Página de doutrina Batista Calvinista. Cremos na inspiração divina, na inerrância e infalibilidade das Escrituras Sagradas; e de que Deus se manifestou em plenitude no seu Filho Amado Jesus Cristo, nosso Senhor e Salvador, o qual é a Segunda Pessoa da Triunidade Santa

sábado, 17 de março de 2012

Estudo sobre a Confissão de Fé Batista de 1689 - Aula 19: A infinidade de Deus





Por Jorge Fernandes Isah
 



INTRODUÇÃO



Quando se diz: Deus é infinito, está-se a afirmar o quê, especificamente?

A primeira ideia que se tem é a de que ele não tem fim, de que não há limites nele. Mas também se quer dizer que ele é absoluto, eterno, perfeito, onipresente, e, assim sendo, é impossível que a razão humana o alcance. Em outras palavras, está-se a dizer que Deus é a negação da finitude, de que não está sujeito a qualquer limitação, de que nem o universo, a relação espaço-tempo, ou qualquer outro elemento possa limitá-lo. Deus não pode ser apreendido nem contido por nada ou ninguém, de forma que este atributo indica a ausência completa e total de restrições, obstáculos e defeitos no ser divino. No que ele é, e não pode não-ser, encontramos a plenitude em todos os seus atributos, e assim, a infinidade é o qualificador de todos os demais. Temos então que o seu poder é infinito, a sua bondade é infinita, o amor, a sabedoria, a misericórdia, e todos os demais atributos são infinitos. Foi a partir do ser infinito e do seu poder infinito, da sua vontade infinita, que Deus criou o finito, como contraste ao que ele é, mas também como prova da sua infinita misericórdia e bondade de se dar conhecer, como realidade no sentido mais elevado, mais concreto, em que o real é o Deus vivo se definindo como tal, em todos os seus aspectos infinitos, sendo essencialmente infinito [Jó 11.7-10; Sl 145.3; Mt 5.48]

Como já disse anteriormente, há uma ligação intrínseca entre os atributos divinos, uma unidade perfeita e santa, os quais somente podem ser analisados separada e isoladamente por causa da nossa limitação e incapacidade de entendê-los por completo. Fato é que Deus nos deu a revelar parte dos seus atributos, vistos serem eles infinitos assim como o seu ser é. Se fosse de outra forma, seria impossível qualquer conhecimento divino pelo homem, dado sermos inaptos em nossa capacidade naturalmente limitada para alcançá-lo; as perfeições de Deus estão além de qualquer grau alcançável pelo homem. Pois ao contrário dele, somos prisioneiros do espaço e do tempo, o que, por si só, já nos faz “quebrar a cabeça” para tentar entender algo que está muito além da nossa compreensão. A eternidade é um enigma para o homem exatamente por não escaparmos da ideia de passado, presente, futuro e lugar. A vida está condicionada aos fluxos temporais e espaciais, dos quais não temos como fugir.

E creio que, por isso a idolatria é uma abominação a Deus. Como pode o homem conceber possível adorar uma imagem ou mesmo um conceito ou ideia que sempre será finito e limitado ao espaço e tempo? Todos os deuses, sem exceção, estão limitados por essa contingência espaço-temporal, ainda que habite apenas a mente. Na história, não se vê um deus que se compare ao Deus bíblico, e, talvez, por isso, todos eles sejam o reflexo da limitação humana. Os deuses gregos e romanos assumiam características físicas e emocionais do homem, tanto em suas eventuais virtudes como em seus constantes defeitos. E essa é uma grande diferença que há entre eles e o Deus vivo e verdadeiro, no qual não se encontra qualquer mancha ou defeito. Em Cristo, o Verbo feito homem, a sua perfeição é evidente mesmo assumindo a forma corporal humana, visto não ter pecado nem foi achado nele dolo algum.

Por que Deus é Deus, ninguém pode adorar outro deus sem aborrecer ao verdadeiro e único Deus. O qual ordenou para que não tivéssemos outros deuses diante dele, porque ele é o Senhor nosso Deus, e Deus zeloso [Ex 20.2, 5].

Estudaremos agora as duas maneiras pela qual a infinidade de Deus pode ser entendida; quanto ao tempo, a eternidade, e quanto ao espaço, a imensidão.


ETERNIDADE

Este é um termo que tem trazido muita dor de cabeça para teólogos e filósofos, dada a dificuldade e mesmo impossibilidade que se tem de entendê-la, algo que está fora da nossa realidade, e que somente é possível em Deus, o qual é eterno.

Então dizer que a eternidade é a expressão da infinidade divina quanto ao tempo parece-me deixar claro como é difícil, mesmo para homens altamente capacitados intelectualmente, defini-la. Já que para o eterno não há tempo, e mesmo o tempo não foi criado em uma determinada “fração” da eternidade, como algo que existisse a partir de um determinado momento, dizer que ele está no passado somente terá correlação consigo mesmo, e aqueles que estão contidos nele, as criaturas, jamais com Deus. Mas compreendo que esta foi a maneira sábia que Deus se utilizou para, uma aplicação da sua misericórdia para com os homens, desse-nos algum entendimento do que ele é.

Por isso a Bíblia diz que Deus subsiste de séculos em séculos, de geração em geração [Sl 90.1-2, 102.12], utilizando-se da linguagem humana e simples para que qualquer homem possa entendê-la. A transitoriedade humana contrapõe-se à duração infinita de Deus, de que ele sempre existiu e existirá para todo o sempre, sem jamais deixar de sê-lo, sendo o que é. Ao contrário de nós, que somos afetados pelo tempo [envelhecimento e morte], significando a finitude e temporalidade da nossa vida, Deus não tem princípio nem fim, como já foi dito, por isso, qualquer ideia do que seja a eternidade divina, não passará de sombras, pelas quais poderemos apreender algo, mas jamais exaustivamente. Ainda que a nossa alma seja imortal, e a imortalidade não significa ser eterna, tivemos um começo, o qual se deu pela vontade infinita de Deus nos criar à sua imagem e semelhança. Mas o “Imago Dei” é parcial, nunca total, nem pode sê-lo, pois se fosse, seríamos como Deus, e isso é impossível; contudo, poderemos experimentar uma outra forma de eternidade, no sentido de que, daqui para a frente, estaremos indefinidamente com Deus, para sempre, na eternidade.

Este é outro conceito de eternidade, e no qual a Bíblia também nos ensina, de que os eleitos estarão sempre em comunhão com Deus; de que permanentemente, ainda que o tempo transcorra sequencialmente, nunca terá fim o nosso relacionamento com o eterno. A forma utilizada “vida eterna” traduz de maneira inteligível o que nos aguardará após a morte física: não haverá cessação do nosso viver para Deus e por ele. Contudo, sem saber como se dará isso, penso que não transcenderemos o tempo, de que não estaremos fora dele, ainda que ele tenha domínio sobre nós, e não sintamos os seus efeitos [envelhecimento, por exemplo]. Maravilhosamente, Deus anulará os efeitos do tempo sobre o seu povo [e mesmo sobre os réprobos, os quais sofrerão o justo castigo divino no Inferno, tanto anjos como homens caídos]. Mas é uma cogitação. Talvez o tempo seja realmente suprimido, e entremos num viver infinito como o de Deus, mas aí entraremos nas limitações que o próprio corpo físico impõe, a de que não podemos ser infinitos, e se não podemos, não há como falar em eternidade para nós. Haverá um tempo infindável, que não se extinguirá e que durará para sempre; o que, para nós, é muito mais do que poderíamos esperar, caso Deus não se compadecesse.

O fato é que Deus nunca foi, nem nunca será, pois ele é. Para ele, não há passado, presente ou futuro, o que dificulta ainda mais a nossa compreensão, pois nossa mente está presa ao conceito temporal, e de que tudo é temporal. Para nós, as coisas acontecem em sucessão, limitadas pelo tempo e espaço, ao começo e fim, pois nada na criação pode ser compreendido como eterno. Entender que Deus transcende o tempo, de que está fora do tempo, mas de maneira absurdamente proposicional ele age no tempo [imanência], sendo o Senhor da história, é um grande conforto. Não somente o criou, mas o governa soberana e diligentemente, sem que nada possa escapar à sua ordem. Quando o apóstolo diz que um dia para Deus são mil anos, e mil anos são como um dia [2 Pe.3.8], ele está nos chamando a compreender a sua eternidade, e a sua transcendência quanto ao tempo, sem que se possa confundi-lo com a criação. Ele é distinto da criação, pois é a própria eternidade, ainda que toda a criação subsista pelo seu favor e poder. Ao determinar todos os fatos, Deus não se inclui neles, mas ordena-os conforme a sua sabedoria, perfeição e poder. Creio ser prudente entender que o agir de Deus na história não o torna em componente da história, como um elemento criado por ele mesmo, algo do tipo uma imagem, um personagem de si mesmo. O fato de Deus não poder ser compreendido plenamente não o diminui em nada, nem pode torná-lo em um simples personagem, pelo contrário, revela-nos exatamente a sua grandiosidade e majestade, de forma que o adoremos, glorifiquemos e o reverenciemos como Deus.

E aqui entra um ponto importante, o qual não devemos esquecer, de que a eternidade de Deus nos remete à eternidade das suas promessas de bênçãos, as quais se cumpriram, cumprem e cumprirão no tempo, e das quais somos os alvos, significando que, mesmo vivendo uma vida de tribulação e lutas, somos confortados pela certeza de que naquele dia todas as nossas lágrimas serão enxugadas, “e não haverá mais morte, nem pranto, nem clamor, nem dor; porque já as primeiras coisas são passadas” [Ap 21.4]. Com isso entendemos que as provações não duram para sempre, que são circunstanciais e momentâneas, e de que encontramos sempre, no Senhor, aquele que tem “sido o nosso refúgio, de geração em geração” [Sl 90.1]. A eternidade de Deus nos tornará mais confiantes nele, e também nos fará mais humildes diante dele; pois a própria condição temporal do homem já seria suficiente para que toda a arrogância e soberba e orgulho caíssem por terra. Comparar-nos a ele é o grau máximo de loucura que um homem pode alcançar; e esse homem perdeu completamente a noção da realidade, da verdade. Como Tiago alertou: “Digo-vos que não sabeis o que acontecerá amanhã. Porque, que é a vossa vida? É um vapor que aparece por um pouco, e depois se desvanece” [Tg 4.14]. E enquanto não somos nada, em reputados por nada, Deus é Deus, de eternidade a eternidade.


IMENSIDÃO E ONIPRESENÇA

Imensidão e onipresença são termos quase sinônimos, contudo, guardam uma diferença que tentarei explicar. Elas se relacionam com a infinidade divina em relação ao espaço.

O termo “imensidão” nos dá a ideia de uma extensão desmedida, de um espaço imenso, ou uma grandeza ilimitada. Porém, a própria ideia de espaço é restritiva, não se adequando ao atributo divino, pois Deus transcende toda a ideia de limitações espaciais [imensidão], sem que ele esteja ausente de um só ponto do espaço com todo o seu ser [onipresença]. Muitas vezes pensamos em uma parte de Deus aqui, outra acolá, nos dando a falsa ideia de que Deus está “espalhado” por todo universo, o que não é verdade.

Podemos, como exemplo, imaginar um homem deitado em uma cama. O homem é formado por partes, cabeça, tronco e membros, e a cama também, cabeceira, “pés”, estrado, colchão, etc. O homem está em contato direto com o colchão, de forma que as demais partes não se encontram em contato com ele, ainda que o seu corpo esteja depositado sobre e entre elas. Não há como dizer que o homem está em todas as partes da cama. A cabeça ocupa uma parte do colchão, enquanto o tronco outra, e os pés outra. O homem não toca ao mesmo tempo os pés da cama, o estrado, o colchão, etc. Nem que é possível imaginá-lo fora da cama, quando está deitado nela. Deus, como não tem partes mas é o ser único e indivisível, não poderia estar sobre e entre as partes da cama sem encher as demais. Na verdade, como é uma analogia e a complexidade do ser de Deus é mesmo incompreensível para o homem, podemos dizer que Deus enche toda a cama, tocando ao mesmo tempo nos pés, estrado, colchão, cabeceira, etc, ou seja, não há limites na cama em que Deus não esteja presente.

Com isso, tem-se de tomar cuidado para não se imaginar que Deus seja a cama, que o seu ser faz parte da cama. Deus não é a cama, pois a cama é objeto da criação, mas Deus preenche todos os espaços do objeto de forma que não há limites para ele. Mesmo a madeira mais maciça ou a rocha mais sólida ou o gás mais volátil, Deus os enche. É a afirmação do salmista: “Para onde me irei do teu espírito, ou para onde fugirei da tua face? Se subir ao céu, lá tu estás; se fizer no inferno a minha cama, eis que tu ali estás também. Se tomar as asas da alva, se habitar nas extremidades do mar, até ali a tua mão me guiará e a tua destra me susterá” [Sl 139,7-10].

Note que Davi diz ser impossível fugir de Deus; onde ele estiver, seja no mais alto dos céus ou no mais profundo da terra, ali o Senhor estará. Mas não há confusão ou mistura entre o ser de Deus e os objetos relacionados pelo salmista. Ele os distingue claramente. Também, ele não diz que uma parte de Deus está aqui e outra acolá, mas diz que ele, o todo divino, está em cada um desses lugares, enchendo cada parte dos lugares com a plenitude da sua presença. Portanto, devemos entender que Deus está presente em cada parte do universo, sem, contudo, se misturar com elas. O mesmo acontece conosco, os quais somos templo de Deus. Ele não se divide em partes e cada uma das partes ocupa um corpo/alma dos eleitos. Deus está completamente em cada um de nós, pois Deus é indivisível. Ele nos enche com todo o seu ser, de forma que Deus não está um pouco em mim, outro tanto no irmão, e mais um tanto em uma irmã do outro lado do planeta. Ele está completa e totalmente em cada um de nós, aqui, lá e acolá, em todos os lugares. Assim Deus está em tudo, ao mesmo tempo, com toda a plenitude do seu ser, sem jamais ser cada uma das suas criaturas.

Leiamos o que Salomão diz, e que pode clarificar um pouco mais a questão: “Mas, na verdade, habitaria Deus na terra? Eis que os céus, e até o céu dos céus, não te poderiam conter, quanto menos esta casa que eu tenho edificado” [1Rs 8.27].

Neste trecho, Salomão está a dizer duas coisas:

1) Deus transcende todo o espaço e não está sujeito às suas limitações, de tal forma que nem os céus, nem os céus dos céus podem contê-lo. Isto é a imensidade ou imensidão de Deus [transcendência].

2) Ainda assim o rei construiu uma casa onde Deus habitasse, e enchesse-a com a plenitude do seu ser. Deus preenche todo o espaço com todo o seu ser, relacionando-se com a criação, e isto é a onipresença divina [imanência].

Deus está presente em toda parte sem que esteja parcialmente em cada uma delas. A plenitude da sua presença enche cada parte do espaço, do universo, sem que ele seja cada uma delas ou o todo.

Outro trecho bíblico que confirma a assertiva de Salomão quanto à infinidade divina está em Jeremias 23.23-24, afirmado também por Paulo em Atos 17-27-28, entre outras passagens.


CONCLUSÃO

Diferentemente das criaturas, que ocupam um espaço limitado onde estão, sendo o seu espaço a medida do seu tamanho e outro corpo não poderá ocupá-lo ao mesmo tempo [a terra ocupa um lugar delimitado no espaço sideral, e outro planeta não poderá ocupá-lo simultaneamente], e dos espíritos finitos, anjos ou demônios, que operam em lugares específicos, mas não estão em toda parte, Deus está presente em todo o lugar, o seu ser enche todo o espaço, sem que ele o limite. De forma que ele está presente em todas as coisas, e em cada uma delas em particular, sem que ele possa ser confundido ou misturado a elas. É claro que Deus se manifestará de maneira diferente em cada uma. Ele não se manifesta do mesmo modo na natureza, no ímpio e no crente. Como Stephen Charnock diz: "Ele enche o inferno com a sua severidade, os céus com a sua glória, e o seu povo com a sua graça" [2].

A infinidade divina deve nos trazer temor e reverência. Especialmente por sabermos que estamos diante do Deus imenso e onipresente, que a tudo vê; cada passo e decisão tomada por seus filhos, entristecendo-se com os nossos pecados e alegrando-se quando resistimos e nos tornamos mais semelhantes ao seu Filho Amado, Jesus Cristo. Sejamos conscientes de que, diante dele, devemos buscar e ansiar uma vida santa, odiar e repudiar uma vida pecaminosa.


Notas: [1] - A metáfora que se faz da eternidade como um “eterno presente” não é apropriada, pois remete o eterno ao tempo, quando sabemos ser o presente uma parte do tempo. Apenas Deus é eterno, e a eternidade é Deus. Nada mais pode ser comparado ou relacionado com o fato real desse atributo divino. Logo, qualquer comparação com o tempo visa nos levar a entender algo que, para nós, é inexprimível e mesmo ininteligível em sua complexidade e esplendor
[2] The Existence and the Attributes of God, vol 1, pg 367. Citado por Heber Carlos de Campos em "O Ser de Deus e os seus atributos", pg. 216, Editora Cultura Cristã;
[3] Aula realizada na E.B.D. em 12.02.2012;
[4] Fotos que ilustrem os atributos divinos são impossíveis, mas a partir do que é imperfeito, mutável, finito e temporal, pode-se reconhecer a singularidade, perfeição e grandiosidade do ser divino. Pois, cada um dos seus atributos nos faz conhecer a realidade, que somente é possível a partir do Absoluto, e sem ele, qualquer conjecturação não passa de fuga da verdade. 
[5] Baixe esta aula em aula 19.mp3

quinta-feira, 15 de março de 2012

Avaliação e análise do Estudo da C.F.B de 1689





Por Jorge Fernandes Isah


Hoje teremos uma aula diferente. Darei uma parada no estudo da Confissão de Fé Batista de 1689, ainda que o assunto seja ela, de certa forma. Decidi solicitar, aos queridos irmãos, uma avaliação do rumo em que as aulas estão se realizando, de forma que eu pudesse ter uma impressão do que deve ser mantido e do que pode ser modificado. O objetivo é, na verdade, ter umfeedback dos que participam da E.B.D, para que o estudo da C.F.B. possa ser aprimorado. Como sou “marinheiro de primeira viagem”, e nunca lecionei antes, acho importante a contribuição dos irmãos além da assistência, como observadores. Mas, por que? Insegurança e dúvidas quanto ao conteúdo apresentado? Ou quanto ao método de exposição? Bem, um pouco disso tudo também, mas principalmente porque vejo como prioritário não apenas o acúmulo de conhecimentos e informações mas, a partir dele, a aplicação prática, no dia-a-dia, daquilo que aprendemos e foi-nos ensinado. Com isso não estou apelando para o pragmatismo, em que os resultados ditarão o ensino; mas uma reflexão sobre a validade do ensino, no sentido de nos fazer cristãos melhores e nos ajudar com a tarefa de testemunhar o Evangelho de Cristo às pessoas com as quais nos relacionamos diariamente. 

Fiz um esboço de algumas questões a serem abordadas, mas não o segui “ipsis litteris”, à medida em que dialogava com os irmãos. Eles foram abordados em maior ou menos grau e, penso que, no fim das contas, esta aula serviu para colocar alguns pontos que considerei importante, e os irmãos também colocaram pontos igualmente importantes. 


Assim a aula foi dividida em duas etapas: 

PRIMEIRA: AVALIAÇÃO 

Primeiro, gostaria de saber a opinião dos irmãos em relação ao nosso estudo. O que têm achado? [Aponte os pontos favoráveis e os desfavoráveis]. 

Segundo, em quê o presente estudo tem contribuído para a melhoria da sua vida cristã? 

Terceiro, aponte o que foi que melhorou, caso tenha melhorado. 

Quarto, o estudo deve trazer conhecimento, informação. Mas também uma aplicação prática. Você pode apontar em quais pontos este estudo contribuiu no seu dia-a-dia? 

Quinto, você acredita, realmente que o estudo da Confissão de Fé Batista pode torná-lo(a) em um cristão melhor? Por que? 

SEGUNDA: TEXTO PARA MEDITAÇÃO 

Recebi de um amigo e irmão, que é missionário, o seguinte relato, algo acontecido no seu dia-a-dia, o qual transcreverei abaixo, resguardando os nomes de locais e pessoas, por motivos mais do que óbvios:

“Médico de índio, médico de branco 
- Alô, Luiz? Sou eu...
- Ah, Professor! Que bom que o senhor ligou. Eu não estou bem. De repente, a boca começou a sair sangue e das fezes também. Aí, o médico não deixou eu voltar para aí. 
- Luiz, em qual hospital você está?
- Eu estou aqui no hospital... Eu vou operar...
- Já está marcada a cirurgia?
- Não, o médico disse que as plaquetas estão fracas. Eu não posso operar agora. Tenho que ficar bom. Aí, eles me operam... Eu acho que ainda vou demorar para voltar...
- Luiz, qualquer coisa que você precisar pode pedir...
- Professor, eu preciso mesmo. O meu filho está aí sozinho. Fiquei sabendo que a minha família foi toda embora hoje de manhã para a aldeia, mas o meu filho ficou na casa da cidade sozinho. Ele está com a família do meu sobrinho, mas ele está sem a gente. O senhor pode comprar cem reais de comida e levar para ele? Depois eu pago o senhor.
- Claro, Luiz. Não se preocupe. Descanse e se recupere. Aqui, a gente vai cuidar dele. Eu estou pedindo para Jesus te fortalecer para que você volte logo...
- Ah, Professor, pede sim. 

Desliguei o telefone com o peito apertado. Luiz já ouvira sobre Jesus, mas tínhamos planos de começarmos a compartilhar as histórias bíblicas com ele. Seria uma oportunidade para ele aprender, mas essa parada dele no hospital nos pegou de surpresa. 

O filho do Luiz deve ter uns dez anos de idade... Ele ficou, mas não ficou sozinho. Está com um dos tantos sobrinhos do Luiz. Peguei o carro e fui fazer as compras determinadas pelo Luiz. Já havia suspeitado de que havia algo por trás dessa história toda, mas só confirmei minhas suspeitas quando parei o carro na frente da casa do Luiz e ele veio ao meu encontro: o Feiticeiro. Já escrevi diversas vezes sobre ele... Além disso ele também ficou conhecido aqui na região como o “índio que cura em nome de Jesus, Maria e José”. Ano passado, escrevi uma série de dez histórias sobre ele e sobre o maior perigo que assola o trabalho missionário no confronto com a cosmovisão animista: o perigo real do sincretismo.
- Professor, tudo bem?
- Sim, chegamos tem uma semana.
- Eu estou aqui com a minha família há um mês.
- E o filho do Luiz? Está aí?
- Está.
- É porque o Luiz pediu que eu trouxesse umas compras para ele. 
- O que o Luiz te falou?
- Para fazer umas compras para o filho... Ele vai demorar a voltar.
- Eu sei. Eu estou aqui fazendo pajelança para descobrir quem tem inveja dele e curá-lo desse mal.
- Então, você está fazendo pajelança para ele?
- Sim. E a próxima vez que você falar com ele no telefone, lembre para ele que ele tem uns amigos brancos lá em São Paulo que com certeza vão poder ajudá-lo também, assim como você está ajudando...

Este é o desfecho da história: o Feiticeiro está fazendo pajelança para o Luiz. E, assim como o médico do branco é caro, o médico do índio também é muito, mas muito caro. As compras não eram bem para o filho, mas o Luiz está endividado com o Feiticeiro por causa das pajelanças que ele está fazendo. E o Feiticeiro deve estar cobrando muito caro, porque está pressionando o Luiz a arranjar outros amigos para cobrir a dívida. O próprio fato de o Feiticeiro estar aqui na cidade morando na casa do Luiz já faz parte do pagamento dessa dívida. 

O Pajé e o Feiticeiro cobram um preço muito alto por suas consultas e curas, pois na cultura dos povos daqui nada é de graça: nenhum presente, nenhuma oferta, nenhuma ajuda ou benefício. Seja na relação com os seres espirituais, seja na relação entre os seres humanos, todos estão sempre em dívida uns com os outros. 

Ore para que a Graça de Deus seja revelada a esses povos!” 

Esta história me tocou por vários motivos, e me fez questionar várias coisas, entre elas, a mais importante, é o nosso [meu, quero dizer] envolvimento com a obra de proclamação do Evangelho. Sei que nem todos são chamados para evangelizar, mas a responsabilidade de testemunhar a Cristo é obrigação e dever de todos. Se não sou capacitado por Deus a evangelizar as pessoas [proclamar verbalmente a fé], sou obrigado a ter uma vida cristã na qual as pessoas, mesmo sem ouvir uma única palavra evangelizadora, “vejam” o Evangelho. Muitos negam o que dizem com o seu testemunho pessoal, enquanto outros afirmam o que não disseram com o seu testemunho pessoal. A nossa trajetória neste mundo tem por objetivo nos fazer, cada dia mais, semelhantes ao Filho de Deus, Jesus Cristo. O que refletirá na proclamação do Evangelho, seja por meios verbais, seja por atitudes. O ideal é que ambos os meios sejam igualmente santificados e se assemelhem com aquilo que Cristo disse e fez. 

O certo é que ninguém poderá viver o que diz se não for resgatado e regenerado por Cristo, mas muitos não precisarão dizer o que são, pois suas vidas resultam em louvor e glória para o bom Deus, na medida em que testemunham que Cristo vive nelas assim como vive no que fazem.

Então, pergunto: Em quê esse relato pode se relacionar com o nosso estudo? Ou melhor, com o foco do nosso estudo? 

Com a resposta, cada um dos eleitos, regenerados e salvos pelo sangue do nosso Senhor, derramado na cruz.

Nota: 1-Aula realizada em 05.02.2012, na E.B.D.
2-Tenho recebido "feedbacks" de alguns irmãos sobre as aulas, aqui, através do meu email, e pessoalmente. Se você ainda não o fez, por favor, gostaria da sua opinião. Se não quiser torná-la pública, envie uma mensagem para o meu endereço pessoal: dosty@monergismo.com Ser-lhe-ei grato. Ah... valem tanto elogios como censuras, mas as que trazem algum crescimento e aprimoramento são as que apontam acertos e falhas. 
3-O áudio desta aula pode ser ouvido e baixado em Aula 18.MP3

quinta-feira, 8 de março de 2012

Estudo sobre a Confissão de Fé Batista de 1689 - Aula 17: Os atributos incomunicáveis de Deus



 Por Jorge Fernandes Isah


INTRODUÇÃO

Primeiro, uma correção. Na aula passada eu disse que iríamos estudar quatro atributos incomunicáveis, e enumerei-os: a autoexistência, independência, unidade e imutabilidade. Contudo, eu me equivoquei ao relacionar a independência como um atributo distinto da autoexistência, sendo que os dois representam um mesmo atributo. Em seu lugar, o correto seria eu dizer infinidade ao invés de independência. Assim, a relação correta dos atributos ficaria, corrigido o erro: autoexistência ou independência, unidade, infinitude e imutabilidade.

Então, agora, começaremos o estudo dos atributos incomunicáveis, cujo termo foi definido na aula passada. Contudo quero reafirmar algo que disse anteriormente, ou seja, o de que não entendo os atributos incomunicáveis como não sendo comunicáveis, de alguma forma, ao homem. Com isso, não quero dizer que Deus os comunica aos homens, no sentido de que o homem poderá refleti-los de alguma maneira, reproduzindo-os; não é isso. Porém, se fossem realmente incomunicáveis não seria possível que os compreendêssemos, ainda que limitadamente, e, por eles, Deus nos revelasse algo do seu ser. O próprio fato deles estarem descritos na Bíblia transmite-nos a ideia de que Deus os está comunicando aos homens, em linguagem humana, racional, mas ainda que parcialmente, o seu entendimento pode ser apreendido pelo homem, de forma a revelar a majestade, esplendor e glória divinas, tornando-se possível ao homem compreender o quanto ele é incomparável.

Desta forma, Deus se faz conhecido, e o glorificamos naquilo que conhecemos, sabendo que, por mais bem definidos que sejam esses atributos, teremos a compreensão parcial, fragmentária, insuficiente do seu ser infinito, eterno e perfeito.

Outro ponto que ressaltarei é de que a enumeração ou enunciação dos atributos divinos não os tornam separados do todo, e o nosso entendimento somente poderá ser correto se entendermos que todos os atributos estão intrinsecamente relacionados, de forma que a autoexistência depende completamente e é completadora da infinitude, da eternidade, da independência e da unidade de Deus; pois, sendo perfeito, todos os atributos que compõem a sua essência, natureza e caráter não se manifestam separadamente, nem há proeminência de um sobre o outro [o que, caso acontecesse, implicaria na superioridade de um ou mais atributos sobre os demais, tornando-o um ser partidário e fragmentado], de forma que não poderemos dizer jamais que ele é mais eterno do que infinito ou independente, exatamente porque não há graus de infinitude ou eternidade ou unidade ou independência em Deus, mas de totalidade absoluta em suas virtudes.

A forma como entendemos e compartimentamos as qualidades divinas é que nos fazem imaginar divisões do seu ser, visto ser impossível para nós compreendê-lo em sua totalidade. Por isso a Escritura, utilizando-se da linguagem humana, nos apresenta o Senhor de maneira progressiva, ressaltando ora uma de suas qualidades, ora outra, e ainda outra. Senão, ser-nos-ia impossível a compreensão mínima, ou até mesmo qualquer nível de compreensão do ser divino. Com isso, ficam evidenciados outros de seus atributos: a bondade e a misericórdia de se fazer conhecer, ainda que não completa mas suficientemente, para que percebamos o amor com que cuidou se revelar em um nível muito abaixo de todo o seu ser. Penso que Deus esculpiu maravilhosamente, através das palavras e imagens, a realidade que, por causa do pecado, nos escapou, e nos seria impossível apreender, se ele cuidadosamente não as elaborasse como o artesão máximo, em inúmeros detalhes, tão profundamente reais que nos atordoam em sua absoluta verdade.

Por que Deus fez assim? Por que não nos deu uma mente superior para melhor apreendê-lo? Por que não inibiu em nós os efeitos noéticos do pecado? Por quê? Não sei, nem tenho respostas. Porém posso afirmar que, em sua perfeição, esta não foi uma entre muitas opções, mas a única decisão possível, pois sendo perfeita, não poderia disputar com outras opções, na impossibilidade de Deus cogitar algo imperfeito. Sendo a sua obra a realização da sua vontade, essa vontade é única, sem variantes, e sua obra perfeita, o plano sem defeitos, revelando outro dos seus atributos, a imutabilidade, que como os demais encontram-se em harmonia, não havendo qualquer variação. Com isso não quero dizer que todos os elementos da obra divina sejam perfeitos, pois, caso fossem, seriam uma recriação de si mesmo. A obra é perfeita, e na sua perfeição, mesmo o pecado, os anjos e homens caídos, e o mal, são elementos negativos mas que cumprem no todo a vontade perfeita de Deus.

Também não sei como isso se dá, mas o certo é que todos os aspectos da obra divina cumprem precisamente tudo aquilo que Deus determinou e estabeleceu eternamente, e que, como tal, no tempo, revela-nos distintamente o seu caráter, a sabedoria suprema com que conduz todas as coisas, sem que nenhuma delas escape-lhe ou aconteça à revelia da sua vontade.

Creio que, somente por este ponto, já temos a mostra de como é incompreensível para nós, numa forma geral e absoluta, entender todos os aspectos que envolvem o ser de Deus. Porém temos a obrigação de aceitá-los assim como nos revelou, para que dessa forma o nosso entendimento seja renovado, e experimentemos “qual seja a boa, agradável, e perfeita vontade Deus” [Rm 12.2]. E ele, em nossas mentes e corações, sempre seja verdadeiro.

A AUTOEXISTÊNCIA DE DEUS

Somos seres temporais, que têm início e fim; mas ainda que nossa alma seja imortal, a forma como somos e nos conhecemos hoje, terá um fim, pois assim como nascemos um dia, também morreremos em algum lugar no tempo. Esta ideia está presente em nossas vidas, assim como a de espaço, o que nos torna em seres essencialmente temporais, limitados pelo tempo e espaço. Por isso a dificuldade em entender e muitas vezes aceitar a complexidade do ser divino. Para nós é sempre mais difícil, pois nossos parâmetros encontram-se em oposição ao eterno, pois estamos sempre dispostos a olhar ao que está de contíguo a nós, ao redor, ao alcance das mãos. Com isso, raciocinar sobre a autoexistência divina nos coloca na situação de compreender algo que vai muito além do nosso entendimento e da nossa realidade. O que não quer dizer que Deus seja irreal, mas ele habita numa realidade impossível para nós, e que nos revela a sua singularidade, e a distância que existe entre a perfeição do seu ser e a nossa humanidade imperfeita.

Deus existe em si mesmo, ou seja, ele não necessita nem precisa de nada para existir. Ao contrário do homem que depende de Deus para a sua existência, não somente na criação mas na manutenção da vida, tanto física como espiritual, Deus é independente em seu ser, e independente em tudo o mais. A sua própria perfeição imanente, a de não ter sido causado, é a razão da sua existência. Por ser Deus eterno, não há uma causa para a sua existência, logo Deus não é a causa de si mesmo. Ele é! [alguns dirão não ser uma resposta que explique Deus]. Mas haverá respostas para o ser eterno, perfeito e infinito além da sua eternidade, perfeição e infinitude? Logo Deus não é a origem de si mesmo, posto não ter origem. Deus não é o início de si mesmo, pois não tem princípio. Nem mesmo é o fim de si mesmo, pois não tem fim. Se há causas para a existência de Deus, elas estão ocultas nele, pois a sua vida não vem de fontes externas. De forma que ele permanecerá sempre o mesmo, imutável. Deus é incomparável [Is 40.18] e independente em todas as coisas, seja na sua vontade [Rm 9.19. Ef 1.5], poder [Sl 115.3], conselhos e intentos [Sl 33.11].

Vejam bem que, apenas para definir a autoexistência divina, utilizei de alguns dos seus atributos que se encontram interrelacionados: eternidade e imutabilidade, por exemplo. É impossível se tratar de um atributo e entendê-lo isoladamente como se estivesse à parte do todo, seccionado, e fosse independente dos demais. Deus é unidade, e como tal, nada pode ser separado ou distinguido, como já disse.

Assim a autoexistência de Deus nos remete à perfeição do seu ser, o qual é autossuficiente em si mesmo, sem que nada possa afetar a sua existência. Antes da Criação, Deus estava em plena satisfação e felicidade em si, e assim continua após ter iniciado a sua obra. Ele é a vida, e por ele tudo existe, vive e se move [At 17.28]. Somente ele sabe como é que existe, por que existe, e porque sempre existirá. Esse é um mistério que o homem provavelmente jamais entenderá, dada a sua complexidade, profundidade, a qual a mente humana é insuficiente para abarcá-la. Por mais que imaginemos possibilidades, elas não passarão de possibilidades, de capacidade imaginativa e especulativa, em que a dúvida é a convicção, sem que sejamos impedidos, contudo, de reconhecer, crer e aceitar como a mais verdadeira, evidente e fundamental base da realidade do ser de Deus a sua autoexistência. E ela está mais do que viva nas palavras de Cristo: “Porque, como o Pai tem a vida em si mesmo, assim deu também ao Filho ter a vida em si mesmo” [Jo. 5.26].

Aqui, farei um aparte. Muitos podem entender que Cristo tem vida em si mesmo dada pelo Pai. Mas o que ele está dizendo não é nada disso. O que ele diz é que o Pai tem a vida em si mesmo, e assim como o Pai, o Filho também tem a vida em si mesmo. Seguindo esta afirmação, podemos dizer, acertadamente, que o Espírito Santo também tem a vida em si mesmo. Não é possível que o Pai tenha dado ao Filho a condição de ter vida em si mesmo. Ou o Filho tem a vida em si, ou o Pai é quem lhe deu a vida. As duas proposições são irreconciliáveis, e se autoanulam. Se entendemos que o Pai deu a vida ao Filho, como os unitaristas acreditam, como o Filho poderia ter a vida em si mesmo? Ela não depende dele, mas do Pai. Logo, não há vida no Filho, no sentido de ele tê-la em si, mas apenas como doação do Pai. Da mesma forma que nós temos vida em nós mesmos, sem que, contudo, tenhamos controle sobre ela, pois não depende de nós vivermos ou morrermos. Porém, em relação a Cristo, a Escritura claramente indica que a vida estava nele, assim como ele estava com Deus e era Deus [Jo 1.1- 4].

Alguns poderão dizer que a vida a qual o Senhor se refere é a vida humana, a sua natureza humana, mas como o homem Jesus poderia ter vida em si mesmo? Não poderia. Para tê-la, ele teria de ser eterno, e sabemos que o homem Jesus não é eterno, posto ter nascido, crescido e morrido. Este é apenas um preâmbulo sobre a eternidade do Filho, que será mais bem estudada quando falarmos da Segunda Pessoa da Triunidade.

Outro ponto a ser ventilado é o de que o homem, em sua rebeldia e pecado, imagina-se independente de Deus. Ele crê erroneamente que é um ser autônomo, que sua vida é ditada exclusivamente por sua vontade, e de que Deus nada tem a ver com ela. Essa atitude está ligada ao desejo do homem de ser como Deus. Foi assim no Éden e ainda é hoje. Por isso o homem se considera “livre” de Deus, mas se ele é o Senhor do universo e de todas as coisas, como pode o homem ser livre de Deus? Em Dn 4.35 lemos: “E todos os moradores da terra são reputados em nada, e segundo a sua vontade ele opera com o exército do céu e os moradores da terra; não há quem possa estorvar a sua mão, e lhe diga: Que fazes?”. Nabucodonosor reconhece que Deus pode utilizar os meios que quiser para cumprir os seus propósitos, tantos os anjos no céu, como os homens na terra. Ele faz todas as coisas conforme a sua vontade independente, sem qualquer interferência externa a ele, exatamente porque também o seu poder é independente e opera conforme a sua vontade independente. Ou seja, Deus não precisa de ninguém para elaborar os seus planos eternos, e de nenhuma força que o auxilie na execução desses intentos. Ele pode tudo, e nós nada podemos sem ele [Is 40.28-29].

Tem-se claramente que a independência não é um atributo que Deus compartilha com o homem. Apenas a soberba, a arrogância e o desconhecimento do ser divino podem levar o homem a imaginar-se independente de Deus, como se possível fosse ser como ele é. A autoexistência e independência divinas deveria nos fazer humildes, e buscar incessantemente um relacionamento de sujeição e adoração a ele, que em sua bondade e misericórdia se deu a relacionar com suas criaturas; visto que todas as coisas, até mesmo as mais insignificantes e desapercebidas, procedem dele e são obras das suas mãos; para reconhecermos a sua grandeza e majestade, submetendo-nos ao seu senhorio, com gratidão.

Portanto, Deus existe e sempre existiu em si mesmo, e para sempre o seu nome será o “Eu Sou”. E o ser sempiterno é um dos seus atributos essenciais, pelo qual devemos reverenciá-lo. 

Nota: 1- Aula realizada na E.B.D.  em 29.01.2012;
2- Baixe esta aula em Aula 17.MP3

terça-feira, 6 de março de 2012

Estudo sobre a Confissão de Fé Batista de 1689 - Aula 16: Os Atributos de Deus




Por Jorge Fernandes Isah



INTRODUÇÃO:

Finalmente, depois de muitas promessas, entraremos no que chamamos do estudo sobre os atributos divinos. Já pontuei algo sobre o assunto em outras aulas, e evitarei repetir-me. Contudo, para situarmo-nos quanto ao tema, farei um pequeno resumo do que já foi dito.

Primeiro, o significado da palavra atributo. O dicionário Michaelis diz que a palavra origina-se do latim “attributu” e indica aquilo que é próprio ou peculiar de alguém ou de alguma coisa. No caso específico de Deus, os seus atributos são aquelas características que o revelam como Deus. Algo que somente ele tem ou possuí e que o distingue de tudo o mais, fazendo-o único e incomparável. Podemos dizer que eles são as suas virtudes ou propriedades, de forma que compõem o ser divino; indicando o que lhe é próprio e que somente ele tem. Assim, eles não são algo que nós atribuímos ou damos a ele, mas aquilo que ele tem em si mesmo como essência e que nos de a conhecer, para que soubéssemos.

Segundo, sabemos que não podemos conhecer a Deus completamente, mas somente naquilo em que ele se revelou. Portanto os seus atributos nos revelam aquilo que ele é, não exaustivamente, pois não podemos conhecê-lo exaustivamente, sendo Deus perfeito e absoluto; mas ele nos deu a conhecer no que nos revelou, de forma que são visíveis em suas obras de criação, providência e redenção. Logo os atributos não são algo que se acrescenta a Deus, mas aquilo que ele revelou de si mesmo.



Terceiro, Deus não pode ser precisado com exatidão por ninguém, a não ser por si mesmo, como se autodefiniu: “Eu sou o que Sou”. E também não pode ser conhecido perfeitamente, mas é-nos possível dar uma descrição, uma descrição parcial, baseada naquilo que conhecemos dele, e que pode ser conhecido. Portanto, Deus é incompreensível, mas é cognoscível. 

Quarto, Deus é uma unidade em seu ser, e os seus atributos não são partes na sua composição, porque ele não é composto de partes como nós. Os atributos de Deus são o próprio Deus, são a sua essência, o que o torna Deus. 

Quinto, os atributos nos revelam o caráter divino, revelando-nos quem ele é, como age, e como se relaciona com a criação. Mas nunca à margem da Escritura, a única fonte pela qual são-nos dadas informações corretas e verdadeiras a seu respeito.


CLASSIFICAÇÃO DOS ATRIBUTOS DE DEUS

Até mesmo na classificação dos atributos divinos conhecidos, e por ele revelados, o homem encontra dificuldades. Não há consenso sobre a melhor forma de divisões, e alguns termos são inadequados em si mesmos, revelando as dificuldades inerentes à imperfeição humana, revelando a nossa incapacidade, mesmo naquilo que está diante dos olhos, mas que é incrivelmente maravilhoso, muito acima do que podemos descrever e entender. 

Foram formuladas várias classes na história da igreja, e as principais são:

a) Atributos Naturais e Morais – Há uma aparente distinção entre um e outro, mas, o fato é que todos os atributos são naturais em Deus. Tanto a sua autoexistência, infinitude e perfeição quanto sua misericórdia, bondade e justiça são compõem o seu ser.

b) Atributos Absolutos e Relativos – Segundo Berkhof “Os primeiros pertencem à essência de Deus, considerada em si mesma, ao passo que os últimos pertencem à essência divina, considerada em relação à Sua criação”. Parece que há uma ideia neste conceito de que se possa conhecer a Deus à parte da sua relação com a criação. Embora existindo eternamente em Deus, fazendo parte do seu ser, todas as suas qualidades têm a ver com o mundo que ele criou, em algum aspecto ou modo. Exemplos da primeira categoria: autoexistência, eternidade e imensidão. Da segunda, onipresença e onisciência.

c) Atributos Imanentes [intransitivos] e Emanentes [transitivos] – Os primeiros são aqueles que não operam nem se projetam fora da essência divina [eternidade, p.ex], enquanto os segundos expõem e produzem efeitos externos [justiça, p. ex]. Porém se os atributos fossem estritamente imanentes, o seu conhecimento seria impossível, o que leva a crer que eles são, ao mesmo tempo, imanentes e transitivos.

d) Atributos Comunicáveis e Incomunicáveis – A classificação mais comumente utilizada e aceita é esta. Já falamos dela anteriormente, e a detalharemos mais a partir desta aula. Os incomunicáveis revelam Deus como o ser absoluto, onde não se encontram qualquer analogia no ser humano, portanto, não podem ser-nos comunicados. Os primeiros são aqueles que, de alguma forma, foram-nos transmitidos por Deus, e têm a ver com a sua pessoalidade, com a forma como ele se relaciona com a criação, apontando para o Deus revelado, que se deu a conhecer na Escritura. Contudo, entendo que todos os atributos divinos, a despeito das classificações, são-nos sempre reveladas, e, portanto, possíveis de se conhecer, mesmo as que não participam e não nos foram transmitidas por Deus.

OPINIÃO

Penso que no decorrer da história da Igreja muitos irmãos tentaram e, ainda tentam, descrever satisfatoriamente o ser de Deus. Contudo, esbarramos na nossa imperfeição e incapacidade, diante da majestade, poder, glória e sabedoria do Senhor. Alguns equívocos e erros acabam originando-se dessa empreitada humana, o que é normal; mas creio que o maior de todos os erros, o qual pode comprometer completamente a aproximação [ainda que nos mantenhamos “anos-luz” do ser divino] é buscarmos explicações à parte de Deus. Somente nele encontraremos a verdade. Somente nele encontraremos as respostas às perguntas que sequer formulamos ainda. Nele, há a realidade, o fato, de forma que qualquer tentativa de entendimento à margem da sua revelação nos colocará em uma posição de frustração, muitas vezes, e de tropeços e desvios, na maioria delas. Apenas Deus pode nos mostrar quem ele é, como é, e age no universo. 


O homem, em sua miserável condição, não pode crer-se mais inteligente do que aquele que criou a inteligência humana; nem mais sábio do que o criador da sabedoria humana; ou mais racional do que quem criou a razão humana. Em todos os aspectos, o homem é muito, mas muito [numa proporção abissal], inferior a Deus. Portanto, temos de compreender que há uma limitação natural do homem [penso, determinada e estabelecida pelo próprio Deus] que o incapacita de, até mesmo naquilo em que Deus se fez revelar, chegar ao entendimento exaustivo do Absoluto. 


Mas em momento algum é-nos dado o direito de desanimar ou desfalecer. Antes temos o dever de buscá-lo e entendê-lo, ou falharemos em nossa missão a qual é glorificá-lo e honrá-lo com a nossa mente e vida. Devemos, sobretudo, viver o que dele conhecemos para não sermos acusados de omissão ou desobediência. 

E ainda que a questão dos atributos divinos seja uma discussão em que há elementos contradizentes, o fato é que Deus nos revelou algo de si mesmo, e nos capacitou a entender o que revelou, ainda que a “perfeição limitada” [1] do que se deu a conhecer seja quase intransponível para o homem. Mas mesmo o pouco pode ser muito, se aplicado conforme o Espírito Santo tem nos mostrado e, que, às vezes, insistimos em não seguir, buscando um caminho próprio, pessoal e autônomo, que nos levará cada vez mais a uma distância insegura. A nos afastar perigosamente dele; quando reputamos nos relacionar com Deus, e estamos a relacionarmos solitária e inutilmente conosco mesmo, ou quando muito, com outros de nossos pares. 


ATRIBUTOS INCOMUNICÁVEIS

São os que distinguem Deus, salientando o ser absoluto de Deus, tanto no que ele é como no que ele faz ou em sua forma de agir. Esses aspectos são a sua marca distintiva, tornando-o inigualável, não havendo ninguém como ele; o que o faz o possuidor exclusivo desses atributos e, por isso, eles não podem ser transferidos aos seres humanos, pois, como seres finitos e imperfeitos podem possuir a infinitude e perfeição? Ou seja, em nossas personalidades não há qualquer traço deles e, portanto, eles acabam por nos distinguir de Deus, revelando-o como tal, e revelando a nossa humanidade.

Um ponto que eu gostaria de tocar é de que mesmo Deus sendo absoluto, e, em princípio, podendo fazer qualquer coisa, pois é autossuficiente em si mesmo, independente em si mesmo, e Senhor de si mesmo, estando livre de todas as imperfeições, contudo, não livre para realizar qualquer coisa que vá de encontro à sua natureza. Deus não pode negar a si mesmo, logo, não pode fazer algo que vá contra a sua natureza. Por exemplo, Deus não pode pecar, pois é santo. Nem pode ser finito ou temporal, pois é infinito e eterno. 

Na próxima aula estudaremos quatro atributos incomunicáveis de Deus: a autoexistência, independência, unidade e imutabilidade. 

Até lá!

Notas: [1] Uso a expressão “perfeição limitada” referindo-me à Escritura Sagrada, pois a mesma é perfeita no sentido de não conter erros, incongruências e incoerências, mas limitada diante da vastidão infinita do ser divino.
[2] Aula realizada na E.B.D. em 22.01.2012
[3] Baixe o áudio da aula em Aula 16.MP3

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Estudo sobre a Confissão de Fé Batista de 1689 - Aula 15: Os Nomes de Deus - Parte 2


 







Por Jorge Fernandes Isah

 


OS NOMES DE DEUS NO NOVO-TESTAMENTO

THEÓS
Esta é a palavra grega que designa o nome deus, de uma forma genérica, podendo referir-se ao Deus bíblico como aos deuses pagãos. Ainda podendo se  referir a toda pessoa que detém algum tipo de autoridade. Como o Senhor nos diz em João 10.34, referindo-se ao Salmo 82.6, em que Deus chama a "deuses" os juízes de Israel, aqueles que foram escolhidos para julgar retamente, mas o faziam injustamente, por isso, Deus os repreende.

Esta palavra abrange os designativos de Deus do Antigo Testamento, porém, faz-se necessário uni-la a outras palavras para definir corretamente o sentido que os autores do Novo Testamento quiseram atribuir ao termo, ou seja, ela sempre terá de estar acompanhada de uma outra palavra que a qualifique. Mas ela sempre trará em si as atribuições que os nomes do Antigo Testamento davam a Deus, no sentido em que foram escritas, como Todo-Poderoso, Governador e Redentor.

KYRIOS
Este título é atribuído a Deus no Antigo Testamento e significa "Senhor". É um título que Théos recebe, qualificando-o; de forma que ele se relaciona com os nomes Adon e Yahweh do Antigo Testamento, indicando que Deus é governador, possuidor de todas as coisas, cujo poder é inigualável, mas também é aquele que promete a redenção ao seu povo, o salvador.

Kyrios é o título tanto do Pai como do Filho, como do Espírito Santo. Interessa-me, porém, estudá-lo, especificamente, em relação ao Filho. Em Filipenses 2, lemos que Deus exaltou a Cristo dando-lhe um nome acima de todos os nomes. Ao cumprir fielmente a obra pela qual foi enviado ao mundo, a morte na cruz para remir, e dar a vida eterna àqueles que o Pai lhe deu [Jo 17.2] e que foram predestinados antes da fundação do mundo [Ef 1.4-5]. Ressurreto, Paulo nos diz que diante dele todos os joelhos se dobrarão e todas as línguas proclamarão que Jesus Cristo é o Kyrios. Este é, certamente, o nome que está acima de todos os nomes, apresentando o senhorio universal e inquestionável de Cristo, diante do qual todos estão sujeitos. Com isso, não estou a dizer que Cristo irá reinar, mas que ele já reina, não apenas nos salvos, mas em todas as esferas do universo físico e espiritual.

O mais fantástico é que bastaria apenas a análise deste nome para se ter a certeza de que Cristo tem a mesma essência e natureza divinas que o Pai e o Espírito Santo têm. Diante da afirmação de que Cristo é o Kyrios, nenhum homem poderia reconhecer a falsa doutrina unitarista. Mas como aprouve a Deus destruir a sabedoria dos sábios e aniquilar a inteligência dos inteligentes [1Co 1.19], há muitos grupos religiosos que se autodenominam "cristãos" mas  que não reconhecem que o Filho é "a imagem do Deus invisível", em quem toda a plenitude habita [Cl 1.15,19].

Sendo a Bíblia a palavra de Deus, a verdade proclamada pelo próprio Deus, não há porque não crer no que ela expressa claramente. E o que ela nos diz a respeito de Jesus é que ele é um com o Pai, "o resplendor da sua glória, e a expressa imagem da sua pessoa" [Hb 1.3].

Então, há grupos, entre nós, que acreditam possível crer em Cristo como Redentor mas não crer que ele seja Senhor. Infelizmente eles estão mais preocupados com o que poderá acontecer-lhes no futuro, do que com suas vidas presentes. Há muitos que afirmam não ser necessário nenhum tipo de regeneração, de santificação, pois a salvação é exclusivamente pela graça. Acontece que o sentido de graça por eles defendida é distorcido, implicando na negação de uma série de textos que afirmam ser necessário nascer de novo, ter a mente de Cristo, estar em um constante processo de santificação, a fim de se tornar a imagem e semelhança do nosso Senhor. 

Sem Cristo, como Senhor, é impossível se falar em graça e redenção. Não podemos compartilhá-lo e escolher apenas um dos seus aspectos. Afinal, não somos nós que o escolhemos, mas ele é quem nos escolheu. Portanto, se não o temos como Senhor de nossas vidas, também não o temos como Redentor. Não há como seccioná-lo; Cristo é uno em si e na união com a Trindade. Sem tê-lo não se tem nada. Se não se é servo, também não se é salvo. Quando se tenta anular um único ponto de sua essência e obra, não há graça nem perdão divinos, mas apenas uma fé morta em si mesma, como Tiago inspiradamente definiu [Tg 2.17].

O título Kyrios vem derrubar tanto a tese dos unitaristas como dos adeptos do não-senhorio de Cristo, pois ele reina sobre tudo e todos; pior para quem não reconhece o seu poder, glória, majestade e divindade, pois esses são súditos rebeldes, que não querem servi-lo, os quais estão destinados à condenação e ao fogo eternos. Ao contrário de nós, que fomos feitos servos e reconhecemo-nos como tais, dispostos a honrar e servir ainda que inutilmente ao nosso Senhor.

PATER
Outro título de Deus, e que nos foi dado conhecer por Cristo, é o de Pai. Ainda que Deus seja chamado de Pai da nação de Israel no Antigo Testamento, apenas através de Cristo pudemos nos reconhecer como filhos adotivos, de que temos um Pai. No Salmos 103.13, o salmista usa a analogia do pai que se compadece dos seus filhos para indicar que Deus se compadece dos que o temem. Não há uma alusão direta sobre a nossa paternidade, pois muitas vezes ela nos é transmitida por outros homens, como Abraão, Isaque e Jacó, que são os patriarcas, os quais são chamados de "pai" de muitos, de incontáveis indivíduos, aos quais Deus constituiria o seu povo.

Apenas no Novo Testamento, através do relacionamento do Pai com o Filho, é que tomamos o real conhecimento e entendimento da nossa filiação a Deus; não por nossos méritos ou por nossa vontade, mas pela vontade de Deus que nos constituiu filhos pelo seu poder e graça, por intermédio de Cristo [Jo 1.12-13].

E, maravilhosamente, este foi o desejo do Senhor Jesus que nos ensinou a chamar o Seu Pai de Pai, fazendo-nos também filhos como ele é. No Sermão do Monte somos exortados a orar assim: "Pai nosso...". Bendito o Filho que nos deu o Pai, e bendito o Pai que nos deu o Filho, e assim, formemos uma família baseada na relação eterna que eles têm entre si; e pela qual saímos da escravidão, do jugo do pecado, para sermos feitos filhos por adoção, e podermos clamar: "Aba Pai". Paulo utilizou essa expressão em Gálatas 4.6, juntando o nome grego Páter à palavra aramaica Abba [ambas têm o mesmo sentido de "pai", o que traduzindo seria "pai querido ou papai"] dando a ideia terna de proximidade entre o pai e seus filhos, de que participamos também  das coisas que o Pai reservou para o Seu Filho, Cristo, pelo qual somos herdeiros.

Reconhecer que Deus é Todo-Poderoso, Altíssimo, Soberano, Senhor, Governador, é fundamental, pois eles nos remetem aos atributos de Deus, à forma como ele se fez conhecer através da revelação especial. Mas, reconhecer que somos filhos, quando não há nada em nós que nos possa levar a sê-lo, apenas a graça, misericórdia e amor infinitos e eternos de Deus para com nós,  deve nos encher de uma alegria também infinita e eterna; na certeza de que não há nada que nos possa fazer conhecê-lo mais intimamente do que a sua condição de Pai. De forma que reconheceremos tudo o que ele nos deu, e propiciou-nos ter, pelo amor com que nos amou e que excede todo o entendimento. Sejamos gratos, tendo em nós os mesmos sentimentos de Cristo [Fp 2.5], para que ele esteja em nós, assim como o amor com que é amado pelo Pai também esteja em nós [Jo 17.25-26]. E assim, através do Filho Amado, sejamos um com Deus, o Pai.

Nota: [1] Aula realizada na E.B.D. em 15.01.2012;
[2] Baixe esta aula em Aula 15.MP3;
[3] Por favor, se houver algum erro na inscrição em grego e latim no topo desta postagem, avise-me.

domingo, 5 de fevereiro de 2012

Exposição de Atos 10: Sem tempo para Deus?

Por Pr. Luiz Carlos Tibúrcio

Infelizmente, este arquivo foi gravado em formato WAV, o que impossibilita a postagem do áudio diretamente aqui na página. Como os conversores de arquivos WAV em MP3 não deram o resultado esperado, truncando-e adicionando ruídos e outros sons, optei em colocar o link para o 4Shared, onde você poderá ouvir e baixar esta mensagem.
Portanto, vá à VOICE077.WAV, ouça e, se quiser, baixe o áudio para o seu computador ou dispositivo móvel

Cristo o abençoe!
Jorge

quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Estudo sobre a Confissão de Fé Batista de 1689 - Aula 14: Os Nomes de Deus - Parte 1





















Por Jorge Fernandes Isah


INTRODUÇÃO

Dando sequência ao estudo do Capítulo 2, falarei sobre os nomes de Deus. Ainda adiando a entrada direta, propriamente dita, na questão dos atributos divinos. Acontece que, inicialmente, pensei em não tocar neste assunto, que trata dos nomes de Deus, pois o considerei pouco relevante, fruto da  ignorância e do desejo de apressar o andamento das aulas, tocando apenas naquilo que considerava essencial. Mas estudando-o mais detidamente, convenci-me da sua necessidade e propriedade em nosso estudo da C.F.B, de que era um ponto fundamental e não poderia ser negligenciado; por alguns motivos:

Primeiro, porque a própria palavra de Deus se refere a ele com vários nomes, logo, como poderia rejeitar ou negar a sua importância e fundamento? Se o próprio Deus fez questão de que assim fosse conhecido?

Segundo, vivemos a era de um "Deus" genérico, em que este nome é utilizado de muitas maneiras e intenções, menos a de honrar e glorificar o Deus verdadeiro e vivo. Por isso, desde os primórdios, ele se fez revelar ao mundo de forma particular, para não se misturar a outros deuses nem cultos que nada têm a ver com ele, e que são o reflexo da face idólatra do homem em seu permanente estado de rebeldia. Hoje, o nome "Deus" se tornou um penduricalho que qualquer um pode ostentar ou não, podendo ser nada além de um nome que, supersticiosamente, traga alguma espécie de sorte ou bom fluído, ou mesmo a chave para o pensamento positivo, alguma espécie de triunfalismo pela autoajuda.

Terceiro, os nomes refletem características e particulares de Deus [e mesmo um conjunto de atributos], de forma que eles revelarão e nos ajudarão a compreender um pouco mais do seu caráter e pessoalidade, fugindo da generalização que revela, tão somente, o desconhecimento de Deus; e, desta forma, podermos responder mais consistentemente à pergunta inicial: “Quem é Deus?”.

Quarto, Deus se revela através dos nomes, como aquele que age ativamente na história da humanidade, não um "deus-espectador", imóvel, inoperante, desinteressado; mas o único criador e sustentador de todas as coisas; o ser pessoal, o Senhor e juiz supremo de tudo, de forma que qualquer outra divindade torna-se nula diante dele. Assim, Deus se mostra verdadeiro, e o reconhecemos como o único Deus, em meio a uma miscelânea de falsos deuses.

Os nomes de Deus também nos revelam muito do seu modo de agir e do seu relacionamento com os homens. Não farei um estudo exaustivo em relação a eles, citarei e definirei alguns dos mais comuns, pelos quais Deus foi conhecido, tanto no Antigo como no Novo Testamento, mas me aterei a analisar, especificamente, dois deles.

Outro ponto interessante ao estudar o assunto é que ele nos apresenta Deus como o Ser pessoal, o que tem sido asseverado constantemente em nosso estudo, e também é abordado frequentemente na C.F.B. Além de os nomes serem uma maneira de Deus se autorrevelar aos homens, pois sendo a Escritura a sua própria palavra, nela encontramos designativos de Deus que nos foram dados por ele mesmo.

Assim, temos muitos nomes para Deus, mas todos derivados do seu nome, revelando a multiformidade do seu ser. Usando da linguagem humana para se fazer conhecer aos homens, os nomes de Deus têm origem divina, portanto não são criações humanas.

Vale também ressaltar que Deus não pode ser nominado, definido por um nome, mas são muitos que ele tem, parecendo, até certo ponto, uma questão inexplicável ou até mesmo contraditória. Mas se pensarmos que os nomes pelos quais Deus é conhecido não são invenções humanas mas contêm, de certa forma e em certa medida, atributos que nos revelam o caráter divino, e pelos quais ele se faz revelar, entenderemos que houve uma “concessão” de Deus de se acomodar à limitada e finita capacidade humana de conhecimento. Como tudo que foi criado é limitado e temporal e finito, os nomes de Deus não são abrangentes nem exaustivos, pois não podem sê-lo, visto serem objetivados a suprir demandas do pensamento estrito do homem, o qual está impossibilitado, inclusive pelos efeitos noéticos do pecado, de compreender totalmente o Absoluto.

OS NOMES DE DEUS NO ANTIGO TESTAMENTO

ELOHIM: "O DEUS PODEROSO"
O primeiro nome pelo qual Deus é reconhecido na Escritura é Elohim, que quer dizer “O Deus Poderoso”. Elohim é o plural de “Eloah”, que significa “aquele que é forte”. O fato de estar no plural remete-nos à Trindade Santa, de que Deus é uma unidade na qual há três pessoas com a mesma essência e natureza, igualmente poderosas. Mas este será um assunto do qual falaremos mais à frente, quando estudarmos a doutrina da Trindade. Este nome é usado quando se quer enfatizar a majestade divina, em seu caráter soberano, tanto no que se refere à obra de criação [Gn 1.1; Is 45.18] quanto à de salvar Israel [Is 54.5; Jr 32.27]; e é, também, o nome pelo qual Deus é mais representado no Antigo Testamento, aparecendo mais de 2.200 vezes. Ele deriva de "el", o nome mais simples pelo qual Deus é designado, no sentido de ser primeiro, ser senhor, indicando, mais especificamente, plenitude de poder.

O fato de “El” ser um nome genérico, sendo atribuído também aos falsos deuses, não dá a Deus um sentido "nomina propria" [nome próprio], fez com que ele aparecesse na Escritura combinado com outros nomes para ajudar a distinguir o Deus verdadeiro e vivo dos falsos e mortos deuses das religiões pagãs. Podemos citar, como exemplos:

a) El-Shaddai: “Deus Todo-Poderoso”.
Este foi o nome que Deus usou para se revelar a Abraão, quando do estabelecimento formal do pacto de Deus com o patriarca [Gn 17.1-2]. Em princípio, "Shaddai" designa que Deus tem todo o poder, seja no céu ou na terra, indicando-o como Senhor e Soberano sobre tudo e todos, mas no sentido de ter o poder de proteção divina ao povo do pacto, apontando para o cumprimento fiel de suas promessas, e também como fonte de bem-aventurança e consolação. 
Também foi com este nome que o Senhor se revelou a Moisés, anunciando-lhe as pragas que sobrevieram sobre o Faraó e o Egito.

b) El Elyon: "O Deus Altíssimo"
Ainda que como El-Shaddai, este nome indique o poder e majestade de Deus, ele o descreve como o possuidor de todas as coisas, o Altíssimo, aquele que está elevado acima de toda a criação, reinando absoluto sobre ela; ele é o mais alto e exaltado ser, sendo todos os demais seres sujeitos a ele. A primeira vez em que ela aparece é em Gênesis 14.18-24, quando Abraão resgata o seu sobrinho Ló e recupera os bens tomados pelo inimigo. 

ADONAI: "O DEUS GOVERNADOR"
Este nome significa "Senhor, mestre, possuidor" e, relaciona-se com os anteriores, quanto ao seu significado. Deriva de "dun" ou de "Adon", ambas significando julgar, governar, em posição de autoridade, de senhorio ou domínio. Especialmente ela se aplica a Deus como o Senhor, o Governador Todo-Poderoso, a quem tudo está sujeito e com quem o homem se relaciona como servo. Mas também mostra a superioridade do Deus de Israel sobre os demais deuses; sendo ele o governador último de todas as coisas e a autoridade máxima sobre todos os reinos. Não há ninguém ou nada como ele, nem capaz de desafiá-lo ou enfrentá-lo [Dt 10.17]. Era o nome pelo qual Israel se dirigia a Deus costumeiramente. Com o tempo, perdeu força e prestígio para o nome Jeová [Yahweh]. 

Assim como Deus é absoluto, o seu governo também o é. De forma que todos os demais poderes, naturais ou sobrenaturais estão debaixo de sua autoridade, sendo ele o possuidor legítimo de tudo, sem se excluir nada. 

YAHWEH: "O DEUS REDENTOR"
Gradativamente, na história do povo de Israel, e, à medida em que Deus se revelava ao seu povo, os demais nomes foram sendo abandonados e substituídos por "Yahweh", como o Deus da graça. Este passou a ser o nome pessoal divino, revelando o seu caráter redentor, como o libertador do povo hebreu do cativeiro, por isso foi revelado a Moisés. Sempre foi reconhecido como o nome incomunicável, pelos quais os judeus temiam pronunciá-lo, em razão da leitura equivocada que faziam de Levítico 24.16. Por isso, ao lerem os trechos sagrados onde aparecia, substituíram-no por "Adonai" ou por "Elohim". Ele deriva do verbo "hayah", que significa "ser", indicando a presença e existência constante de Deus, em seu caráter imutável [Ex 3.14]. Revela-nos também que Deus está permanentemente presente na redenção do seu povo, e de que ele cumpre e cumprirá todas as promessas do pacto realizado com os heróis da fé. Sendo o "Eu Sou", eterno, perfeito, santo, e imutável, suas promessas de salvação também são eternas e imutáveis. Também é o nome empregado exclusivamente para Deus, não sendo empregado em relação a mais ninguém, indicando uma relação infalível entre Deus e seu povo, como aquele que o libertará e o redimirá dos seus pecados e transgressões.

Há, ainda, nomes compostos de Yahweh, como, por exemplo, Yahweh Jireh ["O Senhor proverá", Gn 22.14], Yahweh Nissi ["O Senhor é minha bandeira", Ex 17.15], e Yahweh Shalom ["O Senhor é paz", Jz 6.24].

A partir dos massoretas, os quais acrescentaram vogais entre as consoantes, o tetragrama Yhwh, passou-se a grafar da forma como o usamos aqui.

O áudio desta aula está disponível em Aula 14.WAV

Nota: 1- Na próxima aula, concluiremos este estudo sobre os Nomes de Deus a partir do Novo Testamento.
2 - Aula realizada na E.B.D. em 08.01.2012 

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Estudo sobre a Confissão de Fé Batista de 1689 - Aula 13: "Eu Sou o que Sou"













Por Jorge Fernandes Isah

  


Vimos que Deus é autosuficiente em si mesmo, de forma que ele não depende de nada nem ninguém para existir, pois sua independência é absoluta. Também vimos que ele se autointitula o "Eu sou", jamais podendo, portanto, ser o não-ser. E o não-ser é não ser Deus. Ele também se define como o ser essencialmente espiritual, pois é Espírito [Jo 4.24]. Há uma infinidade de atributos de Deus, assim como ele é infinito, mas a Bíblia não nos revela todos, porém, ainda assim, eles nos surpreendem por sua diversidade, plenitude, perfeição, excedendo a nossa compreensão; "porque assim como os céus são mais altos do que a terra, assim são os meus caminhos mais altos do que os vossos caminhos, e os meus pensamentos mais altos do que os vossos pensamentos", diz o Senhor [Is 55.9]. Deus revela que há uma distância enorme entre ele e nós, de que por mais que se manifeste ao homem, este ainda permanecerá distante e impossibilitado de conhecê-lo e entendê-lo completamente [Jó 26.14]. A disparidade entre quem é Deus e quem é o homem, entre o ser infinito e o finito, entre o eterno e o temporal, o perfeito e o imperfeito [com um ingrediente ainda mais danoso ao conhecimento da verdade, o pecado], faz com que os caminhos divinos sejam muitas vezes incompreensíveis para nós.

Porém, isso não quer dizer que Deus não seja cognoscível, de que não se deu a conhecer, de que haja apenas a sua transcendência e não haja a imanescência, de que ele seja incompreensível e não se relacione com sua Criação. Por isso, a CFB diz que a sua "essência por ninguém pode ser compreendida, senão por Ele mesmo", visto sê-lo infinito, eterno, absoluto, perfeito, santo,  somente pode ser conhecido plenamente por alguém que tenha esses atributos, de forma que o homem somente o conhecerá no que ele lhe capacitou e deu-se conhecer. Assim, apenas Deus tem o autoconhecimento de si mesmo; somente ele detém o conhecimento pleno e completo de si, e nada nem ninguém exterior a ele pode compreendê-lo totalmente. A possibilidade de conhecimento pleno de Deus, mesmo na eternidade, quando o salvo será transformado à imagem e semelhança de Cristo, não poderá acontecer; a plenitude do conhecimento divino é tão majestosa, gloriosa, magnificente, que nos esmagaria, como se fôssemos uma formiga sob o peso de um elefante. Creio ser, mais ou menos, o que Paulo diz: "Ó profundidade das riquezas, tanto da sabedoria, como da ciência de Deus! Quão insondáveis são os seus juízos, e quão inescrutáveis os seus caminhos!" [Rm 11.33].

Por isso, ainda assim, o Deus revelado, continuará encoberto como que por uma densa escuridão, fora do alcance do homem, se o Espírito não o mostrar, transformando-o no ser real, verdadeiro e vivo que ele mesmo diz de si. O que nos leva à reconhecer a importância deste capítulo da C.F.B., porque ele diz ser possível conhecer a Deus através dos seus atributos; ao descrevê-los, ela nos revela facetas do seu caráter, ainda que a tentativa de separá-las seja impossível, visto Deus ser uma unidade pessoal, integral, ao contrário de nós, criaturas.
  
Antes, e ainda hoje, o homem procura descrever Deus através de figuras, imagens, pintura, e por formas verbais ou escritas, no que tem falhado miseravelmente. Por mais que se queira defini-lo, Deus é indefinível, a não ser por si mesmo. Quando Moisés perguntou em nome de quem falaria aos egípcios e judeus, o Senhor disse: "Eu Sou o que Sou. Disse mais: Assim dirás aos filhos de Israel: Eu Sou me enviou a vós outros" [Ex 3.14]. A afirmação divina representa uma imensidão impossível de se imaginar. Deus se define como sendo, ele é, sem nunca não-ser, de forma que a definição revela a sua autoconsciência, autossuficiência, o Ser absoluto e imutável.  Porém, para nós, ainda persiste a pergunta: quem é Deus? 

Somente ele pode dizer quem é, pois ele tem o autoconhecimento de si; já que ele conhece todas as coisas, e ninguém pode alcançá-lo nesse conhecimento. O conhecimento de Deus depende de si mesmo, e de mais nada ou ninguém; de nenhuma fonte exterior a ele, porque é eterno. E será através dos seus atributos que se revelará, mostrando-nos a sua personalidade. Por isso, jamais devemos nos esquecer de que Deus é o Deus pessoal, onde habita toda a consciência, inteligência, sabedoria e conhecimento. Ao contrário de nós, Deus não é limitado, e sua personalidade é perfeita, eterna. E é possível perceber a sua Pessoa através da Revelação Natural, como parte dos seus atributos incomunicáveis; porém, somente é possível entender a essência divina a partir da relação paternal que ele tem com o seu Filho eterno, Jesus Cristo; por quem fomos feitos filhos adotivos e, portanto, termos um relacionamento filial com Deus, tornando-nos capazes de conhecê-lo, como ele é, como se revelou, pois sendo Deus, não pode jamais deixar de sê-lo; e não podemos conhecê-lo, mesmo imperfeitamente, sem nos conscientizar da nossa limitação e impossibilidade e incapacidade de fazê-lo plenamente. Pois, assim como os anjos eleitos, gastaremos a eternidade para entender, por exemplo, o amor de Deus por nós. Sendo o amor divino o atributo mais evidente na Escritura, e ainda assim, como Paulo disse, ele excede todo o entendimento [Ef 3.19], o que dirá quanto aos demais? O que dirá quanto ao próprio Deus, o qual é único, e não pode ser distinguido tanto do que é como do que faz, sob pena de se erigir um outro "Deus"? Ainda que ele se apresente de muitas formas diferentes, permanece indissolúvel, indivisível, no seu caráter incomparável e perfeito [Is 40.18,25].

Deus é Deus, e resta-nos humilhar diante dele; glorificá-lo pelo que é, e tem-nos revelado ser; admirá-lo por sua grandeza e majestade; e amá-lo porque ele nos amou primeiro.

Notas: [1] Aula realizada na E.D.B. em 18.12.11
[2] Este áudio pode ser baixado para o seu computador ou dispositivo móvel em Aula 13.MP3

domingo, 1 de janeiro de 2012

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