer indo contra a sua natureza, pois tanto a santidade, como a justiça e a perfeição impedem-no de praticar o mal, por exemplo, ou de pecar.
Outro exemplo está em Mt 3.9, em que João o Batista diz, falando aos fariseus: “E não presumais, de vós mesmos, dizendo: temos por pai a Abraão; porque eu vos digo que, mesmo destas pedras, Deus pode suscitar filhos a Abraão”.
É claro que o objetivo principal do profeta era derrubar a arrogância e soberba dos fariseus, comparando-os com as pedras do rio Jordão, mas há nesse verso a verdade de que Deus realmente pode tudo, mas isso não quer dizer que ele fará tudo, pois o fará segundo a sua natureza santa e perfeita, e segundo a sua vontade igualmente santa e perfeita [Is 46.10: "Que anuncio o fim desde o princípio, e desde a antiguidade as coisas que ainda não sucederam; que digo: o meu conselho será firme, e farei toda a minha vontade”].
O ateu ficou surpreso pela resposta instantânea do sacerdote. E julgando que tivesse sido apressado, tentou explicar a pergunta:- Mas, veja: Se Deus pode tudo e pode criar algo que não possa erguer, no fim ele não pode tudo, porque não poderá erguer a pedra.
- O padre se ajeitou no banco novamente e, apoiando os braços sobre as pernas, explicou:
O senhor propõe que Deus faça duas coisas contrárias: criar algo que não possa carregar e, ao mesmo tempo carregá-la. Parece que o senhor ainda não decidiu o que quer que Deus faça... Há um problema na sua pergunta, uma armadilha sofística... Mas, de qualquer modo: Ele pode, sim, fazer ambas as coisas.
Deus não pode tudo? Se ele pode tudo, pode criar qualquer coisa, mas temos de entender que ele fará tudo conforme a sua vontade. Ele não tem de provar nada para nós, muito menos provar-nos o seu poder, pois ele o tem inerente ao seu ser.
Mas a questão é que o ateu propõe uma “pegadinha” e formula algo contraditório: Se Deus pode tudo, pode criar uma pedra incapaz de movê-la; mas se ele não pode movê-la não é onipotente nem todo-poderoso. Ele formulou duas afirmativas que se contradizem, o que é chamado de sofisma, que é um raciocínio falso com a intenção de enganar, ludibriar, de induzir alguém ao erro.
Na verdade, Deus não pode criar uma pedra que não possa carregar, pois ele pode tudo, inclusive carregar algo de massa e peso inimaginável ou mesmo impossível de se carregar por qualquer outro ser, menos ele, que, novamente afirmo, pode tudo, sendo a exceção aquilo que vá contra si mesmo, contra o seu ser perfeito. A característica de um poder absoluto não é fazer tudo o que se pode fazer sem critérios ou juízo. O poder absoluto denota autoridade, e Deus é uma autoridade sábia, perfeita e santa, que não fará sandices, nem agirá ilógica e desproporcionadamente. O poder absoluto de Deus se refere ao fato dele ser o ser supremo sobre tudo e todos, mas também de que ele é absoluto em perfeição e santidade e justiça e sabedoria. Fazer algo insano é impossível para Deus. Fazer algo despropositado, também. Então temos que Deus tem limites sim, circunscritos à sua natureza e vontade, ou seja, aos aspectos intrínsecos do seu ser, pois se assim não fosse, ele iria contra si mesmo...
O ateu franziu a testa, com curiosidade.
Continuou, então, o padre:
- Deus criou essa pedra. Ela existe... Ou pelo menos existiu:
Quando Jesus ressuscitou Lázaro, está lá nos Evangelhos, Ele ordenou que tirassem a pedra para que Lázaro viesse para fora... Ora, para o senhor, o que é mais fácil? Trazer um morto à vida ou retirar uma pedra?
- Em tese, trazer o morto à vida...
Na próxima aula, continuaremos a meditar sobre este texto.
Notas: [1] Este e outros trechos são analisados mais detidamente no áudio.
[2] Aula realizada no Tabernáculo Batista Bíblico.
sábado, 8 de setembro de 2012
sábado, 25 de agosto de 2012
sábado, 4 de agosto de 2012
sábado, 28 de julho de 2012
quinta-feira, 26 de julho de 2012
quinta-feira, 19 de julho de 2012
Estudo sobre a Confissão de Fé Batista de 1689 - Aula 32: Ainda sobre a vontade de Deus
Por Jorge Fernandes Isah
UMA OU DUAS VONTADES?
Muitos afirmam que Deus tem duas vontades. De que ele decretou tudo [a sua vontade decretiva] e de que estabeleceu preceitos, os quais podem ser "resistidos" pelo homem que os desobedece [sua vontade preceptiva]. Em linhas gerais, esse esquema tem por objetivo esclarecer alguns conflitos que a Bíblia nos apresenta entre a vontade soberana e aquela vontade que é "quebrada" pelo homem. Acontece que a vontade divina é inquebrável, irresistível e impossível de não se manifestar. Ninguém resiste a Deus, como o profeta diz: "E todos os moradores da terra são reputados em nada, e segundo a sua vontade ele opera com o exército do céu e os moradores da terra; não há quem possa estorvar a sua mão, e lhe diga: Que fazes?" [Dn 4.35].
Vejamos mais alguns textos:
"Mas o nosso Deus está nos céus; fez tudo o que lhe agradou" [Sl 115.3];
"Bem sei eu que tudo podes, e que nenhum dos teus propósitos pode ser impedido" [Jó 42.2];
"Que anuncio o fim desde o princípio, e desde a antiguidade as coisas que ainda não sucederam; que digo: O meu conselho será firme, e farei toda a minha vontade" [Is 46.10];
"O Senhor dos Exércitos jurou, dizendo: Como pensei, assim sucederá, e como determinei, assim se efetuará... Porque o Senhor dos Exércitos o determinou; quem o invalidará? E a sua mão está estendida; quem pois a fará voltar atrás?" [Is 14.24,27]
O que vocês acham disso? É possível que a vontade de Deus seja resistida ou anulada por suas criaturas? Ou por forças contingentes?
O fato é que o conselho de Deus, que também é chamado de vontade, é irresistível, eterno e santo. Não pode ser alterado nem adulterado, pois se fosse possível transtorná-lo, acarretaria na desordem, e sabemos que Deus não é Deus do caos. Pois quando vemos o andar da história, o seu desenrolar diante dos nossos olhos, onde o homem cada vez mais se afasta do Criador, desprezando-o e, por sua tolice, reservando para si mesmo a ira vindoura; mesmo entre todas as confusões que a vida nos revela e das quais o homem é o único culpado, ainda assim tudo está conforme Deus estabeleceu eternamente, como parte do seu projeto perfeito e santo. Onde mesmo a imperfeição e todas as deficiências originárias dela; onde o mal e tudo o que ele traz de mais doloroso e injusto; onde a desobediência levará às punições mais severas e duradouras; ainda assim tudo isso faz parte do plano geral arquitetado por Deus e que tem como objetivo a sua glória e revelar-nos a sua sabedoria, graça, misericórdia e santidade.
Alguns podem dizer que nada daquilo, se partiu da mente de Deus, faz dele sábio ou bondoso. Mas, pergunto: se Deus não é sábio e bom, de onde viria a sabedoria e a bondade?
O certo é que:
1) A vontade de Deus é soberana, e nada pode frustrá-la.
2) Tudo o que Deus pensou e quis fazer, assim será.
3) Nem os anjos nem os homens podem frustrar os planos de Deus.
4) Tudo foi decretado e estabelecido por Deus eternamente, de forma que acontecerão infalivelmente.
5) Mesmo a desobediência dos anjos e homens está dentro do decreto e plano divinos.
Dentro de todos os esquemas teológicos existentes, entendo que em Deus há duas vontades: a revelada, a qual é possível ser conhecida por qualquer homem, como possibilidade, e que nos é apresentada em detalhes pela Escritura Sagrada, e a secreta ou oculta, aquela que somente Deus tem conhecimento e da qual todos nós desconhecemos, ignorando-a completamente. É o que nos diz o profeta: "As coisas encobertas pertencem ao Senhor nosso Deus, porém as reveladas nos pertencem a nós e a nossos filhos para sempre, para que cumpramos todas as palavras desta lei" [Dt 29.29].
De forma que não são duas, mas apenas uma vontade, a qual o homem conhece parcialmente, mas Deus a retém integralmente, sem que nada lhe esteja encoberto. Na verdade há uma vontade apenas, de forma que a vontade revelada está subordinada, sujeita à vontade oculta, que é todo o conselho divino.
O problema é que ficamos conjecturando algumas vezes a partir da Escritura, outras vezes por fontes não confiáveis, qual seria o teor da vontade secreta de Deus. E esse é um esforço inútil e tolo, revelando o nível de imperfeição e limitação humana ao elaborar, e muitas vezes se satisfazer com o esquema proposto, algo que escapa completamente a sua capacidade. Por isso, desde sempre, satanás tem incitado o homem ao ocultismo, a buscar meios sobrenaturais de desvendar qual seja essa vontade. Porém sabemos que esses meios nada mais são do que a própria ação diabólica em iludir e confundir o homem, de sorte que ele se apresente preso ao desconhecido ao invés de se libertar naquilo que Deus deu-lhe a conhecer, no que pode ser conhecido.
A adivinhação não somente é um engano como uma provocação e afronta a Deus; como se criaturas imperfeitas, pecadoras e tolas pudessem explorar sua mente perfeita e santa. Com isso não estou a dizer que tentar racionalmente dar compreensão a algo insondável e inescrutável seja maligno ou tolice. Nem sempre é, apesar de na maioria das vezes ser. Os esquemas humanos parecem funcionar para nós, mais ou menos como um placebo "cura" o hipocondríaco. Parece que a coisa é real, que estamos indo bem, mas na verdade ela não chegou a existir, verdadeiramente. É tão remotamente impossível como se curar uma doença inexistente [não que o hipocondríaco não seja doente, mas não o tipo de doença que ele considera ter, e a cura que diz buscar].
Da mesma forma, os esquemas humanos podem auxiliar-nos, mas sempre devemos ter em mente que eles estão longe de resolver questões para as quais somos completamente inabilitados. E o que se refere à vontade oculta de Deus é ainda mais impossível, se é que há algo mais que impossível. Por mais exaustivos que sejam os esforços eles não passarão de sombras daquilo que realmente é. Por isso evito processos muito elaborados e complexos para definir algo simples, mas de uma simplicidade inatingível, e que seria melhor reconhecê-la como não definível pela linguagem humana.
UM EXEMPLO PRÁTICO
Mas, a questão é, agora: Pode a vontade de Deus ser frustrada?
Em Atos 4.26-28 lemos: "Levantaram-se os reis da terra, e os príncipes se ajuntaram à uma, contra o Senhor e contra o seu Ungido. Porque verdadeiramente contra o teu Santo Filho Jesus, que tu ungiste, se ajuntaram, não só Herodes, mas Pôncio Pilatos, com os gentios e os povos de Israel; para fazerem tudo o que a tua mão e o teu conselho tinham anteriormente determinado que se havia de fazer"
Alguém pode aventar que temos aqui apenas uma predição. Que Deus, conhecendo o futuro, viu o que os homens fariam com o seu Filho. Mas sabemos que o texto não diz isso. Ele diz mais, muito mais do que uma simples “visão” divina:
- É certo que Pilatos, Herodes, os judeus e os gentios se juntaram contra Cristo. Interessante que todos eles colaboraram para a morte de Cristo, a qual não se deu por todos eles, no sentido de que Cristo não morreu por todos os homens, mas especificamente pelos eleitos, pela sua igreja, para trazer a Deus um único povo.
- É certo que eles, ao se levantarem contra Jesus, também se levantaram contra Deus.
- Muito mais do que Deus tendo uma "antevisão" do que iria acontecer, ele decretou e determinou que Cristo fosse preso, humilhado e morto por eles.
- A "mão de Deus" é uma figura de linguagem que se refere ao decreto, à vontade, ao que Deus predeterminou que aconteceria, e não simplesmente "viu" algo que estava além do seu poder e da sua vontade. A mão de Deus nos dá a idéia de que ele conduziu todo o processo de forma que acontecesse, sem qualquer chance de não acontecer. Foi o que nos diz o profeta: “Todavia, ao Senhor agradou moê-lo, fazendo-o enfermar; quando a sua alma se puser por expiação do pecado, verá a sua posteridade, prolongará os seus dias; e o bom prazer do Senhor prosperará na sua mão. Ele verá o fruto do trabalho da sua alma, e ficará satisfeito; com o seu conhecimento o meu servo, o justo, justificará a muitos; porque as iniqüidades deles levará sobre si.” [Is 53.10-11]. Note-se que o evento da crucificação não aconteceu à revelia de Deus, mas em seus mínimos detalhes esteve sob o seu controle. De forma que o Senhor se agradou, e o mesmo Senhor viu o seu trabalho e se satisfez, representando uma obra conjunta da pessoa do Pai e do Filho e do Espírito.
- Temos de entender que a vontade de Deus ou é soberana, e por soberana eu digo um poder absoluto, sem restrições ou neutralizações, aquele revestido de autoridade suprema, potente; ou não é, e então o homem, caso possa subjugar a vontade divina, é quem detém o real poder. Mas sabemos que o homem é nada diante de Deus, e apenas cumpre os seus propósitos.
- Certo é que eles planejaram, intentaram e executaram o plano de matar o Filho de Deus, e assim fizeram, e por isso foram culpados, e serão condenados. Eles não deveriam tê-lo feito, mas não havia como não fazerem. Entendam que a responsabilidade não está no fato do homem poder resistir, quando a sua natureza pecaminosa insiste em que ele não resista, pois não pode, mas no fato dele deliberadamente assumir o erro e praticar o crime. O crime é que o torna em criminoso. Se ele podia ou não resistir é outra história. Ninguém é condenado pela hipótese da resistência, se queria ou não, se era ou não capaz, mas por agir em oposição à lei. E ao fazê-lo, ele infringe-a, tornando-se culpado.
- De certa forma todos são culpados pela morte de Cristo, no sentido de que, qualquer um de nós que estivesse no lugar de Pilatos, Herodes e dos judeus e gentios gritaríamos também "crucifica-o!". Acontece que eles não se tornaram culpados e réus de morte a partir da crucificação do Senhor, mas como está escrito, eles, desde sempre eram culpados, pois "quem não crê já está condenado, porquanto não crê no nome do unigênito Filho de Deus" [Jo 3.18].
Em tudo isso o importante é saber que Deus é também Senhor da nossa vontade, ainda que não saibamos como isso se dá; certos porém de que, por mais que queiramos, ninguém é independente ou autônomo de Deus.
Em tudo isso o importante é saber que Deus é também Senhor da nossa vontade, ainda que não saibamos como isso se dá; certos porém de que, por mais que queiramos, ninguém é independente ou autônomo de Deus.
Notas: 1- Aconselho aos que ainda não fizeram, ler o texto "Deus não tem escolhas". Alguns pontos descritos aqui podem ficar mais claros.
2- Aula realizada em 03.06.2012.
3- Baixe esta aula file.MP3
domingo, 15 de julho de 2012
quarta-feira, 11 de julho de 2012
Estudo sobre a Confissão de Fé Batista de 1689 - Aula 31: A vontade de Deus
Por Jorge Fernandes Isah
INTRODUÇÃO
O que vem a ser vontade?... Muitos podem dizer que vontade é o desejo de se fazer algo ou a disposição para se fazer algo ainda que não se faça, por vários motivos. Na história do pensamento humano sempre se discutiu sobre o significado real de vontade e desejo, e sobre sua relação, chegando-se a tê-las como sinônimos, tal a ligação intrínseca existente entre elas e, em outros casos, afirmou-se que elas são duas "pontentias", de forma que a vontade pertence ao campo racional enquanto o desejo ao campo sensorial ou sensível. Há uma disputa entre a psicologia e a filosofia para definir melhor ou mais corretamente os termos; porém, aqui interessa-nos não apenas o desejo, como uma vontade irrealizada ou uma impressão, mas a vontade em um determinado curso de ação. Ou seja, a volição, que nada mais é do que a vontade como a força que inclina e move o homem a querer, fazer e a não fazer, em seu caráter moral.
Infelizmente, hoje em dia, não se discute a vontade como um princípio racional da ação, como o poder originário da alma a produzir manifestações do homem; nossas escolhas são motivadas por um apetite voluntário que nos leva a agir. O que nos faz responsáveis por nossos atos, visto te-mo-los escolhidos. Não entrarei na questão se a vontade é ou não livre, se ela sobre uma ação prévia ou coação que a motiva. Certamente que o homem, como ser moral, é responsável pelo que faz, seja lá qual for a sua motivação. Tanto Platão como Aristóteles entendiam que o termo vontade somente era pertinente ao se fazer o que se quer, e não ao que satisfaz. Essa era a distinção racional que consideravam, pois fazer o que se quer é fazer o que é bom, o que é agir racionalmente. Acontece que o homem age, na maioria das vezes, em prol do mal, e eles entendiam que assim se age irracionalmente, ao se fazer o que agrada, simplesmente.
Infelizmente, hoje em dia, não se discute a vontade como um princípio racional da ação, como o poder originário da alma a produzir manifestações do homem; nossas escolhas são motivadas por um apetite voluntário que nos leva a agir. O que nos faz responsáveis por nossos atos, visto te-mo-los escolhidos. Não entrarei na questão se a vontade é ou não livre, se ela sobre uma ação prévia ou coação que a motiva. Certamente que o homem, como ser moral, é responsável pelo que faz, seja lá qual for a sua motivação. Tanto Platão como Aristóteles entendiam que o termo vontade somente era pertinente ao se fazer o que se quer, e não ao que satisfaz. Essa era a distinção racional que consideravam, pois fazer o que se quer é fazer o que é bom, o que é agir racionalmente. Acontece que o homem age, na maioria das vezes, em prol do mal, e eles entendiam que assim se age irracionalmente, ao se fazer o que agrada, simplesmente.
Entendo que essa é uma boa distinção, que pode explicar muitas vezes porque agimos pecaminosamente. Ainda que saibamos ser determinado ato pecaminoso, que nos leva a ofender a Deus e ao próximo ou a nós mesmos, nos dispomos a praticá-lo, indo contra a razão, a qual podemos chamar de consciência, que nos alerta do engano a se cometer. Mesmo que não conheçamos todos os riscos e implicações, temos sempre a capacidade de avaliar se o que está-se a praticar é certo ou não. Ainda que muitos digam não ter esse conhecimento, o que acontece na verdade é uma "cauterização da consciência", o abandono do senso moral, de forma que se apague do caráter os sinais que nos leva ao cuidado, à vigília que o conhecimento imediato nos revela quanto aos riscos da atitude que se vai tomar. É o abandonar-se à irresponsabilidade com o objetivo de não ser responsabilizado, nem de ser acusado, como se fosse possível viver num estado de inconsciência deliberada. O que se tem visto cada vez mais são os respaldos científicos, especialmente da psicologia moderna, de que muitos atos praticados pelo homem não têm como fonte a vontade deliberada ou determinada de se praticá-los. Com isso procura-se isentá-lo da responsabilidade, e se acaba por transferi-la a quem não tem controle sobre ela, visto ser o indivíduo o único capaz de decidir pela prática do ato ou não. Alegar que se foi coagido ou induzido ao erro em nada pode absolver o agente. Até mesmo um animal, como um cão ou um gato, percebe se cometeu uma bobagem ou não. Tenho cães que, ao passarem dos limites estabelecidos por mim, mesmo antes de eu descobrir a infração já é possível percebê-la na atitude "arrependida" do animal. Muitas vezes, tenho de sair pelo espaço deles procurando pela traquinagem até encontrá-la. Eles sabem que cometeram um "crime", e que por isso serão repreendidos. Ou seja, é quase possível dizer que eles têm uma mente mais racional do que muitos humanos. Que até mesmo os animais têm a noção do certo e do errado, guardadas as devidas proporções. E se não têm o Imago Dei, como nós, o que nós dá o direito de defender a irresponsabilidade? Como se os atos praticados não fossem originados pela vontade individual? Certamente que esse é um dos atributos divinos comunicado ao homem, e do qual o homem tenta, desesperadamente, se ver livre; de forma que assim ele se liberta tanto da responsabilidade moral como da sua dependência de Deus. Ao menos ele se imagina livre, em sua tola pretensão de liberdade. Um exemplo evidente de que a transgressão é consequência da vontade está relatado no livro de Gênesis, capítulo 4.
Abel e Caim levaram ofertas para Deus, e ele se agradou da oferta de Abel e não se agradou da de Caim, cujo semblante lhe decaiu, por causa da ira contra o seu irmão. E o Senhor lhe disse: "Por que te iraste? E por que descaiu o teu semblante? Se bem fizeres, não é certo que serás aceito? E se não fizeres bem, o pecado jaz à porta, e sobre ti será o seu desejo, mas sobre ele deves dominar". E o que aconteceu em seguida? Caim matou a Abel. E Deus expulsou-o de diante de sua face, e amaldiçoou-o. De forma que o próprio Caim reconheceu: "É maior a minha maldade que a que possa ser perdoada". Ao não ouvir o conselho divino, e dispor-se a fazer o que lhe agradava no momento, Caim decidiu-se pelo mal, e foi punido pelo seu crime. Segundo o parecer dos filósofos citados, Caim, ao não usar a razão, não foi capaz de ter vontade, mas o desejo irracional de matar e aplacar a sua ira com o sangue do seu irmão. Ele não dominou sobre o seu desejo, sabia o que não deveria fazer, mas decidiu fazê-lo porque foi do seu agrado. O Senhor nos diz quase a mesma coisa:
1) Caim deveria dominar o seu desejo;
1) Caim deveria dominar o seu desejo;
2) Se não o fizesse, o pecado jazia à porta; em outras palavras, ele estava em iminência de se concretizar;
3) Sobre Caim seria lançada a culpa pelo seu desejo.
Temos aqui o desejo de Caim como algo realmente iníquo, irracional, o pecado acalentado e realizado, a exaltação do eu diante de si mesmo, mas jamais inconsciente, pelo contrário; o próprio Caim estava seguro da sua violação; ele queria, como resultado do seu desejo insano, o assassínio, o sangue de Abel em suas mãos; o que o levou a não considerar injusta a punição que lhe foi aplicada por Deus; ele estava consciente de que era justa, assim como estava consciente do ato praticado, pois em momento algum ele teve o menor sinal de arrependimento, de remorso pelo crime cometido. Caim estava convicto, e mesmo disposto a arcar com as consequências do crime praticado. O que enuncia a sua decisão e obstinação em fazer o mal conscientemente. O que vale dizer que fortes emoções, profunda consternação ou ira, não são justificativas para que a vontade direcione o homem ao que não deve ser feito, ao invés de mantê-lo distante, conservando-o no bem que o fará aceito [e, por bem, também significa o afastar-se do mal]. Como ser moral, o homem deve se dispor à dominar os desejos provenientes da sua natureza caída, afastando-se do mal, procurando o bem, que será sempre realizar não a vontade imperfeita e iníqua do homem, aquela pela qual damos vazão ao pecado, mas buscar incessantemente fazer a vontade divina, a qual é perfeita, e pura, e santa.
Tiago, em sua epístola, nos alerta de que "cada um é tentado, quando atraído e engodado pela sua própria concupiscência. Depois, havendo a concupiscência concebido, dá à luz o pecado; e o pecado, sendo consumado, gera a morte. Não erreis, meus amados irmãos". Concupiscência é todo o desejo imoderado, descontrolado, e foi por ele e para ele que Caim se entregou, gerando o pecado. E a morte foi a separação definitiva de Deus; e Caim saiu de diante da face do Senhor.
A VONTADE DE DEUS
Deus tem vontade? Ou teria, vontades?[1]. Essa é outra discussão que perpassa os séculos, gerando mais confusão do que esclarecimentos. O homem, por suas próprias limitações e pelo desejo de ter todas as coisas explicitadas, como se tivesse o domínio sobre elas, e assim pudesse garantir algum mérito para si mesmo, não tem como compreender todos os aspectos que envolvem o ser divino. Ainda que muitos afirmem isso, há um esforço e empenho em não aceitar essa proposição, de forma que acaba-se trilhando o caminho perigoso de se inferir de Deus aquilo que ele não é. Como já disse anteriormente, muito do que é proposto não passa do reflexo daquilo que somos: soberbos e orgulhosos. Em relação a Deus, qualquer palpite, suspeita ou conclusão decorrente da nossa mente, e não daquilo que ele revelou, será uma armadilha para quem a defende ou expõe. Entender que o ser divino é inexorável, que é-nos impossível sondá-lo, e que o pouco conhecimento de que dispomos é fruto da vontade soberana de Deus, sempre circunscrito à sua revelação especial, a Bíblia, tornaria mais fácil a nossa situação.
Com isso não estou reivindicando que se abandone os estudos e a meditação, que sejamos ignorantes e desconheçamos a Deus. Não é isso. Basta saber que há limitações, barreiras levantadas pelo próprio Deus, e de que elas são intransponíveis, ao menos nesta vida. É-nos assegurado que naquele dia, o dia glorioso do Senhor, nada perguntaremos. Talvez porque seja-nos revelado tudo instantaneamente pelo Espírito Santo; talvez porque não nos preocuparemos em questões que se colocarão irrelevantes diante da glória, esplendor e majestade divinas. E como esse é um ponto importante da ortodoxia, não há porque desprezá-lo.
Como disse, se definiu entre os reformados alguns conceitos e divisões da vontade de Deus. Esquemas foram propostos e aceitos exatamente por conta da nossa limitação, na tentativa de se aproximar o máximo da verdade sobre o assunto. Mas fato é que não se pode falar de vontades em Deus. Ele tem uma única, imutável e eterna vontade. Alguns pensam que há um conflito entre o que Deus quer e o homem realiza, de forma que a Bíblia parece revelar que nem tudo o que Deus quer suas criaturas o obedecem. Mas seria isso verdade? Penso que não. Pois se estaria criando um problema ainda maior que atingiria o atributo da soberania divina. Ou Deus é todo-poderoso, como a Escritura revela, ou ele tem limitações. Por aceitar certas limitações é que muitos caminham para o liberalismo, panteísmo ou panenteísmo, e até para a descrença total. Invariavelmente ela inicia-se com a incompreensão da Bíblia, culminando na recusa em aceitá-la como a fiel e inspirada palavra de Deus.
Portanto, em Deus não há vontades, nada além de uma única vontade. Acontece que ela se manifesta, aos nossos olhos de maneiras distintas. Veja bem, esse entendimento decorre da nossa deficiência, da incapacidade e limitação intrínsecas ao ser humano. Partindo-se da dedução, chega-se as classes de empregos teológicos de alguns termos, como vontade decretiva e preceptiva, antecedente e consequente, absoluta e condicional, dentre outras. Ainda que eu não aprecie esse tipo de classificação, para não parecer apenas "ranzinza" adotarei o que os calvinistas mais antigos chamaram de vontade revelada e secreta. Parece-me um esquema mais simples e bíblico, e que abrange de maneira mais eficiente a compreensão que se deve ter sobre o assunto.
Para mim, Deus tem uma vontade apenas, mas que nos é apresentada em duas perspectivas diferentes. A vontade divina é aquela soberana, pela qual ele decretou todas as coisas, de forma que elas invariavelmente acontecerão como ele planejou. E dentro desse decreto está toda a criação: o universo, os seres angelicais, os homens, o mal, o pecado, a queda, os fatos mais corriqueiros e irrelevantes que se possam imaginar. Tudo veio à existência pela vontade divina, e por ela tudo subsiste. Não há como a vontade de Deus ser resistida ou anulada. Dentro do seu plano soberano e eterno tudo acontecerá conforme a sua vontade estabeleceu. É o que Jó diz: "Bem sei eu que tudo podes, e que nenhum dos teus propósitos pode ser impedido" [Jó 42.2]. Em outras palavras, Cristo nos diz a mesma coisa: "Aos homens é isso impossível, mas a Deus tudo é possível" [Mt 19.26]. É possível que alguém diga que a fala do Senhor se refere exclusivamente à salvação. Mas, pergunto: não poderia esse princípio ser aplicado a tudo? Haveria limites para a vontade infinita e eterna de Deus? Ou, como tudo o que se refere a ele, ela também é absoluta, necessária e essencial, e não pode ser restringida jamais pelo contingente? Qualquer análise da vontade de Deus a partir de alguma limitação que não seja o próprio ser divino [e aí entramos em outro problemão, pois Deus é infinito também em sua vontade] incorrerá no equívoco. Fato é que a vontade divina acontecerá infalível e invariavelmente, sem chances de não acontecer.
Mais alguém pode dizer: como então Deus ordena que façamos algo, como cumprir a sua lei, e não o obedecemos? Não há uma flagrante oposição do homem, ao pecar, contra a vontade de Deus que abomina e ordena que não pequemos?
É aqui que entra a distinção acima, a classificação que utilizarei sobre a vontade de Deus. Temos que Deus tem uma vontade, a qual compreende o que nos foi revelado e o que não foi. O que nos foi revelado está na Escritura, e qualquer homem tem acesso a ela [não quero dizer que todos têm acesso à Bíblia efetivamente, mas que existe a possibilidade de todos terem. Para que algo aconteça é necessário que ele esteja no "mundo das possibilidades", do contrário não existirá]. Moisés diz exatamente isso, ao referir-se à Lei: "As coisas encobertas pertencem ao Senhor nosso Deus, porém as reveladas nos pertencem a nós e a nossos filhos para sempre, para que cumpramos todas as palavras desta lei" [Dt 29.29]. Com isso não se quer fugir de eventuais problemas, mas constatar que existe um problema, e que nem todo ele é compreensível pois está retido na mente de Deus. Aquilo que ele ordenou, e que é a sua vontade expressa, nos foi revelado, e qualquer um pode se asseverar dele, confirmá-lo. Deus delineou na sua palavra aquilo que ele quer que façamos, como reflexo da sua santidade, e para nos apresentarmos santos diante dele. Acontece que o homem, por sua própria imperfeição, não é capaz de cumpri-la. Aprouve a Cristo fazê-lo por nós. Essa é a vontade revelada de Deus, e que está ao alcance de todos os homens [novamente, como possibilidade].
Porém, há o que não nos foi revelado, e que se pode chamar de vontade secreta ou não-revelada, que é do exclusivo conhecimento divino. Apenas ele a conhece, mais ninguém. Nem mesmo os anjos celestiais. Ela está por detrás do curso histórico pelo qual o universo vem trilhando, e que podemos resumir como sendo o propósito eterno de Deus. Não sabemos o que é, nem como se dará, sabemos apenas que ela existe. Ela é a parte do decreto eterno que, assim como Paulo se referiu ao ser divino, é insondável e inescrutável. Nenhum de nós é capaz de penetrá-la, nem investigá-la. E essa vontade divina ordenou todas as coisas, inclusive a desobediência humana. Do ponto de vista humano, ao pecarmos, estamos em desobediência a Deus, e contra a sua vontade revelada, o preceito ou mandamento. Em relação a Deus, cumprimos exatamente o que ele decretou eternamente, e realizando ou pondo em execução o seu plano, satisfazendo à sua vontade oculta ou secreta.
Há algum tempo, expus o seguinte exemplo em uma conversa que virou texto:
"Acho apenas que o termo 'desejo' não deve ser empregado. Ainda que Deus queira. É como o Pai que não deseja punir o filho, mas tem de puni-lo para o próprio bem do filho. Ele o ama e não quer que ele se perca, por isso o castiga, mesmo não querendo castigá-lo; ele o faz pela necessidade insuperável... No caso dos eventos maus, Deus os decreta, mas não os deseja, porém eles cumprem o propósito maior de revelá-lo e a sua vontade primeira: separar um povo para si por meio de Cristo... Por desejo quero dizer ter prazer, se deleitar, etc. Mas se desejo é querer, isso ele quer" [2].
Certamente não tenho hoje o mesmo entendimento que àquela época, ainda que concorde parcialmente com o que disse. Em linhas gerais, Deus quer uma única coisa, o cumprimento da sua vontade, do seu plano, e ele se dará através de meios que parecerão, à primeira vista, conflitar e se opor à essa mesma vontade, mas que não se opõem nem conflitam, antes estão subordinadas à vontade maior, aquela que não nos foi revelada. Com isso quero dizer que a vontade revelada é subjacente, dependente da secreta.
Um outro exemplo é o da morte de Cristo. Pedro nos diz que Deus decretou todos os eventos, e que eles foram realizados por Pilatos, Herodes, os judeus e os gentios [At 4.26-28]. Qual era o decreto divino? Que seu Filho Amado, Jesus Cristo, fosse preso, humilhado e morto pelos homens. Entendo que Pedro, ao referir-se a judeus e gentios quis dizer que todos colaboraram para a sua morte, a qual, porém, não aconteceu por causa de todos, no sentido de que Cristo não morreu por todos os homens, mas especificamente pelos eleitos, pela sua igreja, para trazer a Deus um único povo. Como o profeta também diz: "Todavia, ao Senhor agradou moê-lo, fazendo-o enfermar; quando a sua alma se puser por expiação do pecado, verá a sua posteridade, prolongará os seus dias; e o bom prazer do Senhor prosperará na sua mão. [Is 53.10]. A vontade divina era de que Cristo morresse, mas isso implicaria em contradição com o 5o. mandamento, "não matarás" [Ex 20.13]? A Pilatos, Herodes, os judeus e aos gentios foi ordenado não matar. Mesmo assim eles mataram o doador da vida. Havia uma vontade de Deus para que os homens não matassem [considero o termo inadequado, pois reputo-o como preceito, ordem, o qual se encontra em conformidade com o ser santo de Deus], pois uma coisa é a vontade como um desejo, outra coisa é a vontade imperativa, como uma ordem a se cumprir incontestavelmente. Contudo, dentro da sua vontade soberana e suprema, foi-lhes ordenado crucificar o Justo. E qual era o objetivo maior? A redenção dos homens, a justificação que somente poderia vir pela morte do Redentor, assim como Deus havia dito aos profetas, milhares de anos antes; sem nos esquecer de que tudo tem como fim a glória de Deus.
De certa forma, até mesmo na sua vontade revelada há um caráter "secreto", ao menos para a maioria dos homens, até que ela se cumpra. Muitos que se não consideram a autoridade divina somente a compreenderão diante do Tribunal de Cristo, que julgará bons e maus, justos e injustos; e, então aqueles que durante toda a vida desprezaram o sábio e santo conselho divino, expresso através da sua palavra, perceberão que aquilo que estava oculto para eles, havia sido revelado indistintamente, e agora lhes falava direta e pessoalmente, em forma de sentença. E temos outra implicação, a qual é: a vontade soberana e secreta estará sempre em ação, muitas vezes se misturando à vontade revelada, enquanto esta, nem sempre, fará parte necessariamente do curso histórico de muitos homens e nações. Quantos, por exemplo, jamais tomaram conhecimento do código mosaico ou da morte de Cristo? Com isso quero dizer que, no fim-das-contas, há uma vontade superior e mais elevada, em que todas as demais "vontades" estarão sujeitas e dependentes.
O QUE O HOMEM DEVE PROCURAR?
Mais do que entender os conceitos e formulações teológicas do termo "vontade divina", o homem deve estar pronto a obedecer a Deus, naquilo em que ele nos ordena ser obedientes. Desprezar o seu conselho é trilhar o caminho perigoso da rebeldia, em direção célere à condenação e ao inferno. Todos os homens são chamados a obedecer a Deus, a honrá-lo com suas vidas, e a adorá-lo como único Senhor. Isso é posto para todos, indistintamente, e por isso Paulo diz que todos têm o conhecimento inato de Deus, pelo qual ninguém poderá alegar inocência. Somos todos pecadores, iníquos e inimigos de Deus, e se ele ordena a obediência é porque não haveria outra forma de conciliação com ele. Porém o homem, por si só, está impedido de obtê-la, de se reconciliar com Deus. Aprouve a Cristo fazê-lo por nós. Como sumo-sacerdote e único intermediário entre Deus e os homens, ele padeceu para que fôssemos aceitos como filhos adotivos pelo seu Pai. Por isso a ordem é geral, para que todos se arrependam: "Mas Deus, não tendo em conta os tempos da ignorância, anuncia agora a todos os homens, e em todo o lugar, que se arrependam" [At 17.30]. Do contrário, a ofensa a Deus persistirá, e aquele que permanecer nela será condenado, no dia determinado em que com justiça o mundo será julgado por Cristo.
E a vontade de Deus para os homens é que sejamos como ele, santo. E ao seu tempo, ele fará dos escolhidos aquilo que não nos foi possível fazer por nós mesmos, cumprindo-se tanto aqui como lá, na eternidade, toda a sua santa e perfeita vontade.
Notas: 1- Escrevi, há algum tempo, sobre Deus ter escolhas ou não, cujo texto pode ser lido em "Deus não tem escolhas". Creio que a leitura dele poderá ajudar no entendimento do que tentei explicar aqui.
Notas: 1- Escrevi, há algum tempo, sobre Deus ter escolhas ou não, cujo texto pode ser lido em "Deus não tem escolhas". Creio que a leitura dele poderá ajudar no entendimento do que tentei explicar aqui.
2- Extraído do texto: "Reprovação, vontade e hipercalvinismo".
3- Aula realizada no Tabernáculo Batista Bíblico em 27.06.2012.
4- Baixe esta aula em file.MP3
3- Aula realizada no Tabernáculo Batista Bíblico em 27.06.2012.
4- Baixe esta aula em file.MP3
domingo, 8 de julho de 2012
sexta-feira, 6 de julho de 2012
Estudo sobre a Confissão de Fé Batista de 1689 - Aula 30: A bondade de Deus e o Salmo 23
Por Jorge Fernandes Isah
A bondade de Deus está manifesta não em ele nos livrar das lutas, dores e tristezas do mundo, mas no fato dele nos manter em paz mesmo nas tribulações, de permanecermos confiantes quando tudo está desmoronando ao nosso redor, de nos manter dispostos a lutar ainda que estejamos fracos, de resistir ao pecado e à incredulidade quando as dúvidas nos assolam. Deus é supremamente bom ao estar sempre conosco, sem jamais nos abandonar, mesmo quando nos sentimos perdidos e sós. Como está escrito: “Provai, e vede que o Senhor é bom; bem-aventurado o homem que nele confia” [Sl. 34.8].
A bondade de Deus em dar bens materiais ao homem pode ser percebida por qualquer um, mas mais do que isso, a sua presença, e estar diante dela, é que o torna essencialmente bom para com os seus filhos. Veja bem, a bondade de Deus não está naquilo em que ele dá, mas naquilo que ele é, e sendo, transfere e participa aos que escolheu participar. Deus é bom, do ponto de vista humano, por suprir nossas necessidades, por nos dar a vida, saúde, livrar-nos do mal, mas o ápice da sua bondade é nos fazer semelhantes ao seu Filho Amado, Jesus Cristo, o qual é bom.
No Salmo 23, o rei Davi compôs um hino de amor e gratidão a Deus por seu cuidado, providência, vigilância e eterna presença, que mesmo nas agruras, perseguições e dificuldades da vida, ele jamais se sentiria desamparado, antes tinha a certeza de estar protegido por Deus. O profeta reconhece esse atributo maravilhoso do Senhor, de que ele é bom. Através de imagens inspiradas e que remetem ao conforto, refrigério da nossa alma, e à certeza do zelo divino para com os seus filhos, temos uma doxologia à sua bondade.
A presença constante e incessante de Deus em nossa vida é o que o faz bom. De uma bondade especial que somente pode ser sentida por aqueles aos quais ele se entrega. Por isso, digo sempre que a maior dádiva de Deus para conosco é ele mesmo se entregar a nós, de uma forma tão maravilhosa que é impossível não recebê-lo como o favor máximo, majestoso e esplêndido que se pode ter. Sem mérito algum de nossa parte, Deus se entregou por nós e cuidou que o aceitássemos como o dom, o presente, insuperável.
É também um cântico de confiança, em que Davi demonstra conhecer profundamente aquele em quem depositou a sua vida. E isso nos leva a crer que somente aqueles que conhecem a Deus podem confiar nele; de forma que Deus se revelará apenas aos que ele conheceu eternamente. Este Salmo é completamente dedicado à bondade de Deus, em suas várias formas de se manifestar na vida daquele que foi feito santo pela obra de Cristo.
A ideia da presença do Senhor na vida do servo é constante. E aqui, ao que parece, Davi estava em uma posição difícil, provavelmente cercado por inimigos, numa situação de morte iminente, em um “beco-sem-saída”. E, ainda assim, ele foi capaz de compor este hino, glorificando a Deus, que é bom.
“O Senhor é o meu pastor, nada me faltará”. Temos a imagem de Deus como um pastor, aquele que cuida e protege as suas ovelhas, suprindo-as em tudo. Davi não somente se utilizou de uma forma poética ou retórica, mas quis dizer exatamente o que disse: o Senhor é o meu pastor; e, assim, reconheceu o cuidado de Deus para com ele, e de que era fruto da sua bondade. Somente quem é bom pode suprir o outro em tudo, e essa é uma característica que somente Deus tem, pois somente ele é capaz de saciar a necessidade mais básica do homem [se é que há alguma necessidade que se possa chamar de “básica”] até a mais exigente, sendo que em todas elas pouco ou nada podemos fazer para colaborar.
Infelizmente as pessoas têm apenas uma idéia material e imediatista deste verso. Não há nada de errado nisso, mas o erro está em se pensar apenas nisso, de que Deus é capaz somente de suprir nossas necessidades materiais. Mas ele cuida de nós de forma total, completa, sendo que as maiores necessidades do homem moderno não são materiais, mas da alma. De forma que ricos e pobres, brancos e negros, homens e mulheres, adultos e crianças, encontram-se enfermos, e a cura somente é possível através do Bom Pastor, Jesus Cristo [Jo 10].
“Deitar-me faz em verdes pastos... “. É uma imagem bucólica, tranqüila, reconfortante. Dando-nos uma ideia de segurança, de certeza em descansar mansamente sob os cuidados sublimes do bom Deus. Novamente, somente aquele que é bom pode dar ao outro a serenidade, a pureza e o descanso seguro.
“Refrigera a minha alma; guia-me...”. Mais uma vez, temos a imagem do descanso, o que nos faz lembrar do que nos disse o Senhor Jesus: “Vinde a mim, todos os que estais cansados e oprimidos, e eu vos aliviarei. Tomai sobre vós o meu jugo, e aprendei de mim, que sou manso e humilde de coração; e encontrareis descanso para as vossas almas. Porque o meu jugo é suave e o meu fardo é leve” [Mt 11.28-30]. Cristo é ao mesmo tempo aquele que nos refrigerará a alma, mas também ele é o caminho da justiça, as veredas da justiça, pelo qual fomos feitos justos e capazes de trilhar no terreno da justiça. Morrendo por nós, na cruz, ele se fez justiça para que fôssemos justificados e feitos justos diante de Deus. E Cristo se torna, assim, o nosso duplo descanso pois, ao descansarmos nele, descansamos de nós mesmos, e da nossa busca impossível pela justiça meritória.
“Ainda que eu andasse no vale da ...” O que é a morte? Durante muitos anos, décadas, fui afligido com a ideia da morte. Ela sempre me perseguia, como um inimigo a me fustigar intermitentemente, desde a mais tenra idade. Precisei muitas vezes me embriagar para conseguir dormir. A morte é uma certeza na vida, de que todos, um dia, morreremos. Porém há uma diferença: aquele que confia no Senhor não a teme, porque sabemos que ela não nos pregará surpresas, pois Cristo venceu-a, dando-nos a vitória [1Co 15.55-57]. O que mais me incomodava era a incerteza que a morte traria: se havia vida pós-morte, como seria essa vida, e em que condições eu a desfrutaria, se é que a desfrutaria. A morte, em si mesma, era uma conhecida, mas o que ela traria de conseqüências é que me atormentava. Essa ideia não mais existe. Com isso não quero dizer que a morte não possa trazer sofrimento e dor, mas de que Deus nos capacitará a atravessá-la de uma maneira confiante, porque ele estará sempre conosco, e o seu consolo estará presente, mesmo no momento mais doloroso e sofrido que se possa ter na morte.
A imagem de vara e cajado alude à disciplina, à correção, de forma que possamos ser conduzidos no bom caminho, aprimorados na santidade, e certos de que aquele a quem o Pai corrige esse ama, e se ama, a sua bondade está derramada sobre ele; e ainda que a correção não pareça ser uma alegria mas tristeza, o seu exercício produz um fruto pacífico de justiça [Hb 12.11].
Mas o profeta nos revela também que Deus nos chama, como o melhor anfitrião, a assentarmos na mesa para o banquete que ele nos preparou. Revelando-nos que somos íntimos de Deus, e nela, ele se alegra em agradar-nos com mais do que a comida e a bebida, mas com a sua presença. Os preparativos do banquete são provas da bondade divina, do seu cuidado e zelo, mas mais do que isso, ela nos remete à sua presença, à essência e à natureza santa, bondosa e perfeita do ser divino. Que pode ser reconhecida por qualquer um, em princípio, mas que é rejeitada pela maioria dos homens em sua insistente ignorância de se considerar autossuficiente e em um permanente estado de alienação, de rejeição da verdade. Para isso, se apegam à falsa realidade; à ilusão que não os deixam escapar da prisão que se autoimpõe.
E é nesse contexto que a igreja tem um papel fundamental, como emissária da boas-novas, de que há cura para o sofrimento humano. Podemos agir de duas maneiras, as quais se complementam: a primeira, é suprindo as necessidades imediatas das pessoas, ajudando-as naquilo que lhes faltam. Mas não podemos nos esquecer de que a barriga cheia logo se esvaziará, e precisará novamente de algo que a preencha. E não devemos nos furtar a sempre estarmos atentos a cumprir a missão de auxiliar o próximo materialmente.
Contudo, não podemos nos esquecer de que a barriga cheia atenuará apenas uma parte do sofrimento humano, e, provavelmente, a parte menos significativa do homem. O Evangelho tem o poder de alimentá-lo e sustentá-lo naquilo que ele tem de mais importante e mais urgente: o seu relacionamento com Deus. O pecado, e a condição do homem de pecador, ainda que ele resista a admitir, sempre o deixará em constante angústia. O fato de muitos não pensarem nisso, de negligenciá-lo, é usado como um recurso para não se sofrer. Mas é um engano ao qual o homem é levado pelo pecado. Ele, esteja-se consciente ou não, sempre manterá o homem em angústia e sofrimento. O próprio fato de sustentá-lo em sua voracidade, com as conseqüências naturais que ele provoca, é a prova de que, mesmo na ostentação e na satisfação de todos os desejos materiais e carnais, o homem permanece angustiado e em sofrimento. O alívio físico não alivia a alma; mas o alívio na alma, o refrigério que Davi nos mostra, e somente possível em e por Cristo, é capaz de nos fazer compreender que a corruptibilidade da carne é algo aceitável, ainda que fruto da desobediência e do pecado, o que nos deve entristecer, mas que uma alma restaurada pelo poder de Deus resultará em um corpo incorruptível. O corpo saudável e que se deteriorará não pode garantir a saúde da alma, mas a alma saudável, transformada por Deus, assegurará um corpo igualmente saudável, transformado à semelhança do corpo do nosso Senhor.
E não é interessante que essa seja a resposta para a aflição humana? E de que, somente assim, podemos verdadeiramente ajudar e auxiliar os necessitados? Sejam eles materialmente ricos ou pobres? Porque o problema maior do homem não é o material mas o espiritual. Davi, cercado, ameaçado por seus inimigos, prestes a sofrer o ataque, encontrava-se me paz, no descanso que somente Cristo pode dar.
Devemos ajudar as pessoas como conseqüência de uma fé viva, mas sem jamais nos esquecer da mensagem do Evangelho, o qual cura a alma doente; e que se assim permanecer, doente, jamais ocupará um corpo são.
Mais uma vez repito, Deus é bom não naquilo que ele simplesmente dá, mas ele é bom em si mesmo, e isso é o que ele nos dá, a si mesmo, porque ele é bom. Sobretudo, somente quem o conhece pode reconhecer a sua bondade; e essa é a prova maior da bondade de Deus, deixar-se revelar e conhecer até pelo mais mísero pecador, ao ponto em que, cada um de nós, se alegre em reconhecer e dizer que Deus é "o meu Senhor e o meu Pastor".
Pode-se ter quase tudo ou pode-se ter quase nada, mas se você conhece a Deus e confia nele, você tem tudo.
Notas: 1 - Aula realizada no Tabernáculo Batista Bíblico em 20.05.2012
2 - Baixe esta aula em file.MP3
Assinar:
Postagens (Atom)
CLIQUE, NO TÍTULO DE CADA UMA DAS POSTAGENS, PARA ACESSAR O ÁUDIO DO SERMÃO OU ESTUDO