segunda-feira, 29 de julho de 2013
quarta-feira, 24 de julho de 2013
Estudo sobre a Confissão de Fé Batista de 1689 - Aula 48: Autoridade e Sustento Pastoral - Parte 2
Por Jorge Fernandes Isah
Continuando o nosso estudo sobre a biblicidade da autoridade e do sustento pastoral, primeiramente, façamos um esclarecimento: Não sou pastor, seminarista, nem recebo salário da igreja da qual sou membro.
Segundo, muitos dirão: "Veja quantos pastores profissionais existem, que sugam tudo o que podem dos fiéis, extorquindo-os com falsas promessas de bênçãos enquanto se empanturram de dinheiro, gastando-o da forma mais mundana possível, em bens materiais e suntuosidade". Reconheço, é verdade. Há muitos líderes que "vendem" o Evangelho, tratando-o não menos que um produto rentável. Mas isso representa dizer que todos são mercenários? Que estão buscando o que lhes é próprio ao invés da glória de Deus? Não! E a despeito de todos os falsos mestres (os quais estão sob a ira de Deus), a Bíblia exorta a igreja a suprir as necessidades dos que pregam a palavra.
Terceiro, nossa igreja é pequena e de poucos recursos; auxiliamos o nosso pastor em seu sustento, contudo, ele trabalha secularmente seis dias por semana, 10 horas por dia, para suprir as necessidades de sua família. E percebo que se ele fosse um pastor de tempo integral dedicado à igreja, tanto os membros como os trabalhos evangelísticos seriam fortalecidos.
Quarto, não quero generalizar, mas, normalmente, os que atacam o sustento pastoral são aqueles que se acham dignos de serem crentes, desde que não tenham de sacrificar nenhuma parte dos seus bens. De certa forma, o que move os "mercadores da fé" é o mesmo que os move: a avareza, o amor ao dinheiro.
Quinto, há os que tentam espiritualizar o que não é espiritual. O Evangelho de Cristo é espiritual, porém, proclamado fisicamente pelo pregador, pela impressão de Bíblias (por mãos incrédulas, muitas vezes), em suma: por meios humanos. Tentar provar que a pregação do Evangelho não é trabalho (seja remunerado ou não) é contradizer o próprio tratamento dado à questão por Jesus (Jo 4.38, 5.17), e Paulo (1Co 3.8, 15.58; Cl 1.29; Hb 6.10).
Feito os esclarecimentos, analisemos alguns versículos que tratam do assunto:
1) "Quem jamais milita à sua própria custa? Quem planta a vinha e não come do seu fruto? Ou quem apascenta o gado e não se alimenta do leite do gado?" (1Co 9.7).
O que o apóstolo está dizendo? Aqueles que pregam o Evangelho que vivam do Evangelho (1Co 9.14). Paulo reinvindica o direito de ser sustentado em seu ministério pela igreja. Como afirma: "Ou só eu e Barnabé não temos direito de deixar de trabalhar?" (1Co 9.6). Provavelmente os coríntios acusavam Paulo de "mercadejar" o Evangelho, de procurar o benefício próprio, de pregar o Evangelho por motivos mundanos. Porém, revela-lhes que tanto ele como os demais apóstolos têm o direito de terem o sustento para si e suas famílias, e de que essa responsabilidade cabe à igreja (1Co 9.4-5). Não é o que parece ao afirmar "Esta é minha defesa para com os que me condenam" (1Co 9.3)? E "Digo eu isto segundo os homens?" (1Co 9.8). Ao que arremata: "Ou não diz a lei também o mesmo?" (1Co 9.8).
Paulo prossegue a argumentação protestando que, aquele que lavra e debulha (ou seja, aquele que trabalha), lavra e debulha com esperança de ser participante (1Co 9.10). E continua: "Se nós vos semeamos as coisas espirituais, será muito que de vós recolhamos as carnais?" (1Co 9.11). O apóstolo declara que esperava colher muito menos dos coríntios do que lhes tinha dado, mas ainda assim, esperava obter o necessário para a sua subsistência.
A sequência à qual Paulo expõe o seu pensamento é extremamente lógica, e impossível de não entendê-la, a menos que seja lida com premissas falhas. É o que muitos dirão, justificando-o com o v. 12: "Se outros participam deste poder sobre vós, por que não, e mais justamente, nós? Mas nós não usamos deste direito; antes suportamos tudo, para não pormos impedimento algum ao evangelho de Cristo".
Atentamos que o verso fala de um "direito" que o apóstolo possuía, o qual era o de ser mantido pela igreja. Porém, diante das dúvidas levantadas pelos coríntios, e da própria resistência da igreja em ajudá-lo, ele não "usou" esse direito, para que a descrença dos coríntios não aumentasse, e fosse "impedimento" para a proclamação do Evangelho. Dizer que Paulo censurou os ministros que são sustentados pela igreja é distorcer completamente o sentido daquilo que ele próprio diz.
Resumindo: Paulo não pregava o Evangelho por causa das recompensas, por aquilo que a igreja iria lhe dar; ele pregava o Evangelho por amor a Cristo e aos eleitos (2Tm 2.10), contudo, esperava que, como igreja, os irmãos suprissem as suas necessidades.
2) "Outras igrejas despojei eu para vos servir, recebendo delas salário; e quando estava presente convosco, e tinha necessidade, a ninguém fui pesado" (2Co 11.8).
Qual de nós, vendo o irmão em necessidade, vira-lhe as costas? Foi o que os coríntios fizeram em relação a Paulo. E ele os exorta com tristeza, sabendo que negligenciaram o seu compromisso para consigo; porém com o nítido objetivo de não somente apontar-lhes o erro, mas de levá-los ao arrependimento e correção. Senão, por que tocar no assunto?
Há quem entenda que Paulo está condenando os que recebem salário, como alguém que é "pesado" à igreja, um usurpador (ao contrário, o que ele diz dos coríntios é que suas atitudes eram usurpadoras, eles é que "roubavam" dos macedônios ao receber o Evangelho de graça, sem nenhum sacrifício).
É claro que há casos e casos. Aqueles que se utilizam da posição de liderança no ministério para o enriquecimento, a abastança material, o deleite carnal, o consumismo desenfreado, e o apego sórdido ao dinheiro (seja pastor ou não) comete pecado, e é injusto. Em outras palavras, quem age assim sequer é convertido. Porém, o fato de muitos agirem desta forma (e, infelizmente, parece que o pastoreio se tornou num novo "toque de Midas" o qual transforma tudo o que põe a mão em ouro), não representa que o princípio da subsistência ministerial seja antibíblico.
Novamente, Paulo escreve aos coríntios dando-lhes "um puxão de orelhas", entre outras coisas dizendo que eles deveriam agir e viver como igreja. Havia muita divisão entre eles, muito sectarismo; e para a sua tristeza, especialmente por que plantara a igreja, eles o desprezavam em detrimento aos falsos apóstolos (2Co 11.1215) os quais, certamente, eram os que o caluniavam junto ao povo.
Ele defende-se de que, em nada é menor do que os demais apóstolos e, portanto, tem o mesmo direito que os demais tinham, inclusive o de viajar com sua família, como Pedro fazia (2Co 11.5). Mesmo solteiro, Paulo reivindica esse direito, o de constituir uma família e poder viajar com ela no seu ministério.
Temos de entender que o fato de Paulo pregar de graça aos coríntios, e os coríntios o receberem sem se preocupar com as suas necessidades, é motivo de glória para o apóstolo e de "desglória" para a igreja de Corínto, ainda que isso não os impediu de serem abençoados pela pregação do Evangelho. É o que ele diz: "Pequei, porventura, humilhando-me a mim mesmo, para que vós fôsseis exaltados, porque de graça vos anunciei o evangelho de Deus?" (v. 7).
À frente, no capítulo 12, vem-nos a confirmação: "Pois, em que tendes vós sido inferiores às outras igrejas, a não ser que eu mesmo vos não fui pesado? Perdoai-me este agravo... Eu de muito boa vontade gastarei, e me deixarei gastar pelas vossas almas, ainda que, amando-vos cada vez mais, seja menos amado" (2Co 12.13,15 - grifo meu). Parece-me que Paulo coloca os coríntios em pé de igualdade com as demais igrejas, a não ser pelo fato dele não ter sido "pesado" a ela. Em outras palavras, os coríntios estavam numa posição "inferior", em débito, por não terem com essa beneficência demonstrado "amor" ao apóstolo. É assim que Paulo os retrata: enquanto o seu amor por eles aumentava a ponto dele se sacrificar para pregar-lhes o Evangelho (o que implica em passar necessidades), a igreja de Corinto não se dispunha a auxiliá-lo em seu sustento, como prova de amor.
No fim das contas, o que importa é isso: o amor a Cristo e Seu Evangelho, o que resulta em obediência.
Apêndice: De certa forma, o mesmo sectarismo que Paulo aponta entre os coríntios, vemo-lo hoje. A Igreja está tão dividida, inclusive pelos que pregam unidade, pelos sem "placas" nem "nomes", pelos que se julgam filhos "exclusivos" de Deus, pelos que se consideram "libertos" mas estão presos ao pior farisaísmo existente, e acabam por se esquecer do principal: pregar o Evangelho de Cristo crucificado (1Co 2.2).
Perdemos tempo com "outros" evangelhos, e negligenciamos o que realmente importa. Com isso, não quero jogar para "debaixo do tapete" os problemas da igreja, muito menos pregar o evangelho ecumênico. Longe de mim cometer estes pecados. Mas, se ao invés de gastar o precioso tempo de que dispomos tentando "corrigir" os erros de outras igrejas e denominações, preocupássemos conosco, nossos irmãos e igreja certamente estaríamos "salvando" a nós mesmos e aos nossos queridos... Um minuto! Não confunda uma frase hiperbólica com salvação de verdade, a qual apenas o nosso Senhor Jesus Cristo é capaz de realizar. Quero dizer é que, nos preocupamos em "salvar" os outros (pelo menos nos enganamos com essa idéia), quando na verdade o nosso objetivo é "revelar" o quanto estão errados e desviados do caminho; e assim nós mesmos acabamos nos desviando do caminho, substituindo o amor pelo legalismo, a mera acusação, e a autoexaltação. E, por favor, não confundam essa declaração com a condenação à disciplina bíblica, pois a disciplina é atributo da igreja, do corpo local, e não de irmãos isolados que falam por si só, como se fossem a própria voz de Deus (estes, se forem eleitos, são alvos da disciplina divina).
Deus levantará segundo a Sua santa vontade irmãos que farão o trabalho apologético, defendendo a fé bíblica apontando o erro daqueles que são antievangelho, e mesmo dos cristãos que "deslizaram" em um princípio ou outro. Mas, infelizmente, o que acontece é que, de uma hora para a outra, a maioria se arrogou e arvorou apologista, e saiu "atirando" para todos os lados, como uma metralhadora descontrolada.
Enquanto isso, sorrateiramente, o diabo planta dentro do corpo local suas heresias, mas como nossos olhos estão voltados para os erros alheios (de outras denominações e outros irmãos denominacionais, cuja disciplina não está ao nosso alcance), permitimos que a nossa omissão e desleixo corrompa-nos também.
O pior é que muitos nem sequer participam do corpo local, acreditando num cristianismo solitário e individualista, numa clara rebeldia aos princípios bíblicos que dizem defender. No fundo, se consideram superiores e melhores do que os mandamentos de Cristo; e sentam-se confortavelmente em suas torres de observação, desprezando-a, ridicularizando-a, pois sequer passa-lhes pela cabeça submeter-se à autoridade com que o Senhor investiu-a.
São "livres" para bater à vontade, contudo, esquecem-se de que, caso sejam eleitos, a mão disciplinadora de Deus está sobre eles. Se não forem, não há disciplina, mas a condenção eterna os aguarda.
A melhor forma de se pregar o Evangelho de Cristo é pregando o Evangelho de Cristo, e não combatendo o antievangelho. Qualquer um pode combater (pois nem mesmo argumentos precisa-se ter, apenas vontade, disposição), mas poucos são capacitados a viver o Evangelho, pois para isso é preciso ser convertido por Cristo, regenerado e lavado no Seu sangue.
A melhor forma de se lutar contra a fraude e a heresia é expondo a verdade bíblica. De nada adianta refutar a heresia se não se obedece aos mandamentos do Senhor, e assim fazendo-o, demonstra não amá-lO (Jo 14.15) e, "em vão, porém, me honram, ensinando doutrinas que são mandamentos de homens" (Mc 7.7).
Portanto, é urgente que antes de se entrar numa "caça às bruxas", que se viva o Evangelho, testemunhando a Cristo nosso Senhor. Fim do apêndice.
Finalizando, transcrevo mais uma vez as palavras do apóstolo Paulo: "Os presbíteros que governam bem sejam estimados por dignos de duplicada honra, principalmente os que trabalham na palavra e na doutrina; porque diz a Escritura: Não ligarás a boca ao boi que debulha. E: Digno é o obreiro do seu salário" (1Tm 5.17-18); porque "se alguém também milita, não é coroado se não militar legitimamente. O lavrador que trabalha deve ser o primeiro a gozar dos frutos. Considera o que digo, e o Senhor te dê entendimento em tudo" (2Tm 2.5-7).
Timóteo ouviu.
E, nós?
Nota: 1- Aula realizada na EBD do Tabernáculo Batista Bíblico
2 - Baixe este áudio em Aula 47 A.MP3
Estudo sobre a Confissão de Fé Batista de 1689 - Aula 47: Autoridade Pastoral - Parte 1
Dando sequência ao nosso estudo sobre a igreja, analisaremos o aspecto
da autoridade e sustento pastoral. Neste estudo, já falamos sobre vários
pontos da igreja verdadeira e as marcas que ela detém, inclusive, a sua
autoridade sobre o crente. Apesar desta doutrina ser extensamente
descrita na Escritura, há cristãos que não a reconhecem, e, por isso,
desprezam-na. O que está ligado mais ao individualismo e à
autossuficiência do homem moderno [o qual tolamente se acha "senhor de
tudo" e autoridade final] do que da sua não expressividade canônica.
Vivemos tempos em que os crentes encontram-se tão ou mais rebeldes do
que os mundanos, acreditando em uma liberdade capaz de prescindi-los de
qualquer autoridade, ainda que muitos digam reconhecê-la em Cristo, mas
rejeitam-na completamente ao desconsiderar a autoridade que ele deu à
igreja e aos seus ministros; o que acaba por levantar a seguinte dúvida:
se não reconhecem a autoridade eclesiástica que veem, como reconhecerão
a Cristo que não veem? Eis a questão!
Iniciemos então pelos versos de 1Ts 5.12-13: "E rogamo-vos, irmãos,
que reconheçais os que trabalham entre vós e que presidem sobre vós no
Senhor, e vos admoestam; e que os tenhais em grande estima e amor, por
causa da sua obra. Tende paz entre vós".
A
palavra "presidir" significa “estar à frente”, “governar”,
“superintender”, mostrando uma qualidade de liderança, comando, de
alguém que tem autoridade sobre outro(s), que os direciona, levando-os à
obediência e ao cumprimento de determinadas ordens. Interessante frisar
que a obediência do crente em relação ao seu pastor ou presbítero é a
mesma a qual o pastor e presbítero devem estar sujeitos, a qual é a
autoridade da igreja; e, por isso, não é possível que eles ordenem ou
orientem um ou mais membros a agirem divergentemente das deliberações do
corpo local. É uma via de mão-dupla, na qual o pastor e presbítero são
aqueles que primeiro devem proteger as resoluções que a igreja deliberou
e não transtorná-las. Não há lugar para o despotismo ou a autoridade à
revelia do corpo local, pelo contrário, a autoridade pastoral se
fundamenta no poder com o qual o Senhor investiu a sua igreja, e a ela
está sujeita.
Apenas
como um adendo à nomenclatura, já que utilizo termos correlatos e que
em algumas denominações referem-se a funções distintas, creio que os
vocábulos, bispo, pastor e presbítero são sinônimos e significam, de
maneira geral, a posição daquela pessoa madura e experiente na fé capaz
de guiar e alimentar o rebanho do Senhor. Os oficiais da igreja governam
não para si mesmos, como dito, nem a partir de autoridade própria, mas
da autoridade investida por Deus, como servos [1Pe 5.1-4, conf Mt
20.26-27].
E
a prova maior de que nada do que estamos dizendo é falso, baseia-se no
fato de o próprio Deus, através do seu Espírito Santo, dar esses dons à
igreja. É o que Paulo nos diz em Efésios 4.10-13: "Aquele que desceu é
também o mesmo que subiu acima de todos os céus, para cumprir todas as
coisas. E ele mesmo deu uns para apóstolos, e outros para profetas, e
outros para evangelistas, e outros para pastores e doutores, querendo o
aperfeiçoamento dos santos, para a obra do ministério, para edificação
do corpo de Cristo; até que todos cheguem à unidade da fé, e ao
conhecimento do Filho de Deus, a homem perfeito, à medida da estatura
completa de Cristo".
Deus
deu a alguns membros da igreja funções e ministérios especiais, de
forma que nem todos estão num mesmo nível funcional, numa igualdade de
atribuições, o que não pode ser nem significa inferioridade ou
superioridade espiritual de um membro sobre o outro. Se entende-se a
questão como uma mera disputa de poder, em que um pode mais sobre o
outro, a coisa deixa de ser espiritual para ser essencialmente carnal.
Afinal, todos são servos do mesmo Senhor, e o que nos diferencia é o dom
que o próprio Deus entregou a um e não a outro, e que entregou a outro e
não àquele. Parece, contudo, que o pastor, bispo ou presbítero são os
alvos mais adequados para os insubordinados, que chegam ao extremo de
desqualificá-los, menosprezá-los e até alegando a antibiblicidade de
seus dons. Ora, se não são bíblicos, por que a Escritura se esmera em
designá-los, descrevê-los e qualificá-los? O fato de haver falsos
pastores e mestres serve de negação para que não sejam reconhecidos os
pastores verdadeiros e que temem ao Senhor, servindo-o? Em quê a
quantidade daqueles que não honram o seu ofício e, em muitos casos, são
servos de satanás, anula a biblicidade do ministério e autoridade
pastorais? Com a palavra, os detratores...
O
que Paulo exorta-nos é, ao contrário, reconhecer a autoridade pastoral,
não como algo a ser realizado por soberba, orgulho ou vaidade, mas
reconhecendo que o pastor ou presbítero é aquele que serve mais
humildemente dentro do corpo local. É por isso que atitudes como a de
crentes que difamam e denigrem o dom pastoral, de maneira genérica, agem
com soberba e orgulho muito superiores à que afirmam denunciar. De
forma irresponsável e insana querem colocar todos no mesmo balaio em que
deveriam estar alguns. No fundo, toda essa empáfia serve apenas para
desculpá-los diante de si mesmos, demonstrando, via de regra, desdém
para com a igreja e o Evangelho, e um ensimesmamento, em que o intento é
a glória do próprio umbigo.
A
alegação de que tratam é que, se a maioria dos pastores está preocupada
com os seus próprios interesses, conclui-se que todos os pastores
também estão; se a muitos roubam, todos são ladrões; se há farsantes,
todos são impostores. Isso é de uma arrogância sem par! E de uma
leviandade ainda mais diabólica, nada condizente com a vida cristã.
Alegam-se oniscientes a ponto de mapearem todo o universo eclesiástico,
condenando-o, sem saírem de suas poltronas. Têm por fato algo que não
passa de especulação; e por direito algo que não foge de uma
reivindicação. É por isso que a Bíblia zelosa e sabiamente detalha em
minúcias quem está apto e quem não está ao ministério pastoral.
Infelizmente, há aqueles que querem os holofotes sem que tenham o
chamado de Deus. Há os que nem mesmo são convertidos, ou os que são
declaradamente ímpios em suas atitudes e desregramentos. Porém, nada
disso invalida o dom dado por Deus. E ele se preocupou em evitar que
tais trapaceiros se instalassem no seio da igreja. Paulo em 1 Tm 3:1-7 e
Tt 1:5-9, adverte para as qualidades que um pastor, presbítero ou bispo
devem ter, e o cuidado necessário para que a igreja decida-se em
alçá-los a esses postos. E as características, como indicativas de um
chamado divino, são reveladas exteriormente, de forma que qualquer um
possa vê-las, percebê-las e confirmá-las. Paulo nos dá uma lista de
distintivos que não são subjetivos, mas claramente objetivos e
assinaláveis. Especialmente que ele não seja neófito, "para não se
ensoberbecendo-se, não caia na condenação do diabo" [1Tm 3:6]; a
maturidade espiritual e a experiência na vida cristã devem ser pontos
fundamentalmente analisados pela igreja para sancionar um líder. E isso
não nos remete, necessariamente, à questão da idade, pois há jovens
muito mais maduros que velhos, ainda que, cronologicamente, espera-se
que um velho seja mais sábio que um moço.
A
questão é que o erro está, na maioria das vezes, no pouco zelo com que a
igreja estabelece seus líderes. Há casos em que um ministro é chamado à
liderança sem que preencha correta e adequadamente os princípios
estabelecidos pela Escritura para assumi-la. Indicações e até mesmo a
excelência acadêmica [graus e títulos que ele tenha] falam mais do que a
sua vida cristã. Prima-se hoje mais por um diploma teológico do que
pelo testemunho cristão. Com isso não estou desmerecendo o estudo, e,
sobretudo, o esforço de quem estudou anos para obter uma designação
acadêmica. Mas ela não é tudo, e muitas vezes torna-se em nada, dada as
inúmeras heresias que campeiam entre seminários e faculdades teológicas,
além de um desprezo a Deus e sua palavra, e o próprio fato de alguns
estarem no ministério sem chamado, santidade, zelo, e, mesmo sem
conversão. O que me leva a defender severamente a formação de líderes no
âmbito da igreja, dentro da própria igreja, primeiramente para que o
seu chamado seja confirmado por ela, segundo, para que o testemunho do
candidato, no decorrer dos anos, sirva de "certificado" para o cargo, e,
terceiro, para que ele seja conhecido de todos os membros, e ele os
conheça igualmente. Mas este é outro assunto, para outra hora...
Voltando
ao ponto central, da autoridade pastoral, leiamos Hb 13.17: “Obedecei
aos vossos guias e sede submissos para com eles; pois velam por vossa
alma, como quem deve prestar contas, para que façam isto com alegria e
não gemendo; porque isto não aproveita a vós outros.”
A expressão "guias" fala daqueles que vão à frente e conduzem o
rebanho, nitidamente dando-nos a ideia de liderança, daqueles que
exercem o cuidado das almas, dos membros do corpo local. Mas, com isso,
se quer dizer que há um grupo de irmãos que "fazem" o trabalho de Deus e
outro que somente assiste? Não! Ao menos, nunca devia ser assim. Uma
igreja que age dessa forma não entende o seu papel, nem compreende a
obra que tem de realizar. Uma igreja assim é presa fácil para homens
astutos, os lobos vorazes e cruéis que desejam destruir o rebanho,
conforme Paulo descreveu em Atos 20.29. Devemos nos lembrar de que uma
igreja bíblica não se constitui de um grupo de irmãos ativos e um grupo
de irmãos passivos, aqueles controlando estes e estes, simplesmente,
submetendo-se ao controle daqueles: “pelo contrário, cooperem os
membros, com igual cuidado, em favor uns dos outros” (1Co 12.25). Isso é
sabedoria, que vem dos céus, para a glória de Deus.
Continuaremos, na próxima aula, analisando a biblicidade da autoridade pastoral.
Notas: 1 - Aula realizada na EBD do Tabernáculo Batista Bíblico;
2 - Para maior consideração e detalhes, ouça o áudio da aula;
3- Baixe esta mensagem em aula 47.mp3
Estudo sobre a Confissão de Fé Batista de 1689 - Aula 46: "Uma marca cristã desprezada"
Por Jorge Fernandes Isah
A Bíblia aponta-nos vários dos nossos deveres como cristãos e como membros do corpo local:
- Orar uns pelos outros [Tg 5.13-16];
- Exortar e edificar uns aos outros [1Ts 5.11, Hb 3.12-14] - Exortar é uma palavra que traz vários significados, como: Aconselhar, persuadir; animar, encorajar, incitar; sempre em relação à uma vida de fé genuína e santa ao serviço de Deus;
- Levar as cargas uns dos outros [Gl 6.2];
- Sujeitar-nos uns aos outros [Ef 5.14-21].
Estes são princípios estabelecidos por Deus para que o seu povo caminhe em unidade e santidade, cumprindo o mandamento do Senhor de amar ao próximo como a si mesmo. Na verdade, o ensino que temos é até superior, de amar o próximo mais do que a nós mesmos, pois foi assim que Cristo agiu ao entregar-se por nós. Ele nos amou com um amor superior, levando-o à cruz para que fôssemos libertos do pecado e condenação, a morte eterna e definitiva. Devemos ter em mente sempre o outro, especialmente o irmão, caminhando com ele, lado a lado, em meio às tribulações, tristezas, sofrimentos e dores que o mundo nos infringe, sustentando-nos mutuamente. Por isso somos admoestados a orar, exortar, instruir-nos reciprocamente; a carregarmos os fardos duros e pesados uns dos outros, de forma que ele se torne mais leve para o irmão, o qual também auxiliar-nos-á a diminuir o peso das nossas cargas.
Sabemos que é pelo poder de Cristo, por sua bondade e misericórdia, que recebemos o consolo e o alívio nas atribulações, pois, sem ele, nada seríamos ou poderíamos realizar. Contudo, é estimulante saber que os irmãos se interessam pelo nosso sofrimento e dores, e esteja, cada um segundo o dom que o Senhor dá, disposto a reconhecê-las como também suas, já que os membros colaboram, cada um, para o bem do corpo. Creio que o Senhor nos deu essas orientações para não nos preocuparmos além da conta, além do necessário, com os nossos problemas, também. Este é o caráter pedagógico do auxílio, não nos deixar entristecer exageradamente, mais do que a tristeza convém e, de certa forma, alegrar-nos no zelo e sustento para com o irmão aflito [parece contraditório, mas o sofrimento do outro pode nos "tirar" do círculo vicioso em que muitas vezes nos encontramos, em meio aos problemas triviais e corriqueiros do dia-a-dia. E a nossa tristeza com a aflição alheia pode tornar-se na alegria dele, de não se reconhecer sozinho e abandonado em sua luta, fortalecendo-o, de forma que ele também nos fortalecerá. Na física esse princípio seria chamado de "lei da ação e reação", em que o amor e a piedade atribuídas retornam-nos de forma equivalente].
Acredito que esses são pontos que não suscitam muitos debates, gerando divergências. Normalmente são esquecidos ou relegados ao nível do desinteresse, seja por considerá-lo algo trivial, reles, sem muita importância, ou por certa soberba de se achar que já o alcançou e de que as etapas a serem vencidas são outras. Ledo engano! Em um mundo cada vez mais individualista e rebelde, a igreja também tem se individualizado e se rebelado contra os preceitos divinos. Igualmente, cada vez mais, os crentes se consideram autônomos e donos dos seus narizes, de forma que o sustento, auxilio e piedade se tornam escassos, quase invisíveis. Não que devemos alardear aos quatro cantos o auxílio ou consolo ou sustento que devotamos ao próximo, mas é que o próprio estado de coisas tem revelado o quão distantes estamos de viver uma vida verdadeiramente cristã, aos moldes bíblicos. Quase ninguém se interessa mais por uma prática cristã, no sentido de fidelidade à Escritura e de dar os frutos que o Espírito produz no homem regenerado. Os holofotes estão ligados e cada um quer a sua porção de luz, sem se preocupar em ser ele próprio a luz. Muitos reduzem a vida cristã a falar de Cristo para as pessoas, e eu já vi incrédulos repetirem versículos, referirem-se a Jesus, como muito crente não é capaz de fazer. Mas, então, tem-se um detalhe: ele fala bem, até mesmo com probidade e correção, mas a sua vida pessoal não espelha sequer um milímetro do que diz. E é este o ponto principal do qual não podemos nos esquecer, e do qual o Senhor alertou-nos: pode uma árvore má dar frutos bons e vice-versa? [Mt 7.17-20].
A parábola dos talentos assevera mais fortemente este ponto [Mt 25.14-30 cf. Lc 12.42-48]; no sentido de que somos mordomos do que Deus nos dá, e quanto mais ele nos dá, mais devemos honrá-lo, produzindo os frutos proporcionais à sua dádiva. Ou seja, somos ordenados a cuidar com amor, empenho e dedicação de tudo o que dispomos e que nos foi ofertado graciosamente. Não fazê-lo implicará em omissão, negligência e desobediência, resultando na ordem que o Senhor profere: "Tirai-lhe pois o talento, e dai-o ao que tem os dez talentos. Porque a qualquer que tiver será dado, e terá em abundância; mas ao que não tiver até o que tem ser-lhe-á tirado".
Assim devemos proceder em tudo, na vida pessoal, profissional, e na igreja. Há os que pensam ser possível uma vida aparente ou "mínima" no corpo de Cristo. Penso que se enganam a si mesmos os que assim agem. A vida cristã tem de ser intensa em seu zelo, amor, e em produzir os frutos para a glória de Deus. É claro que tudo isso é proporcional ao que Deus nos deu e capacitou-nos a gerir. Ele não dará mais do que podemos suportar, como está escrito: "Não veio sobre vós tentação senão humana, mas fiel é Deus que não vos deixará tentar acima do que podeis, antes com a tentação dará também o escape, para que a possais suportar" [1Co 10.13]. O verso se refere diretamente à tentação para o pecado, mas podemos, por princípio, levá-lo a todos os aspectos da vida, pois Deus não dá um fardo maior do que podemos carregar, já que, com o fardo, nos dá juntamente os meios de suportá-lo.
Voltando à parábola dos talentos, um servo ganhou cinco talentos, enquanto o outro dois, e o último um. Quando o Senhor voltou, os servos foram prestar-lhe contas. O primeiro devolveu-lhe dez talentos, o segundo quatro, e o último o mesmo talento que recebeu. Ou seja, este não soube o que fazer com o que Deus lhe dera, não soube aplicar o seu dom, ao contrário dos demais. Por isso foi reconhecido como mau e negligente servo, e lhe foi tirado o dom. A parábola nos remete a reconhecer Deus como o doador de tudo, inclusive dos nossos talentos e dons. Aquele que não sabe aplicá-los correta e convenientemente é como se não os tivesse; como um cego que quer ver ou um surdo que quer ouvir, com o agravante de que ele tem olhos e ouvidos bons, mas não sabe usá-los ou não os quer usar [Rm 12.4-8].
Na igreja do Senhor, devemos sempre buscar o melhor para nós e os demais irmãos e sermos o melhor que podemos ser, inclusive para nós mesmos, sem nos esquecer de que maior amor tem aquele que dá a vida por seu irmão. Parece um refrão de um cântico antigo ou um slogan, mas para nós tem de ser uma bandeira pela qual vivamos.
Este preâmbulo tem o objetivo de se chegar a dois outros pontos, que considero mais polêmicos e problemáticos dentro da igreja:
1) A autoridade eclesiástica – [1Ts 5.12-13, Hb 13.17]. Os oficiais da igreja governam não para si mesmos, nem a partir de autoridade própria, mas a autoridade investida por Deus, como servos [1Pe 5.1-5, conf Mt 20.26-27];
2) Sustento pastoral - 1Tm 5.17; Lc 10.7; At 28.8-10.
Os quais serão expostos e discutidos nas próximas aulas.
Notas: 1) Baixe esta mensagem em Aula 46.MP3
2) Aula realizada na EBD do Tabernáculo Batista Biblico