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quinta-feira, 13 de março de 2014
sexta-feira, 7 de março de 2014
segunda-feira, 3 de março de 2014
sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014
Estudo sobre a Confissão de Fé Batista de 1689 - Aula 60 - Dons apostólicos: Cura
Por Jorge Fernandes Isah
A
primeira coisa a dizer é que cremos no
poder de Deus de curar, ao contrário do que alguns afirmam. Contudo não
cremos mais que Deus o faça pelas
mãos de homens ou mesmo pelos objetos que eles usavam. A Bíblia nos
informa que a sombra de Pedro curava as pessoas [At 5.12-16]. Ele não
orava nem as tocava, mas apenas o passar da sombra pelos enfermos
curava-os. Igualmente as roupas de Paulo eram instrumentos de Deus para
a cura dos doentes [At 19.11-12]. Mas isso poderia acontecer hoje?
Podemos afirmar que não, porque essas maravilhas eram realizadas pelos
apóstolos como confirmação de que a mensagem de boas-novas, o Evangelho
de Cristo, provinha de Deus. E somente os apóstolos podiam transferir
esses dons a outros irmãos da igreja, como já vimos em outra aula.
Ninguém mais! Portanto, com o fim da era apostólica, esses dons
cessaram, pois já não podiam mais serem transmitidos; não havendo
nenhuma outra forma de sucessão apostólica além da autoridade que os
próprios apóstolos possuíam. O dom de transmitir tal poder pertencia a
eles, e somente a eles.
Então,
é preciso entender que o dom de cura tinha um caráter
revelacional e estava diretamente ligado à testificar e ministrar o
Evangelho de Cristo. Não tinha por objetivo apenas curar o enfermo, como
vemos hoje nas "campanhas de cura", onde o Evangelho não é pregado,
Cristo não é pregado, não há arrependimento, conversão, mas apenas uma
proposta de cura do corpo enquanto a alma está moribunda e o espírito
agonizante. Nada disso tem a ver com o dom dado à igreja primitiva. A
cura, assim como os milagres, tinham o propósito de revelar Cristo e sua
obra através da pregação do Evangelho, e de que ele provinha de Deus;
igualmente testificava que os apóstolos e discípulos não proclamavam
nenhuma mensagem meramente humana, mas eram porta-vozes do próprio Deus.
Não pensem também que a igreja era um pronto-atendimento, como muitas
igrejas defendem e tentam copiar, porém copiam um padrão que não é
eclesiástico nem neotestamentário. A cura servia a uma finalidade, como
já dissemos, e nem todos eram curados, e muitos não foram, como a
própria escritura informa, porque era específico, restrito a certas
situações. Os dons não eram como varinhas-de-condão, bastando
acioná-las que automaticamente entrariam em ação e proporcionariam os
efeitos desejados. Como exemplo, há o caso de Epafrodito, o qual é
citado por
Paulo como alguém que quase morreu, pois estava muito doente. A ordem
sequencial, em Filipenses 2:25-27, é:
esteve muito doente, e quase morreu, indicando que o seu estado de saúde
agravou-se no decorrer da enfermidade. Deus o curou, e o apóstolos se
alegrou de Deus tê-lo feito, mas não há nenhuma indicação de que foi por
intermédio do apóstolo que o Senhor o fez. Ao ponto de Paulo dizer que
Deus
teve misericórdia do seu companheiro de lutas e cooperador mas também
de si mesmo, poupando-o de sofrer tristeza sobre tristeza, com a
possibilidade da morte do amigo e irmão. Se Paulo dispunha do dom no
momento e hora em que quisesse usá-lo, por que não o fez? Ou não
dependia simplesmente dele acioná-lo? Era necessário cumprir um
propósito previamente estabelecido e comunicado por Deus? O que nos
mostra que os apóstolos não eram super-homens, nem homens independentes,
mas homens comuns poderosamente usado pelo Senhor, sujeitando-se à sua
vontade e dependentes dela.
Fica claro que Paulo, se ainda tivesse esse dom ou pudesse
usá-lo a seu bel-prazer, não se furtaria a curar Epafrodito, um colaborador tão amado. Logo o dom
de cura não era algo automático e infalível, e que se podia dispor dele
quando bem o quisesse. Ele também diz que deixou Trófimo doente em
Mileto, ao despedir-se de Timóteo [2Tm 4.20], e sugeriu ao próprio
Timóteo que tomasse um pouco de vinho por conta das frequentes dores no
estômago e outras enfermidades [1Tm 5.23].
O
próprio fato de Paulo referir-se a um "espinho na carne", que
bem podia ser uma doença usada por satanás para esbofeteá-lo [2Co
12.5-10], e ainda de um certo problema de visão que o acometeu
durante bastante tempo, quando primeiro anunciou o evangelho aos
gálatas,
estando em fraqueza da carne [Gl 4.12-15], corrobora o fato de que ele
não podia curar-se a si mesmo, utilizando-se do dom de cura em benefício
próprio. Isso pode deixar muitos crentes atônitos: mas, para que o dom
de cura se não posso curar a mim mesmo? E eu diria que, mais do que
satisfazer aos nossos desejos pessoais Deus tem um plano maior, que é a
sua glória, e, muitas vezes, não está nesse plano que um crente seja
curado, que não sofra um acidente, que não seja perseguido, perca os
seus bens e família, torturado ou morto [como Lutero proclama no hino
323, do Cantor Cristão, "Castelo Forte":
Sim, que a palavra ficará,
Sabemos com certeza,
E nada nos assustará,
Com Cristo por defesa.
Se temos de perder,
Os filhos,bens,mulher,
Embora a vida vá,
Por nós Jesus está,
E dar-nos-á seu Reino.].
Sim, que a palavra ficará,
Sabemos com certeza,
E nada nos assustará,
Com Cristo por defesa.
Se temos de perder,
Os filhos,bens,mulher,
Embora a vida vá,
Por nós Jesus está,
E dar-nos-á seu Reino.].
Portanto,
a nossa conclusão é de que o dom de cura era
especialmente ministrado em momentos específicos, e de forma bastante
restritiva, no sentido de não ser um acontecimento trivial e
corriqueiro, como muitos hoje querem fazer parecer. Ao se afirmar que o
problema é de fé, a glória da cura passa a ser do homem, sem o qual não
haveria o dom. Mas sabemos que Deus é sempre glorificado, e ninguém pode
tirá-la. É algo que os cristãos devem pensar: há uma divisão de ações
entre Deus e os homens, no sentido de que algo que o Senhor quer fazer
não acontecerá porque impedimos?... Especialmente aos calvinistas
gostaria de deixar essa reflexão. E, se Deus divide conosco a decisão da
cura, no sentido exposto acima, de que se não quisermos a sua vontade
decairá, mas se desejamos e a cura acontece, a glória não deve ser
dividida com o homem? Não é talvez por isso que muitos são exaltados
quase à altura de Deus? Porque quem assim o faz reconhece nesse homem um
poder e uma decisão de semideus? E vou mais além: não há um espírito de
falsa-modéstia, de dissimulação [consciente ou não] quando não
assumimos isso e dizemos, da boca para fora, "não, a glória é somente de
Deus"?
Por estes e vários outros motivos, mas especialmente pelo testemunho da palavra de Deus, não nos curvamos ao modernismo e ao imediatismo de aceitar os dons apostólicos como contemporâneos. Certamente eles veem mais para cegar ou manter cegos os ímpios do que para iluminar os salvos.
Notas: 1) Aula ministrada na E.B.D. do Tabernáculo Batista Bíblico;
Por estes e vários outros motivos, mas especialmente pelo testemunho da palavra de Deus, não nos curvamos ao modernismo e ao imediatismo de aceitar os dons apostólicos como contemporâneos. Certamente eles veem mais para cegar ou manter cegos os ímpios do que para iluminar os salvos.
Notas: 1) Aula ministrada na E.B.D. do Tabernáculo Batista Bíblico;
2)
Uma análise mais profunda está disponível no áudio desta aula, onde são
abordadas questões e passagens bíblicas não examinadas no texto, como
Mt 9:18-26, 15:29-31 e Atos 3:1-10, inclusive a ligação de Israel e os
judeus com a incredulidade em Cristo;
3) Baixe está aula emAula 76 - Dons V.MP3
domingo, 9 de fevereiro de 2014
Estudo sobre a Confissão de Fé Batista de 1689 - Aula 59 - Dons Apostólicos: Fé
Por Jorge Fernandes Isah
Entendo que a fé a qual Paulo se refere não é a salvadora ou aquela que Deus nos dá para reconhecermos Cristo como Senhor e Salvador, visto ser dada a uns e não a todos os irmãos.
Mas,
então, a qual fé o apóstolo se refere como um dom especial? Bem,
provavelmente, esta fé está relacionada com milagres e, mais
especificamente, com aquilo que Cristo disse aos seus discípulos:
"Porque a fé que vocês têm é pequena. Eu asseguro que, se vocês tiverem
fé do tamanho de um grão de mostarda, poderão dizer a este monte: 'Vá
daqui para lá', e ele irá. Nada será impossível para vocês" [Mt 17:20].
Se atentarmos para o texto, os discípulos não conseguiram expulsar um
demônio de um menino, o que levou o seu pai a implorar ao Senhor para
que o fizesse, ao que Jesus desabafou: "Ó geração incrédula e perversa,
até quando estarei com vocês? Até quando terei que suportá-los?
Tragam-me o menino" [v.17]. Após ordenar que o demônio saísse do rapaz,
viram os discípulos que o demônio obedeceu imediatamente à ordem do
Senhor, e lhe perguntaram, em particular: "Por que não conseguimos
expulsá-lo?, então, o Senhor apontou o problema: a falta de fé!
Portanto,
tudo indica que esse dom estava diretamente ligado à fé que produzia
milagres; mas, também, a fé produzia um milagre especial, do qual toda a
igreja deveria compartilhar, que é de acreditar no poder divino, de
maneira a não deixá-los entregues à incredulidade, ao desânimo, às
vicissitudes, sabendo que o poder de Deus era maior do que todas as
coisas e, entre elas, a maior que um homem pode almejar é o de
testemunhar a Cristo, o que, convenhamos, diante de um mundo caído e
que odeia a Deus, não é nada muito fácil.
Se
atentarmos para as circunstâncias daquele momento histórico,
perseguições, apedrejamentos, prisões e mortes, simplesmente pelo fato
de professar a fé em Cristo e proclamar as suas boas-novas, havemos de
entender a situação de angústia, sofrimento e dor pelas quais os irmãos
eram provados. Por isso, acredito que havia um dom especial de fé, de
levar à fé outros irmãos, de estimulá-los a crer nas promessas do
Evangelho, na esperança, na qual toda a igreja deveria comungar, nos
momentos emergenciais, de forma que essa fé servia como consolo, mas
igualmente era uma "força motriz" na intercessão junto a Deus por
aqueles que eram afligidos pelos inimigos e que se sentiam "fracos na
fé" [Rm 14.1]. Certamente eram irmãos que, com o dom especial de fé,
auxiliavam e sustentavam os débeis [1Ts 5.14], suportando as suas
fraquezas [Rm 15.1-2].
Esta fé capacita-nos também a colocarmo-nos à serviço de Deus, de honrá-lo e glorificá-lo com nossa vida e atitudes, levando-nos a dar um bom testemunho de Cristo. Há também o fato de que ela produz a esperança e certeza nas promessas que nos foram entregues por Deus, persuadindo-nos de tudo o que ele disse se cumprirá, pois ele é verdadeiro, tornando o que ainda não vemos em certeza, a fim de que a nossa alma caminhe tranquila e confiante na revelação. Não é o que diz Hebreus 11.1-3?
"Ora, a fé é a certeza daquilo que esperamos e a prova das coisas que não vemos. Pois foi por meio dela que os antigos receberam bom testemunho. Pela fé entendemos que o universo foi formado pela palavra de Deus, de modo que aquilo que se vê não foi feito do que é visível".
Outro
ponto importante em relação à fé é que, por ela, Cristo habita em nós,
e ele somente habitará naquele que tem fé, que receberá a plenitude da
graça, ao passo em que Cristo está-se formando nele. Esta é uma
relação de dependência do crente em Cristo, pois tudo é dele e nós
também o somos. E, como o apóstolo Paulo, poderemos dizer, seja agora
ou em breve, "já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim. A vida
que agora vivo no corpo, vivo-a pela fé no filho de Deus, que me amou e
se entregou por mim" [Gl 2.20].
Notas: 1- Aula realizada na EBD do Tabernáculo Batista Bíblico
2- Ouça e baixe o áudio desta aula em Aula 75 - Dons IV.MP3
Estudo sobre a Confissão de Fé Batista de 1689 - Aula 58 - "Dons apostólicos: Palavra de Sabedoria e Palavra de Ciência"
Jorge Fernandes Isah
1) Palavra de Sabedoria:
O que vem a ser a palavra de sabedoria? Os irmãos sabem?
O que vem a ser a palavra de sabedoria? Os irmãos sabem?
Bem,
entendemos que, naquele tempo, a Bíblia ainda não estava completa,
concluída. Hoje é fácil para nós termos uma palavra sábia, bastando para
isso conhecer, meditar, entender e aplicar a revelação divina, a qual,
em princípio, está a disposição de todos os homens. Mas, e como
acontecia, nos tempos de Paulo? Como a igreja era orientada e guiada no
Evangelho, na vida cristã, se o cânon ainda estava em formação? Do ponto de vista formal e final?
Deus
designou a alguns esse dom, que está diretamente ligado e incluído no
caráter revelacional divino. Havia questões que surgiam e eram novidades
no seio da igreja, e que requeriam o norteamento, uma direção na qual
os irmãos deveriam guiar-se e serem conduzidos. Muitas dessas situações
foram apresentadas nas epístolas, como, por exemplo, o comer ou não a
carne oferecida aos ídolos, ou a circuncisão, se era um fundamento para a nova aliança.
Não podemos esquecer jamais que o manual de fé e vida do crente
encontrava-se incompleto, em formação, e, por isso, era necessário Deus
designar irmãos, no corpo local, que viessem com uma palavra sábia sobre
uma questão confusa ou que suscitasse discussões e dúvidas na igreja;
os princípios pelos quais ela deveria ser guiada ainda não formatados,
por isso a urgência desse dom, a fim de que os problemas fossem
resolvidos e tivessem uma direção que a conduzisse na paz, crescimento e
aperfeiçoamento como o Corpo de Cristo.
Algo
que não se deve negligenciar é o fato de que um dom espiritual tem de
trazer, necessariamente, proveito à igreja, como Paulo afirma no verso
7. Nenhum dom pode ser dado sem que haja um fim proveitoso. Muitos dizem
ter vários dons em nossos dias mas, mesmo assim, não há proveito algum
para a igreja. E, por proveito, entenda-se o aperfeiçoamento, o
crescimento, o amadurecimento, da igreja no conhecimento de Deus e sua
vontade. Não é algo a se exibir e a trazer benefícios para alguns ou,
mesmo que sejam muitos, do ponto de vista econômico ou social. Ainda que
estes campos possam ser atingidos pela Palavra, a meta principal é o
conhecimento de Deus, por meio daquilo que ele nos deu e revelou, e
assim, tornarmo-nos cada dia mais semelhantes a Cristo, e que ele seja
cada vez mais visível através de nós, e não o contrário, que sejamos
mais nós mesmos a exalar um suposto mérito que em nada tem a ver com o
Evangelho. Como João o Batista disse: É preciso que ele cresça [Cristo],
e eu diminua!
Este
é portanto um dom ainda atual, que pode ser ministrado por qualquer
crente, em princípio, pois temos a palavra de Deus completa, terminada,
acabada, não havendo nada a se acrescentar ou tirar, e que é a nossa
fonte de conhecimento, amadurecimento, na qual o Espírito laborará para
que Cristo seja formado dia-a-dia e, ao fim, sejamos semelhantes a ele e
como ele.
2- Palavra de Ciência:
Portanto, como vimos no tópico anterior, os irmãos, daquele período específico, não tinham a Bíblia completa como nós a temos atualmente, de forma que haviam muitas questões na igreja a serem entendidas e compreendidas, mas sem que houve um manual divino para orientá-los na solução dos problemas que surgiam. Certamente, todas as soluções já estavam apontadas no AT, como sombras, mas era necessário clarificá-las, confirmá-las e trazê-las à luz de Cristo, o qual, juntamente com os apóstolos, era o fundamento da fé e, sem o qual, nada poderia ser verdadeiro e divino.
2- Palavra de Ciência:
Primeiramente,
muitos confundem o termo "ciência" com tecnologia ou desenvolvimento
científico ou acadêmico, no caso das ciências políticas, biológicas,
físicas, etc. É importante notar que Paulo não está a falar desses tipos
de ciências, mas de uma ciência que seja o conjunto de conhecimentos
fundados e fundadores da fé cristã. Ele está falando de doutrina, e o
termo ciência, derivado do latim scientia, quer dizer exatamente
conhecimento, saber, instrução ou noção de um determinado assunto. E de
qual assunto Paulo está a tratar? Da alma, pois não está a falar de
matemática, astrofísica ou sistemas políticos.
Portanto, como vimos no tópico anterior, os irmãos, daquele período específico, não tinham a Bíblia completa como nós a temos atualmente, de forma que haviam muitas questões na igreja a serem entendidas e compreendidas, mas sem que houve um manual divino para orientá-los na solução dos problemas que surgiam. Certamente, todas as soluções já estavam apontadas no AT, como sombras, mas era necessário clarificá-las, confirmá-las e trazê-las à luz de Cristo, o qual, juntamente com os apóstolos, era o fundamento da fé e, sem o qual, nada poderia ser verdadeiro e divino.
Por
isso, Deus deu dons a alguns irmãos para que o corpo doutrinário se
concluísse e toda a igreja fosse ensinada, instruída e firmada na
revelação, não parcial mas completa, que agora a igreja dispunha e que
se fazia necessária diante das ameaças e investidas de satanás e seus
súditos, sem a qual a igreja não poderia crescer e ser edificada.
Como
o dom de sabedoria, este dom também está presente nos dias atuais,
bastando para isso que o cristão leia, medite, conheça e aperfeiçoe-se
no conhecimento da doutrina que nos é revelada pelas Sagradas
Escrituras.
2 -Muitos outros pontos e exemplos são abordados no áudio da aula passada e no da próxima aula, os quais se apresentam resumidamente nesta postagem
Estudo sobre a Confissão de Fé Batista de 1689 - Aula 57 - Dons apostólicos: arrogância e soberba espiritual denunciadas por Paulo
Por Jorge Fernandes Isah
Nas aulas anteriores, vimos que os dons espetaculares ou apostólicos ou da segunda-bênção ou miraculosos foram específicos e circunscritos a um determinado momento histórico, o período da Igreja Primitiva, e tinha por objetivo revelar a Pessoa do Senhor Jesus, sua obra, ressurreição e "validar" a mensagem e o ministério apostólico, e, por fim, sancionar o cânon, a Escritura Sagrada, que ainda não estava concluída, do ponto de vista formal.
Analisamos
que a ideia de um "segundo batismo" do Espírito Santo se baseia em um
texto que nada tem a ver com isso, o qual é Mateus 3:11, e que para se
crer em um "batismo de fogo" como os pentecostais e carismáticos estão
convencidos, é preciso fazer-se uma ginástica e tanto, um malabarismo,
forçando e excluindo o contexto dos 10 versos anteriores para se
concluir que João, o Batista, está a falar de outro batismo no Espírito
Santo.
Estudamos
também que eles eram sinais, e os sinais não têm função quando a
realidade se apresenta completamente. Eles são indicativos, que apontam
para uma realidade, mas quando esta se apresenta acabada, plena, não
há necessidade deles. Como disse, na aula passada, fazendo uma
analogia, se vou a primeira vez a um consultório médico me guiarei
pelas placas das ruas e a numeração dos edifícios. Ainda, no prédio, me
guiarei pela sinalização dos andares e salas. Encontrado o
consultório, eles não mais são necessários. Assim são os sinais
espetaculares, eles apontam para Cristo, obra, mensagem e mistério, e,
por fim, para a Bíblia, como palavra infalível, inerrante e divinamente
inspirada de Deus. Eles foram também usados para revelar o novo Pacto,
ou Aliança de Deus, não somente aos judeus, mas aos samaritanos e
gentios, de forma que a mensagem do Evangelho estava, naquele momento,
disponível a todos os homens de todas as nações e não era mais algo
exclusivo do povo de Israel. Logo, esses sinais não são mais
necessários, pois toda a revelação está pronta e acabada e, como
advertência da própria Escritura, aí de quem tirar ou incluir uma
palavra que seja [Ap 22.18-19].
Na
pregação do último domingo, o Pr. Luiz Carlos, dando continuidade ao
estudo do livro de Atos 19:2-7, abordou também a questão dos dons
sobrenaturais, clarificando e trazendo novos elementos para o
entendimento de que esses dons foram restritos àquele período e não
mais são necessários atualmente.
Por
isso, vamos proceder a um estudo dos capítulos 12, 13 e 14 de 1
Coríntios, onde Paulo fala acerca dos dons espirituais. E entenderemos a
motivação que levou o apóstolo a escrever aos Coríntios sobre a
necessidade que eles tinham de compreender, e não manterem-se
ignorantes, quanto à função e ação dos dons na igreja.
Primeiramente,
ele alerta para o desconhecimento, da igreja de Corinto, quanto ao uso
dos dons espirituais. Ao dizer não querer que os irmãos sejam
ignorantes, ele acusou-os de não terem o conhecimento adequado no uso
dos dons, e de que a forma como o faziam não era correta. Já, no início,
Paulo os chama a humildade, revelando que eram gentios, não incluídos
inicialmente no Pacto, e guiados aos ídolos mudos [v.2]. Provavelmente,
eles se sentiam, de alguma maneira, superiores e, talvez, até mesmo
sobre os judeus, por causa dos dons, ou sobre aqueles que não tinham
esses dons, e o apóstolo trata de mostrar-lhes o que eram, como viviam,
e de que agora suas vidas eram outras, transformadas pelo poder de
Cristo e pela mensagem do Evangelho, não podendo então se entregarem ao
pecado da arrogância e superioridade espiritual. Não vejo outro motivo
para Paulo deixar tão clara a condição na qual os coríntios haviam
vivido a maior parte de suas vidas, e de que, agora, chamados ao
Cristianismo, se exaltariam, fazendo-se superiores, por causa dos dons
que Deus lhes entregara e que era para benefício de toda a igreja, e
não para a vaidade e glória pessoais.
Por
isso, ele alerta sobre a necessidade deles compreenderem e entenderem
que "ninguém que fala pelo Espírito de Deus diz: Jesus é anátema, e
ninguém pode dizer que Jesus é o Senhor, senão pelo Espírito Santo"
[v.3]. É possível que eles desprezassem irmãos que reconheciam Cristo
como Senhor, mas não exerciam nenhum dom sobrenatural.
Então,
ele fala da diversidade de dons, em que Deus os distribuiu
generosamente à igreja, contudo, um só era o o Espírito que os
distribuía [v.4]. Paulo está a dizer que nenhum dom é superior ao
outro, no sentido de que um deles é "menos" de Deus que o outro, ou o
outro é "mais" de Deus do que o primeiro. Paulo percebeu uma certa
vaidade nos irmãos que, tal qual acontecera com eles em relação ao
apóstolo, Apolo, Pedro e Jesus, provavelmente se vangloriavam do dom que
tinham, desprezando o dom alheio. Assim, aquele que falava em línguas
se considerava maior, mais espiritual, e o que falava duas ou três
línguas se considerava ainda maior e mais espiritual. O que Paulo está
dizendo à igreja é que todos os dons são iguais, desde que para a
edificação da igreja, e todos procedem do mesmo Deus; de forma que
aquele que não tem um dom espetacular, por exemplo, falar em línguas ou
profetizar, é também movido pelo Espírito, o qual o usa como e quando
quer, operando tudo em todos, de forma que a manifestação é dada a cada
um, para o que for útil [v.4-7].
Um
parênteses: a forma de que Paulo se utiliza nos versos 4-6, falando
que o Espírito é o mesmo, O Senhor é o mesmo, e Deus opera tudo em
todos, dá a medida de unidade e diversidade, tanto na Trindade, como no
Corpo de Cristo. De forma que temos personalidades distintas, o
Espírito Santo, Cristo e o Pai mas que são um. Assim também é a igreja,
onde há muitos membros, e muitos dons distribuídos a esses membros, mas
um só corpo. E a esta unidade diversa, ou diversidade unitária, que
muitas vezes é tão enigmática, de difícil compreensão, que não devemos
esquecer, e lembrarmo-nos de que sem a cabeça, Cristo, o corpo não
sobreviveria; estamos unidos a ele, e é por ele que se manifesta cada um
dos membros, segundo o poder divino de operar.
Muitos
contemporâneos alegam que não crer nos dons sobrenaturais é o mesmo
que limitar a Deus, e Deus não pode ser aprisionado. É verdade, mas
lembremos que Deus é imutável, mas a imutabilidade divina não quer
dizer que ele está estático, imóvel; pelo contrário, Deus está agindo
neste momento em cada uma das menores partículas existentes no Cosmos,
pois sem a sua ação, nem mesmo essas partículas, muitas invisíveis e
desconhecidas ao homem, sobreviveria. Portanto, Deus é um agente ativo
em toda a sua obra, contudo, penso que devolver a pergunta ao
inquiridor o deixaria também em situação desconfortável, pois, o fato
de confundir imutabilidade com inoperância, não pode significar que ao
não "remover" certos fatos e acontecimentos como as pragas do Egito
operadas através de Moisés, o milagre de multiplicar azeite e pão
através de Elias, o Sol parar e o abrir do Jordão através de Eliseu,
fatos que não mais aconteceram e que não se mantiveram nos dias
atuais, não seria o mesmo que engessá-lo? Ou seja, por que Deus não
opera mais milagres e feitos como esses? Estaríamos acusando-o de
estaticidade? E, se esses milagres não persistiram, no decorrer da
história, por que os feitos dos apóstolos persistiriam? A resposta é
simples, Deus tem um propósito para todas as coisas, e cada uma delas
acontecerá dentro do propósito divino. A continuidade dos dons
sobrenaturais após o séc. I é algo que não tem propósito, pois o poder
de Deus se manifesta de maneira diferente, através da proclamação do
Evangelho de Cristo pela igreja, pela reverência e obediência à sua
santa palavra. Os mesmos motivos que justificariam, ao ver dos
pentecostais e carismáticos, a atualidade dos dons apostólicos, têm de
ser também para corroborar que o Sol pare, o Mar Vermelho se abra, e a
água seja transformada em vinho. Do contrário, ambos não concorrem para o
fim desejado, e são improcedentes.
Continuando, Paulo descreve os dons dados à igreja pelo Espírito Santo:
1) Palavra de Sabedoria;
2) Palavra de Ciência;
3) Fé;
4) Dons de cura;
5) Operação de maravilhas;
6) Profecia;
7) Discernir espíritos;
8) Variedade de línguas;
9) Interpretação de línguas.
Há ainda outras duas listas formuladas pelo apóstolo que são:
- Em Romanos 12:6-8:
- Em Romanos 12:6-8:
1) Profecia;
2) Ministério;
3) Ensino;
4) Exortação;
5) Repartir;
6) Presidir;
7) Misericórdia.
- Em Efésios 4:11:
1) Apóstolos;
2) Profetas;
3) Evangelistas;
4) Pastores
5) Doutores
Nestas
listas, temos dons miraculosos ou extraordinários e dons que não são
miraculosos ou ordinários. Elas têm o objetivo de mostrar que a lista de
1Coríntios não é a definitiva mas ilustrativa, sendo, ao meu ver, uma
relação necessária e especifica para que os coríntios compreendessem
que Deus age de muitas formas, e de que apenas uma forma, como eles
supunham, não trazia a compreensão necessária acerca de como Deus se
manifestava.
Portanto, entendamos o que sejam esses dons, mais detidamente, a partir da próxima aula.
Notas: 1- Aula realizada na EBD do Tabernáculo Batista Bíblico
2 - Para entender mais sobre o assunto, ouça e baixe o áudio em Aula 74 - Dons III.MP3
domingo, 2 de fevereiro de 2014
quarta-feira, 25 de dezembro de 2013
sábado, 21 de dezembro de 2013
Estudo sobre a Confissão de Fé Batista de 1689 - Aula 56 - Dons apostólicos: "Batismo de fogo?"
Por Jorge Fernandes Isah
Entendido quem eram os apóstolos, qual a sua missão, e o período em que agiram, conforme exposto na aula anterior, retomemos a questão dos dons apostólicos ou dons do Espírito Santo. Mas antes, quero fazer uma ressalva. Os pentecostais e carismáticos em geral afirmam que há dois batismos: um para a salvação e outro pelo Espírito Santo, como um "batismo extra" ou superior. É difícil entender que algo tão fundamental na fé cristã como a salvação, e pela qual Cristo encarnou tornando-se o Verbo Divino, não seja catalogado como algo proveniente do Espírito Santo. Ainda que não digam diretamente que a salvação não depende do Espírito, parece que o Consolador realiza uma obra menor ao salvar e uma obra grandiosa ao conceder certos dons a certos salvos. Mas dentro do escopo de toda a Escritura, o que é mais importante? Ou o que ela mais quis evidenciar? De certa forma estabeleceu-se uma espécie de restrição a uma parcela de crentes que, relegados a um plano inferior não são acalentados com dons especiais. É uma subcategoria de crentes, somenos graduados, que ainda não experimentaram o máximo de Deus.
Contudo,
não é o que Paulo diz: "Porque, assim como o corpo é um, e tem muitos
membros, e todos os membros, sendo muitos, são um só corpo, assim é
Cristo também. Pois todos nós fomos batizados em um Espírito, formando
um corpo, quer judeus, quer gregos, quer servos, quer livres, e todos
temos bebido de um Espírito" [1Co 12:12-13]. Ora, o que o apóstolo está
relatando é que todos nós, como membros do Corpo de Cristo, fomos
batizados e temos bebido de um só Espírito. Isso acontece no momento em
que, reconhecendo a nossa condição pecaminosa e afrontadora a Deus,
considerando-nos seu inimigo e merecedores do castigo eterno, recebemos a
Cristo como Senhor e Salvador de nossas vidas, arrependendo-nos dos
pecados cometidos, reconciliando-nos com Ele. É claro que nada disso é
possível sem a ação direta do Espírito Santo, o qual nos convence,
regenera e transforma a fim de sermos feitos filhos adotivos do Pai por
intermédio da obra redentiva e conciliadora do Filho. Logo, se o crente
já tem o Espírito, para que precisa buscá-lo novamente através de uma
"segunda bênção"?
Porém,
Paulo novamente diz que "há um só corpo e um só Espírito, como também
fostes chamados em uma só esperança da vossa vocação; um só Senhor, uma
só fé, um só batismo; um só Deus e Pai de todos, o qual é sobre todos, e
por todos e em todos vós" [Ef 4.4-6]. É possível alguma dúvida? Ou
claramente nos é revelado que há um batismo somente, e que o mesmo Deus
age em todos nós na mesma intensidade e proporção? Com isso não estou a
dizer que produziremos todos a mesma obra, da mesma maneira, mas também
não se pode dizer que tal obra ou dom é superior porque Deus está mais
evidente em um crente e não tão evidente em outro, ou está mais presente
em um e nem tanto em outro. Deus não pode, em sua essência, estar menos
ou mais em qualquer lugar, porque ele é uno, indiviso, completo, e ser
mais ou menos presente é simplesmente impossível para ele. Ou ele está
ou não está. Não há meio termo ou como fracioná-lo, pois não está
sujeito a variações nem é a soma de partes. E se somos templo do
Espírito Santo, o qual habita em todo o eleito [1Co 6.19]. como esperar
que haja um novo batismo pelo mesmo Espírito?
Ainda
que se diga que a falta de um segundo batismo não representa
necessariamente a ausência do Consolador, é muito estranho supor que
seja preciso uma segunda ação divina onde a primeira não foi suficiente
para produzir os dons contingentes à segunda, ou seja, que todos
deveriam receber em comum, na primeira.
Os
proponentes do segundo batismo apegam-se a uma interpretação equivocada
de Mateus 3.11, no qual João o Batista diz: "E eu, em verdade, vos
batizo com água, para o arrependimento, mas aquele que vem após mim é
mais poderoso do que eu; cujas alparcas não sou digno de levar; ele vos
batizará com o Espírito Santo, e com fogo". Segundo o que muitos
apreendem, Cristo batizará os seus com o Espírito, mas também com o
fogo. O problema é o que vem a ser esse "fogo"? A confusão começa quando
tentam relacionar esse trecho com Atos 1.5, onde Cristo diz: "Porque,
na verdade, João batizou com água, mas vós sereis batizados com o
Espírito Santo, não muito depois destes dias", associando o fato de, no
Pentecostes, serem "vistas por eles línguas repartidas, como que de
fogo, as quais pousaram sobre cada um deles" [At 2.3]. Uma interpretação
simplista pode levar a esse equívoco, porque eles se esquecem de citar o
complemento da fala de João o Batista: "Em sua mão [de Cristo] tem a
pá, e limpará a sua eira, e recolherá no celeiro o seu trigo, e queimará
a palha com fogo que nunca se apagará" [Mt 3.12]. O que lhes parece?
João está a falar de um segundo batismo ou de juízo? Não estaria João
comparando a obra de Cristo com a de um plantador de trigo?
Uma
análise, mesmo superficial, da fala de João mostra-nos que a inserção
de um "batismo de fogo" é algo completamente estranho ao texto.
Primeiramente, ele está batizando no rio Jordão, onde iam ter com ele
Jerusalém e toda a Judeia; e os batizados confessavam os seus pecados.
Em seguida, ele viu que muitos fariseus e saduceus vinham ao seu
batismo, o que lhe inflamou a dizer: "Raça de víboras, quem vos ensinou a
fugir da ira futura?" [Mt 3.7]. E o que seria a ira futura? Não estaria
falando do inferno, reservado para satanás, seus anjos e os réprobos,
"onde o seu bicho não morre, e o fogo nunca se apaga" [Mc 9..4]? Em
seguida, ele diz que o machado está posto à raiz, e que toda a árvores
que não produz frutos será cortada e lançada no fogo do inferno. A mesma
imagem encontra-se presente na parábola do joio e do trigo, proposta
pelo Senhor, na qual ele tem a missão de separá-los, colhendo o
primeiro, atando-o em molhos e queimando-o [novamente temos o fogo como
símbolo de juízo], para, em seguida, ajuntar o trigo no seu celeiro [Mt
13.24-31].
João
está a dizer aos fariseus e saduceus que ele é aquele cuja missão
destina-se a apontar não para si mesmo mas para Cristo. Diante da
pergunta dos judeus: "Quem és tu?" [Jo 1.19], ele confessou que não era o
Cristo, mas a voz do que clama no deserto. Inquirido novamente do
porquê batizava então, já que não era o Cristo, nem Elias, nem o
profeta, respondeu: "Eu batizo com água; mas no meio de vós está um a
quem vós não conheceis. Este é aquele que vem após mim, que é antes de
mim, do qual eu não sou digno de desatar a correia da alparca" [Jo
1.26-27].
Com
isso, qualquer inferência de que o "fogo" ao qual João evoca é uma
segunda forma de batismo, se torna estranha a toda a sua declaração. Ele
está, primeiramente, revelando aos fariseus a pessoa de Cristo e seu
ministério, e, em segundo lugar, alertando-os da ira futura que
sobreviria a eles, através do fogo, numa alusão evidente do juízo ao
qual eles estariam sujeitos, quando presumiam-se de si mesmos que eram
filhos de Abraão. O sentido de "filhos de Abraão" é essencialmente
espiritual, como o pai a quem Deus prometeu uma descendência, o próprio
Cristo, através do qual a sua família seria mais numerosa do que as
estrelas do céu e os grãos de areia na praia [Gn 22.17-18].
Cristo
é revelado por João como aquele que separará os bodes das ovelhas, o
joio do trigo, a árvore que dá frutos das que não dão. Qualquer
tentativa de fugir deste ensinamento é forçar o texto a dizer o que não
diz, e que João, divinamente inspirado, não disse.
Notas: 1) Aula realizada na EBD do Tabernáculo Batista Bíblico
2) Baixe o áudio desta aula em Aula 73 - Dons II.MP3
quinta-feira, 12 de dezembro de 2013
sexta-feira, 6 de dezembro de 2013
Estudo da C.F.B. 1689 - Aula 55 - Dons apostólicos: Há apóstolos, hoje?
Por Jorge Fernandes Isah
Desde o início do século passado, com as manifestações carismáticas surgidas na Rua Azuza, em Los Angeles, em 1906, pelas mãos do ministro negro, William Joseph Seymour, que o Cristianismo, em nome de um "reavivamento", tem ensaiado uma série de experiências que remontam aos primórdios da Igreja Primitiva, mais especificamente o período apostólico, no séc. I. Mas, esses dons teriam realmente voltado? Ou eles estariam circunscritos a um momento histórico específico, e o que temos, hoje em dia, nada tem a ver com o Espírito Santo, pois houve um hiato de quase dois mil anos entre aquele e este período? Seriam as formas atuais as mesmas das realizadas antigamente? E estariam em conformidade com os relatos bíblicos e aplicados convenientemente como relatam os registros sagrados?
Desde o início do século passado, com as manifestações carismáticas surgidas na Rua Azuza, em Los Angeles, em 1906, pelas mãos do ministro negro, William Joseph Seymour, que o Cristianismo, em nome de um "reavivamento", tem ensaiado uma série de experiências que remontam aos primórdios da Igreja Primitiva, mais especificamente o período apostólico, no séc. I. Mas, esses dons teriam realmente voltado? Ou eles estariam circunscritos a um momento histórico específico, e o que temos, hoje em dia, nada tem a ver com o Espírito Santo, pois houve um hiato de quase dois mil anos entre aquele e este período? Seriam as formas atuais as mesmas das realizadas antigamente? E estariam em conformidade com os relatos bíblicos e aplicados convenientemente como relatam os registros sagrados?
Primeiramente,
devemos definir o que vem a ser dons apostólicos, mas antes disso, quem
são os apóstolos e qual era a sua missão. A palavra apóstolo significa
enviado ou mensageiro, aquele que anuncia algo ou alguém, e, no Novo
Testamento, a missão deles era a de anunciar Cristo e o seu Evangelho;
e, para isso, teriam de ser comissionados pelo próprio Senhor, chamados
por ele para exercerem essa missão, não sendo possível que alguém se
autointitule ou denomine-se a si mesmo com tal, sem sê-lo. Não há, na
Escritura, um só apóstolo que não tenha recebido o seu mandato
diretamente do Senhor, como nos revela o evangelista: "E, quando já era
dia, chamou a si os seus discípulos, e escolheu doze deles, a quem
também deu o nome de apóstolos" [Lc 6.13], e que não tenha convivido com
ele e testemunhado a sua ressurreição ]At 1.21-22].
Alguém
pode dizer que os apóstolos tinham o poder de nomear outros apóstolos e
que esses poderiam nomear outros e mais outros, continuamente, numa
espécie de apostolado sucessório, aos moldes do que a Igreja Católica
reivindica para o papado. Contudo, não se tem, na Bíblia, qualquer
referência a essa ordem sucessória, e os que hoje tentam reclamar para
si mesmos algum apostolado nada mais fazem do que repetir o erro
romanista, ao qual dizem oporem-se mas acabam por defendê-lo e inseri-lo
em suas práticas não-bíblicas.
Alguém
ainda pode insistir que Matias, o apóstolo nomeado a substituir Judas
Iscariotes, não foi diretamente nomeado por Cristo. Mas, espere um
momento, para quem propõe a ação do Espírito Santo em eventos no mínimo
discutíveis como os levantados pelo movimento carismático atual, pois
estão muito aquém ou além do texto bíblico, por que não reconhecer a
ação do Espírito de Deus na escolha do novo apóstolo? Houve oração e
clamor para que ele, que conhece todos os corações, mostrasse qual,
dentre José e Matias, seria o escolhido, "para que tome parte neste
ministério e apostolado... E, lançando-lhes sorte, caiu a sorte sobre
Matias" [At 1.23-26]. Alegar que coisas estranhas à Palavra são
supostamente manifestações do Consolador [o qual é o Espírito de Cristo]
e de que ele não interviria em algo tão vital para a expansão do
Evangelho, parece-me um contra-senso.
Ainda
alguém pode alertar para o fato de Paulo não ter convivido com Jesus, e
ainda assim, foi feito apóstolo. Realmente, ele não foi testemunha
direta do ministério terreno do Senhor [ainda que tenha sido
indiretamente], mas, de uma forma especial e exclusiva, foi chamado pelo
próprio Cristo, sendo testemunha ocular da sua ressurreição. É o que
ele nos diz: "Paulo, apóstolo (não da parte dos homens, nem por homem
algum, mas por Jesus Cristo, e por Deus Pai, que o ressuscitou dentre os
mortos)" [Gl 1.1], e, ainda, ao falar das aparições de Cristo: "E por
derradeiro de todos me apareceu também a mim, como a um abortivo. Porque
eu sou o menor dos apóstolos, que não sou digno de ser chamado
apóstolo, pois que persegui a igreja de Deus" [1Co 15.8-9], e, mais uma
vez: " Porque aquele que operou eficazmente em Pedro para o apostolado
da circuncisão, esse operou também em mim com eficácia para com os
gentios" [Gl 2.8]. Ora, temos que Paulo se colocou em posição de
igualdade no ministério apostólico de Pedro, apenas com a distinção
quanto aos seus ouvintes, o alvo da sua pregação.
Logo,
não se pode falar em apóstolos modernos, pois nenhum dos que assim se
intitulam preenchem as características necessárias: o chamado direto de
Jesus, sobretudo, como testemunhas irrefutáveis da sua ressurreição.
O
Segundo ponto a ser analisado é sobre a sua missão. Lembre-se de que à
época, os apóstolos estavam num período de transição entre a antiga e a
nova aliança, e de que a igreja estava sendo formada. Eles, como
emissários de Cristo, confirmariam indubitavelmente a verdade de que
muitos sabiam, ainda que vagamente, acerca de Jesus, sua missão, morte e
ressurreição, como um fato indiscutível e impreterível, levando-a tanto
a judeus como a gentios. Toda a obra apostólica se baseava nesse
fundamento, de que Cristo não somente era o Messias mas o Filho de Deus.
O aspecto final dessa missão foi que os apóstolos, inspirados pelo
Espírito Santo, escreveram e legaram à igreja, em todos os tempos, a
santa e bendita palavra de Deus. Nem uma só linha do Novo Testamento foi
redigida por alguém que não fosse apóstolo ou estivesse diretamente
ligado a um deles, no caso, eram seus discípulos que, orientados pelas
fontes primárias e sob a supervisão do Espírito, relataram os fatos
relacionados à pessoa de Jesus e seu ministério.
Com
isso, chega-se facilmente à conclusão de que não há mais revelações
divinamente inspiradas a serem transmitidas à Igreja, visto que o Cânon
encontra-se concluído, não necessitando a nenhum crente nenhuma outra
orientação que não esteja contida na Escritura Sagrada; o que nos leva a
reconhecer que o ministério apostólico transcorreu em um determinado
momento da história, e de que a missão daqueles homens chegou
definitivamente ao fim, sem que houvesse sucessores ou novos
mensageiros. Até, porque, a Igreja está edificada "sobre o fundamento
dos apóstolos e dos profetas, de que Jesus Cristo é a principal pedra de
esquina; no qual todo o edifício, bem ajustado, cresce para templo
santo no Senhor; no qual também vós juntamente sois edificados para
morada de Deus no Espírito" [Ef 2.20-22], e, se uma casa não pode ter
mais do que uma fundação, onde nelas são construídas paredes, colunas,
vigas, telhado, piso, etc, como seria possível outro fundamento além
daquele onde são dispostos o princípio da fé, de que Cristo é a pedra de
esquina? Além de desnecessário é absurdo, e representaria a "invenção"
de outra fé, de um outro "cristianismo", o que muitos têm se
especializado e empenhado em produzir.
Outra
conclusão facilmente alcançável é: a igreja, quando se afasta desse
entendimento, ainda que seja minimamente, se torna alvo acessível para a
investida dos falsos-mestres e profetas e seus absurdos doutrinários.
Invariavelmente acabam por apostatar a fé, negando a verdade e
penetrando a mentira, instalando-se nela como uma genuína aberração
religiosa, agindo ímpia, incrédula e dolosamente na admissão e difusão
de ideias contrárias e excludentes à fé uma vez dada aos santos. Se no
AT havia o ministério em que os profetas de Deus expunham publicamente a
falácia e malignidade dos falsos-profetas, hoje, cabe-nos, como Igreja,
denunciá-los e expô-los como charlatões e falseadores da verdade. O
princípio para isso é um só, orientarmo-nos e deixar-nos guiar pela
Escritura, através da qual o Espírito Santo nos falará e conduzirá em
toda a verdade.
[Continua na próxima aula]
Nota: 1- Aula realizada na EBD do Tabernáculo Batista Bíblico
2 - A foto desta postagem é um "Autorretrato como o apóstolo Paulo" [Rembrandt, 1661].
Estudo sobre a Confissão de Fé Batista de 1689 - Aula 54: Paulo e a assistência eclesiástica - Dízimos e ofertas III
Por Jorge Fernandes Isah
Notas: 1) Aula realizada na EBD do Tabernáculo Batista Bíblico
2) Baixe esta aula em Aula 65. Dízimo III.MP3
sexta-feira, 29 de novembro de 2013
Estudo sobre a Confissão de Fé Batista de 1689 - Aula 53: Dízimo e ofertas - parte 2
Por Jorge Fernandes Isah
O argumento mais usado para não se dar o dízimo e ofertas é de que há pastores e igrejas que nada fazem para a obra de Deus, mas antes usam o dinheiro para o seu próprio benefício, muitos deles nitidamente carnais, ligados a tantos outros pecados como a ostentação, a vaidade, orgulho, soberba e megalomania. Isto é um fato, mas o que ele representa na totalidade da igreja? E, por haver homens corruptos e apóstatas, a palavra de Deus é anulada? E a sua vontade também? Claro que não. O problema é que muitas igrejas negligenciam a fiscalização de como os recursos são empregados, deixando-os por conta de uns poucos. Sabemos que há bodes na igreja, e deixar as galinhas aos cuidados dos lobos é insano e estúpido. A não participação de muitos membros nas decisões eclesiásticas, a sua recusa em participar até mesmo das reuniões deliberativas, a omissão e o descaso para com a obra de Deus, faz com que alguns poucos se sintam "livres" para agirem conforme os seus corações corruptos e infiéis. Mas isso, em nada, anula a ordem divina, nem faz daquele que dizima fielmente um tolo. O problema está em onde se dizima e qual a doutrina do dízimo é defendida. A maioria das igrejas, infelizmente, utilizam-no como instrumento de ganância, fraude e sucesso pessoal, aplicando uma doutrina espúria e antibíblica a um princípio que é nitidamente revelado na Escritura. Tem-se de estar atento, pois se os nossos recursos são desviados para fins que não sejam santos, também somos cúmplices dos criminosos.
Outro ponto escuso, e que deve ser repreendido, é o de muitos ter o
dízimo como uma espécie de barganha com Deus, no sentido de que se faz um “negócio”
com o Senhor; ao dar-se, espera-se receber, o que fere vergonhosamente o
princípio de que damos o dízimo porque Deus nos deu primeiro, e não porque nos
retribuirá por darmos. A fé bíblica, e não a fé casuística, é o motivo
pelo qual devotamos o dízimo, como uma oferta de agradecimento ao Senhor por
tudo quanto nos deu, tem dado e dará. Qualquer conceito que se apresente fora
disso não passará de heresia e blasfêmia e apostasia.
Alguns textos para meditar
- II Co 9.1-13: "E digo isto: Que o que semeia pouco, pouco também
ceifará; e o que semeia em abundância, em abundância ceifará. Cada um contribua
segundo propôs no seu coração; não com tristeza, ou por necessidade; porque
Deus ama ao que dá com alegria".
- I Coríntios 16.1-2: "Ora, quanto à coleta que se faz para os
santos, fazei vós também o mesmo que ordenei às Igrejas da Galácia. No primeiro
dia da semana, cada um de vós ponha de parte o que puder ajuntar, conforme a sua
prosperidade, para que não se façam as coletas quando eu chegar".
- Mt 23:23: "Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas! pois que
dizimais a hortelã, o endro e o cominho, e desprezais o mais importante da lei,
o juízo, a misericórdia e a fé; deveis, porém, fazer estas coisas, e não omitir
aquelas".
Algumas Perguntas
- Podemos dizer que aquele que não dizima e oferta está em rebeldia
contra Deus?
- Por que não devo dizimar?
- A minha preferência pelas ofertas, antes de obediência aos princípios
bíblicos, não seria uma forma de “despistar” e contribuir com menos do que
deveria dar?
- O dízimo não é um sinal de fé? Pois a Bíblia diz que sem fé é
impossível agradar a Deus?
- Por que penso que a minha oferta, sem fé, agradaria ao Senhor?
- E como aplicar o princípio de que a oferta deve ser segundo a
prosperidade de cada um?
- Ou seja, no dízimo temos um percentual fixo, 10%, e no caso das
ofertas, se tenho sido abençoado com muito, não devo dar proporcionalmente?
Muito além dos 10%?
- Não estaria aí a distinção e os motivos pelos quais o NT refere-se às
ofertas e não aos dízimos, já que este era claramente definido e não precisaria
de novas definições?
Notas: 1- Aula realizada na EBD do Tabernáculo Batista Bíblico
2- Para mais explicações, ouça o áudio da aula em Aula 64. Dizimo II.MP3
Estudo sobre a Confissão de Fé Batista de 1689 - Aula 52: Dízimos e ofertas
Por Jorge Fernandes Isah
Sabemos que a vida cristã é, sobretudo, uma vida na qual devotamo-nos a servir, servir a Deus, à igreja, ao irmão, e ao próximo. O servir está ligado diretamente à humilhação e sujeição do crente, tanto a Deus, como à igreja, como ao irmão e ao próximo. Muitos pensam que o servir está limitado a algumas questões, mas quase sempre não incluímos em seu rol o auxílio ou ajuda financeira. O ponto em que estudaremos agora parece-me estar diretamente ligado ao conceito cristão de servir, humilhar-se e sujeitar-se: o dizimar e o ofertar, o tem toda a relação com submissão e, não somente a Deus, mas ao próximo também. Porém, antes de entrarmos nessa questão, vamos caminhar um pouco, do ponto de vista bíblico e histórico, sobre a questão do dízimo.
1) Primeiramente, o que é o Dízimo? E, o porquê do Dízimo?
Bem, a palavra dízimo, originária do hebraico "asar", deriva da palavra "dez" e também significa "ser rico". O princípio básico do dízimo está em se reconhecer que Deus é o Senhor de todas as coisas, inclusive dos nossos bens, sejam quais forem as posses, das quais somos mordomos, guardiões e beneficiários diretos. De forma que, ao dizimar, testemunhamos em reconhecimento, honra e louvor a Deus, a quem tudo pertence.Era destinado ao sustento dos sacerdotes e levitas que tinham uma função religiosa, mas também social [cuidavam da educação e eram responsáveis pela distribuição do bens aos necessitados].
2) Onde aparece, pela primeira vez, a prática do Dízimo?
Em
Gn 14.20 cf Hb 7.4-10: Abrãao dá a Melquisedeque, sacerdote do Senhor, o
dízimo de todos os bens conquistados em Quedolaomer.
[Penso
que uma das coisas que desagradou a Deus foi o fato da oferta de Caim não ter
sido proporcional aos 10%, no que Abel fez corretamente. Mas isso é uma
inferência, apenas uma especulação, mas que bem pode ser verdadeira].
“Ouvindo,
pois, Abrão que o seu irmão estava preso, armou os seus criados, nascidos em
sua casa, trezentos e dezoito, e os perseguiu até Dã. E dividiu-se contra eles
de noite, ele e os seus criados, e os feriu, e os perseguiu até Hobá, que fica
à esquerda de Damasco. E tornou a trazer todos os seus bens, e tornou a trazer
também a Ló, seu irmão, e os seus bens, e também as mulheres, e o povo. E o rei
de Sodoma saiu-lhe ao encontro (depois que voltou de ferir a Quedorlaomer e aos
reis que estavam com ele) até ao Vale de Savé, que é o vale do rei. E
Melquisedeque, rei de Salém, trouxe pão e vinho; e era este sacerdote do Deus
Altíssimo. E abençoou-o, e disse: Bendito seja Abrão pelo Deus Altíssimo, o
Possuidor dos céus e da terra; E bendito seja o Deus Altíssimo, que entregou os
teus inimigos nas tuas mãos. E Abrão deu-lhe o dízimo de tudo” [Gn 14:14-20].
Abraão
deu o dízimo ao sacerdote em agradecimento a este ou a Deus? Em honra deste ou
de Deus? Claro que Melquisedeque era merecedor de honra, mas, primeiramente,
Abraão o fez como agradecimento e reconhecimento por Deus ter-lhe dado vitória
sobre os seus inimigos e resgatado a Ló e seus bens.
3) O dízimo não era somente dos frutos da terra? Se era, por que temos de dar dinheiro em espécie?
Em
Deuteronômio 14:22-29, Deus estabelece a forma de como será recolhido o dízimo:
“Certamente
darás os dízimos de todo o fruto da tua semente, que cada ano se recolher do
campo. E, perante o SENHOR teu Deus, no lugar que escolher para ali fazer
habitar o seu nome, comerás os dízimos do teu grão, do teu mosto e do teu
azeite, e os primogênitos das tuas vacas e das tuas ovelhas; para que aprendas
a temer ao SENHOR teu Deus todos os dias. E quando o caminho te for tão
comprido que os não possas levar, por estar longe de ti o lugar que escolher o
SENHOR teu Deus para ali pôr o seu nome, quando o SENHOR teu Deus te tiver
abençoado; Então vende-os, e ata o dinheiro na tua mão, e vai ao lugar que
escolher o SENHOR teu Deus; E aquele dinheiro darás por tudo o que deseja a tua
alma, por vacas, e por ovelhas, e por vinho, e por bebida forte, e por tudo o
que te pedir a tua alma; come-o ali perante o SENHOR teu Deus, e alegra-te, tu
e a tua casa; Porém não desampararás o levita que está dentro das tuas portas;
pois não tem parte nem herança contigo. Ao fim de três anos tirarás todos os
dízimos da tua colheita no mesmo ano, e os recolherás dentro das tuas
portas; Então virá o levita (pois nem parte nem herança tem contigo), e o
estrangeiro, e o órfão, e a viúva, que estão dentro das tuas portas, e comerão,
e fartar-se-ão; para que o SENHOR teu Deus te abençoe em toda a obra que as
tuas mãos fizerem”.
Um
dos argumentos mais usuais, atualmente, de que o dízimo foi prescrito para a
igreja, é afirmar que ele era recolhido apenas na forma de grãos, carne, leite
e outros frutos da terra. Acima, temos que a prática de vender o que se havia
produzido e entregá-lo ao lugar escolhido por Deus [um local distante que
impossibilitasse o transporte de gado e dos frutos da terra, p. ex.] na forma
de dinheiro, foi estabelecido na própria palavra. Então, a bobagem de que você
deve dar o dízimo na forma de frutos ou gado não é verdade. Pois, qual de nós
vive da terra? Qual de nós planta e vive apenas daquilo que se planta? Ou
cria-se gado e subsiste-se apenas dessa fonte? Ninguém! Por que? Não vivemos em
uma sociedade rural, como os judeus viviam no período veterotestamentário. A
sociedade israelense era basicamente rural. Mesmo nas cidades, havia a prática
de se trocar um produto pelo outro: trigo por carne, azeite por roupas, etc.
Quase tudo era produzido artesanalmente e, por isso os produtos eram a moeda
corrente da época. No contexto geral, se tirava a décima parte de tudo e
entregava-a, anualmente, no Templo.
Hoje,
como a maior parte dos produtos são industrializados e produzidos em larga
escala, o dinheiro é a melhor forma utilizada para se vender ou adquirir algo;
o sistema de trocas não é funcional, por vários motivos [a distância, por
exemplo]. Vivemos em uma sociedade cosmopolita, e todos nós trabalhamos e
recebemos em dinheiro, por isso, aventar a hipótese de que teremos de pegar
esse dinheiro, ir a um supermercado ou armazém, comprar abóboras, trigo e
toucinho para levar à igreja, é simplesmente estúpida. Agora, se alguém vive
exclusivamente da terra, sem negociar, comprar ou vender, se ela produz tudo o
que precisa para viver, roupas, alimento, etc, produzindo para si própria, sem
utilizar-se do comércio para manter suas necessidades, ela pode pegar parte do
que ela produz e entregar como forma de dízimo. Acontece que ninguém vive
assim; nós não produzimos o calçado que usamos, nem as roupas que vestimos, nem
mesmo o arroz e a carne que comemos, tudo o que dispomos para a nossa
subsistência, para suprir as necessidades, e, até mesmo para o nosso conforto,
origina-se do dinheiro que ganhamos e desembolsamos para custear esse
dispêndio. A própria obrigatoriedade de se pagar os impostos [sem os quais o
ruralista perderá a sua terra e os seus bens] implica na necessidade de
comercialização, venda de produtos e o recebimento respectivo do seu valor em
espécie.
A
Escritura, então, encarrega-se, em sua sabedoria, de destruir esse falso argumento,
malignamente colocado como prática bíblica.
4) O verso mais famoso sobre o dízimo é Ml 3.8-11. Mas ele fala apenas do dízimo?
“Roubará
o homem a Deus? Todavia vós me roubais, e dizeis: Em que te roubamos? Nos
dízimos e nas ofertas. Com maldição sois amaldiçoados, porque a mim me roubais,
sim, toda esta nação. Trazei todos os dízimos à casa do tesouro, para que haja
mantimento na minha casa, e depois fazei prova de mim nisto, diz o SENHOR dos
Exércitos, se eu não vos abrir as janelas do céu, e não derramar sobre vós uma
bênção tal até que não haja lugar suficiente para a recolherdes. E por causa de
vós repreenderei o devorador, e ele não destruirá os frutos da vossa terra; e a
vossa vide no campo não será estéril, diz o SENHOR dos Exércitos”.
Não!
Fala também de ofertas. Ou seja, fala que o servo de Deus deve dizimar e
ofertar. Não é uma questão de escolha entre um e outro; ou uma questão
terminológica, de que um substitui o outro como sinônimos ou aplicados em épocas
diferentes, sendo pactos diferentes, dispensações diferentes ou alianças
diferentes, mas uma questão de reconhecer a ambas. A Bíblia trata das duas
formas, onde elas não se excluem. As ofertas não são um conceito
neotestamentário, mas verotestamentário. Elas não surgiram como substitutas do
dízimo na nova aliança, implicando na extinção daquele, mas ambos caminham lado
a lado, dentro daquele padrão de sujeição, louvor e glória a Deus por tudo o
que ele é, mas também nos dá.
5) A ideia da extinção do dízimo não remete a uma descontinuidade entre o AT e o NT?
Não
há descontinuidade do AT e NT [a Bíblia é um livro só, não dá para dizer que a
Igreja deve seguir apenas o NT, pois o que está revelado no AT apenas se faz
mais claro no NT. Se dizemos que apenas o NT é a revelação, desprezamos o
próprio Deus que se revelou primeiramente no AT. Para mim, a melhor forma de
interpretação, se um princípio válido no AT prevalece no NT, é a sua expressa
anulação ou renúncia; caso contrário, o princípio subsiste e não foi revogado.
Então,
penso que o dízimo, ao não ser abolido expressamente no NT, é atual. Por
exemplo, a circuncisão estabelecida por Deus em Gn 17.23-27 [logo, antes da Lei
Mosaica] é combatida veementemente por Paulo em várias passagens, em suas
epístolas. Temos então uma grande diferença, pois, enquanto a circuncisão é
combatida e mesmo proibida, como algo ineficiente, já que Deus fez de judeus e
gentios um só povo [e o próprio Paulo diz que judeu não é todo o que é de
Israel, os circuncidado na carne, mas os da descendência de Isaque, os
circuncidados no coração - Rm 9.6-7].
Como
não
há nenhum versículo no NT que expressamente abrogue o dízimo, e este me
parece o melhor método para interpretar as Escrituras, de que aquilo
que não foi
explicitamente anulado no texto continua prevalecendo, ele conserva-se
intacto
como revelação e prática para toda a igreja.
6) Por que Jesus, Paulo e os demais apóstolos não falaram ou confirmaram o princípio do dízimo e sim das ofertas?
Penso
que o princípio do dízimo não oferecia problemas de entendimento para a igreja.
Ele era claramente delineado em sua forma e essência, além de ser de
conhecimento geral. Já as ofertas não são claramente especificadas no AT.
Talvez, por isso, especialmente Paulo se preocupou em dar contornos objetivos ao
ato de ofertar, e não se deteve nos dízimos que eram praticados de maneira
corrente e sem dubiedade.
Veja
bem, não temos aqui uma nova regra, que impõe à igreja a oferta e exclui o
dízimo. A questão é muito mais de foco, de ajustar e colocar em seu devido
lugar aquilo que não está claro e pode ser incluído entre as “sombras” que se
dissipam diante da luz. O ensino à igreja é de que as ofertas são tão
importantes quanto ao dízimo. Mas alguém, dirá: “isso é colocar um fardo ainda
maior sobre os nossos ombros!”. Bem, o Senhor nos diz que não nos será dado carregar
o que não podemos suportar. E se entendemos que o dízimo e ofertas é um fardo,
não o fazemos segundo o princípio estabelecido por Paulo, de tê-lo como medida
do amor e de nossa prosperidade.
No
Sermão do Monte, o Senhor Jesus eleva a um nível ainda mais superior os
princípios estabelecidos na Lei, de forma que a nossa incapacidade de cumpri-la
se torna mais patente e evidente. Então, não basta matar, mas até mesmo o odiar
é pecado. Não basta adulterar, mas cobiçar na mente a mulher alheia é pecado. Parece
que a Escritura também estabelece um nível superior ao cristão? No sentido de
dizimar e ofertar? Não. Creio que a prática de ofertas era negligenciado entre
os judeus, e o que temos é a sua afirmação, assim como descrito no AT, como
prática para todos os santos em todos os tempos.
Se
atentarmos
para toda a Escritura e não apenas em algumas de suas partes,
veremos que a exigência da igreja se torna ainda maior do que aquela
aplicada à
nação de Israel. Somos chamados, após a doutrina da oferta ser explicada
em
seus pormenores, a não somente dizimar, mas a também ofertar, como prova
do amor
e da gratidão que devemos a Deus. Muitos se especializaram em distorcer o
ensino bíblico e afirmar que a nova aliança ou o pacto da graça [e não
vou
entrar no mérito da questão, mas deixar claro que não há um pacto de
obras,
pois a salvação é somente pela graça de Deus, através da obra salvadora e
redentora do Senhor Jesus, tanto no AT, desde Adão, como no NT, e até
hoje] aboliu qualquer exigência em relação ao dízimo, e muitos chegam ao
extremo de dizer que nem mesmo as ofertas fazem parte do novo acordo
pactual. Chega-se mesmo a dizer que a obra de Deus deve ser custeada com
o suor de uns poucos, no sentido de que devem se conformar em trabalhar
sem qualquer expectativa de retorno financeiro, fazendo-o por abnegação
e sacrifício, inclusive, se necessário, com a privação de refeições e
um teto para morar. Afinal, Cristo disse que não tinha onde inclinar a
cabeça, e qualquer um que se "aventure" ao trabalho pastoral ou
missionário deve se convencer de que também está no mesmo nível.
Acontece que essa é uma inverdade, pois como vimos no estudo sobre o
sustento pastoral, há uma advertência direta para que a igreja sustente
aqueles que laboram na palavra e no evangelismo. O mais interessante é
perceber que os defensores desse argumento demoníaco não se dispõem a
doar, nem a abrir mão do seu conforto e se integrar ao rol daqueles que
devem viver apenas da fé, na esperança de que o Senhor mande cair do céu
o maná e as codornizes que os alimentarão. Na verdade, eles defendem um
discurso que nada tem de bíblico, e de prático, pois não se dispuseram a
experimentá-lo a fim de que ficasse comprovada a sua eficácia.
Não podemos nos esquecer também de que, na igreja primitiva, vendia-se tudo e depositava o total do valor aos pés dos apóstolos; e de que todos tinham tudo em comum [At 2.42-47; 3.32-37].
Não podemos nos esquecer também de que, na igreja primitiva, vendia-se tudo e depositava o total do valor aos pés dos apóstolos; e de que todos tinham tudo em comum [At 2.42-47; 3.32-37].
E
é aqui, neste exato ponto, que voltarei à introdução sobre este assunto. Não
seria essa atitude, a dos primeiros cristãos, um caso de sujeição, de se humilhar,
preferindo-se ao outro ao invés de si mesmo? Para que serviram aquelas ofertas,
que representavam o todo do que os nossos irmãos tinham? Para
o sustento dos necessitados. Para o sustento da igreja. Para que os apóstolos e
discípulos pudessem espalhar a mensagem do Evangelho, o "ide!" ordenado pelo Senhor. Isso não é sujeição, em
amor? Isso não é preferir o outro ao invés de si mesmo? E, também, confiar na
providência divina? O que você pensa a respeito? O que tem a dizer sobre o
assunto?
Lembremo-nos
daquela senhora que, no templo, deu tudo o que tinha, duas moedas. Ela
simplesmente não tirou duas moedas de muitas, mas colocou ali todo o seu
sustento. Enquanto os outros deram do que lhes sobravam [mesmo sendo muito
dinheiro], ela abriu mão de tudo o que tinha [Mc 12:41-44].
E
de Zaqueu, que deu metade dos seus bens aos pobres [Lc 19:1-10].
Pense nisto...
Notas: 1- Pontos não abordados no texto são discutidos na aula, e, outros aqui expostos são melhor explicados.
Pense nisto...
Notas: 1- Pontos não abordados no texto são discutidos na aula, e, outros aqui expostos são melhor explicados.
2- Aula realizada na EBD do Tabernáculo Batista Bíblico
3- Baixe o áudio desta aula em Aula 63 Dizimo.MP3
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